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ENTREVISTA: Angelo Pastorello, a arte de fotografar com ousadia e elegância

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Por André Porto e Nadezhda Bezerra

Uma fotografia de qualidade não requer só um bom equipamento, requer acima de tudo muita sensibilidade e bom gosto para revelar ao mundo momentos, pessoas e objetos que muitas vezes o olhar comum não identifica facilmente. E fotografar com maestria se destacando num meio disputado da fotografia de arte se faz necessário acima de tudo criatividade. É o que pudemos constatar ao admirar o trabalho do fotógrafo Angelo Pastorello, que com muita criatividade e elegância extrai belíssimas imagens da sua forma de olhar por trás das lentes de suas câmeras. Com suas técnicas apuradas e olhos sensíveis Pastorello tem se destacado aqui e no exterior, seja com fotos simples de uma viagem ao Chile à um ensaio sofisticado para um editorial de moda, de um nú para revista ou um portrait, a marca da elegância e bom gosto está registrada junto à fotos. Angelo, um homem tão simples quanto eficiente no que faz se mostra nessa entrevista um cara comum querendo criar e realçar a beleza das coisas de forma marcante. Pra quem curte fotografia, um prato cheio. Pra quem simplesmente gosta de admirar belas imagens, nada melhor que essa entrevista-portfólio.

 

Angelo como e com que importância a fotografia entrou em sua vida e se tornou a sua profissão?

Quando eu estava na oitava série eu fiz um breve curso de fotografia na escola, neste curso eu me interessei muito pelo laboratório fotográfico. Passei então a fotografar para revelar e ampliar minhas fotos. Um ano mais tarde eu ganhei dos meus pais um Ampliador Durst e montei um pequeno laboratório no banheiro da casa da minha casa. Durante muito tempo meu interesse era só pelo laboratório, que até hoje eu uso muito para os meus trabalhos autorais.
Alguns anos depois eu comecei a me interessar pelo “Ato Fotográfico“, pensar em um ensaio com tema, conceito e unidade, a partir dos 18 anos eu fui trabalhar no laboratório da Fuji Filmes do Brasil, no ano seguinte eu fui ser assistente, neste período fiz alguns freelas  p/ a Vogue fotografando a coluna social e alguns retratos. Depois passei a fotografar editorial de Arquitetura e Decoração para a revista Casa Cláudia, o que me deu bastante agilidade em relação a iluminação, dois anos mais tarde eu fiz um Portfólio só com modelos e portraits…e não parei mais.

 

Qual a marca dos seus trabalhos? Existe algo que só você faz como fotógrafo?

Eu prefiro que as pessoas falem sobre o meu trabalho, o que elas vêem e sentem nas minhas fotos!! O grande “desafio” para a maioria dos fotógrafos é ter esta “marca”, uma “assinatura”, que não é a técnica simplesmente, mas o conceito, o olhar. Isso é um “debate” amplo, pois conceito, olhar, originalidade são “conceitos” subjetivos. Técnica é importante saber e podemos estudar, até para podermos “desprezar”!!! Sensibilidade, “intuição empírica” e senso geométrico  é mais  difícil , são muitos fatores que vão compor cada fotógrafo.

Em relação ao meu trabalho, uma característica forte é a minha preocupação com volumes e dimensões, através de uma iluminação elaborada, enquadramento e direção quando eu fotografo pessoas. Em trabalhos profissionais onde eu tenho um briefing, um layout, eu “tento” incorporar estas características “técnicas”. Em trabalhos autorais, desde a concepção até a execução, a responsabilidade é totalmente minha. Da escolha do ‘tema”, como “olhar” este tema, escolha da câmera, filmes, como vou revelar estes filmes, como vou ampliar, em que tipo de papel…enfim, todos os detalhes. Nestes casos acredito que minha maneira de olhar e resolver este olhar esteticamente fique mais evidente.

Você uma vez citou que fotografar um nu para exposição te dava mais liberdade. Por quê? O que diferencia de um nu para uma revista?
Porque no trabalho autoral eu sou o responsável por tudo, portanto tenho liberdade total, a proposta é minha para mim mesmo! Quando eu fotografo para uma revista eu divido esta responsabilidade com uma equipe, com a direção de arte da revista, com a produção, com o make e na maioria das vezes eu sigo um briefing e o “estilo” da revista. Isto não significa que é melhor ou pior, apenas que é um trabalho de equipe.
Uma foto não é “melhor” ou “pior” por ter sido feita para uma exposição em Museu ou para uma revista. Muitas fotos que foram publicadas em revistas poderiam estar expostas num museu….e muitas exposições não poderiam estar publicadas em nenhuma revista !!!

 

Você lembra qual foi a primeira mulher nua que você fotografou? E quem estava mais nervoso, você ou ela?
Eu lembro sim, foi na praia de Trindade estado do RJ, com certeza eu estava mais “ansioso” do que ela. Fiz alguns filmes, depois no meu laboratório enquanto os filmes ainda estavam lavando eu vi alguns fotogramas e fiquei muito feliz com o resultado, a partir daí eu comecei a fotografar modelos fazer vários ensaios e “substituindo as fotos de Still e Decoração por fotos de gente. Nesta época eu já pesquisava filmes Infrared, e comecei a incorporar estes filmes em fotos com gente, isto ajudou a me dar um estilo nos contrastes e texturas das fotos com modelo.
O que é mais “fácil”, dominar a técnica da fotografia ou desenvolver o olhar para a foto?
Técnica você aprende, pode estudar… Eu acho que com a “revolução” digital é preciso estudar mais ainda, principalmente a interpretação da luz, e não “cair” na mesmice dos tratamentos digitais, que estão transformando a fotografia em ilustração. O olhar, embora mais complexo e subjetivo, também podemos estudar, olhar é o que somos, pensamos, vivemos e tudo que nos formou. Mas com certeza você desenvolve sim o olhar, até o último momento da vida. Para quem se interessar, algumas sugestões de leitura: “A Imagem”  de Jacques Aumont; “O Ato Fotográfico” de Philippe Dubois, “Realidades e Ficções na Trama Fotográfica” de Boris Kossoy.

 

Pin hole é uma das técnicas mais antigas da fotografia qual o prazer de ainda usá-la?

 

Existem várias técnicas fotográficas, o Pin Hole é literalmente um furo em uma caixa escura, este furo que faz a função de uma lente com um determinado diafragma. Não existem regulagens, nem de foco, nem de diafragmas e nem velocidade… E algumas câmeras nem visor para o enquadramento possuem. Eu tenho um ensaio de São Paulo, feito com um Pin Hole Scope que usa filme 120 mm e resulta um negativo de 6x18cm, os filmes podem ser cor ou P&B, os resultados trazem surpresas em relação as perspectivas, pois esta câmera não tem visor, o enquadramento é “imaginário”. Um dos prazeres é você usar uma técnica “tosca” e básica na formação de uma imagem, é o “descompromisso”, pois a idéia é o que importa, o “defeito” se torna “efeito”…
Você já desistiu de uma sessão de fotos ou não rendeu como esperava por conta da modelo ser chata ou implicante demais?
Nunca desisti, mas já tive este problema algumas vezes por a modelo ser inexperiente, por a modelo ser arrogante, com retratos de políticos e às vezes por gente da equipe ser chata. Embora o fotógrafo tenha a prerrogativa de tomar a decisão de acabar com os problemas encerrando a sessão. O mais importante é ter a “diplomacia” de terminar o trabalho, brigar e se desentender é prejuízo para todos. Ninguém é mais importante do que ninguém, nem modelo, nem produtor, nem maquiador, nem diretor de arte, nem Fotógrafo.
Existe mulher que é melhor ao vivo do que na foto?
Sim, várias mulheres são melhores ao vivo do que na foto, assim como o contrário também é verdade… Mesmo com produção, luz bacana e bom make, existem vários fatores que influem no resultado de uma foto, fotogenia, expressão corporal, charme, olhar, tudo isso parece óbvio, mas tudo isso combinado resulta na característica de cada mulher, também tem a interação entre fotógrafo e modelo, empatia, admiração. Uma modelo que pra mim não “funcionou”, pode ter um trabalho maravilho com outro fotógrafo e vice-versa. Foto é “ilusão”, desejo, às vezes esta mulher “virtual” se faz real, na maioria das vezes não!
Moda ou publicidade, o que te dá mais prazer em fazer?
Nos trabalhos de editorial de moda eu tenho mais “liberdade”, em publicidade existe mais o “seguir” layout, alguns trabalhos de moda como catálogos também são mais “engessados”… Os que me dão mais prazer são os trabalhos que, independente do que são ou para onde são, eu tenho uma sintonia, em outras palavras, me agrada a proposta estética.

 

Já aconteceu de te chamarem para fotografar uma modelo que você não dava nada por ela e o resultado sai perfeito? Por que isso acontece?
Muitas vezes, em publicidade, em editoriais, patálogos e muitos portraits. Embora Fotografia não seja uma “caixinha de surpresas” surpresas acontecem! São vários motivos, maquiagem e cabelo, produção e iluminação, que “transformam” a modelo do ponto vista estético, se isso é melhor ou pior, é uma discussão subjetiva, mas o que acontece também, e muito, é a “transformação” da “atitude’ da modelo, da interpretação, da maneira como ela se coloca diante da câmera, de como ela incorpora aquele momento, do charme, do olhar, de se sentir segura, da empatia… estas características da personalidade da modelo mais a produção, maquiagem e cabelo e toda a parte fotográfica, somadas a uma fotogenia, que num primeiro momento nós não identificamos, resulta numa foto excelente. Muitas vezes ao olhar uma pessoa diante de nós, que nos parece “comum” , ao ver esta pessoa fotografada nos “surpreendemos” com o excelente resultado. Quando se trata de modelo profissional, o que importa para mim é como ela  fotografa e  não com ela é ao vivo.
Você fez sua estreia na revista PLAYBOY ano passado com a capa da repórter Mônica Apor. Como foi esse trabalho? Ter sido para PLAYBOY teve outro peso?
Na verdade eu já havia feito outros trabalhos para a PLAYBOY. Há 18 anos eu fotografei as finalistas de um concurso… 10 anos depois eu fiz dois ensaios, um em SP e outro na Argentina, ambos segundo ensaio. Também há uns dois ou três anos eu fiz uma moda masculina com movimentos em studio. Fotografar a Mônica foi muito bacana, pois eu já tinha feito três ensaios com ela e existia uma admiração mútua. Ensaio de capa para a PLAYBOY tem um sabor especial sim, trata-se de uma marca mundial e um sucesso editorial, é uma revista vista e lida por pessoas de diversas áreas, isso é muito bom, pois a visibilidade é maior.
Qual o trabalho que você mais tem orgulho de ter feito, seja por realização pessoal ou profissional?

São vários, autorais e comerciais, e eu não saberia eleger o melhor, mas vou citar um trabalho recente autoral que eu comecei a fazer há exatamente dois anos e continuo fazendo, chamado: “Cenas de São Paulo”, são fotos do Mercado Municipal, Aeroporto de Congonhas, Estação da Luz e os Carros Alegóricos do Carnaval. As fotos foram feitas com uma Câmera Pin Hole Scope 120 mm, onde eu uso filmes coloridos e P&B, as ampliações tem 180x60cm e uma proporção de 1/3. Cinco destas fotos estão no acervo do Museu de Arte Contemporânea de Cuba, Casa de Las Américas. Este trabalho continua e em breve vou fazer uma exposição em São Paulo.

Que dicas você daria ao leitor MENSCH que está iniciando no universo da fotografia?

Não se forma um profissional em pouco tempo, em área nenhuma, e em fotografia também. A “revolução” digital trouxe uma facilidade e uma “democratização” da imagem fotográfica, o acesso a câmeras é mais fácil, a fotografia migrou para telas de iPod, iPad, celulares e computadores. Barateando todo o processo e nivelando as imagens em resoluções baixas que “enganam” os olhos quando vistas “virtualmente” nestas telas. Por outro lado existe uma “banalização” da fotografia, sem critério nenhum. Vejo pessoas se dizerem fotógrafos sem ter idéia do que é Luz e sem ter os pré-requisitos básicos da fotografia. Aprendem um básico de photoshop e se intitulam fotógrafos.
A dica é: estudem!! Procure um curso, sejam assistentes de profissionais com história, leiam muito, se informem cronologicamente, história da fotografia, estudem fotógrafos de diversas áreas, para os digitais, entendam o que é, e como funciona um Fotodiodo (pixel), aprendam a fotometrar e a interpretar a luz , estudem Zone Sistem, amplie suas imagens em papeis fotográficos, e principalmente, não se ache importante!!
Em que lugar do ranking está a fotografia brasileira (moda e publicidade) em relação ao resto do mundo?
Não tenho esta resposta e nem sei se existe um ranking. Se existir um ranking, sinceramente não acho isso importante. Infelizmente nossas referências ainda são importadas, principalmente em moda, mas acho que estamos melhorando.
Fotografia é um hobby para muitas pessoas. Então qual seria o seu (ou seus) hobby?
No começo meu hobby eram minhas fotos autorais e meu laboratório, hoje isso se incorporou ao profissional. Então, estou sem um hobby. Mas a música é muito importante.
Quem é Angelo Pastorello sem a câmera fotográfica?
Um observador…

Foto capa: Angelo Pastorello (auto-retrato inédito)
Site oficial: www.angelopastorello.com.br
Agradecimentos: Patrícia Alves