
O personagem de Ângelo Rodrigues mal entrou já na trama de Vale Tudo e já gerou um buchicho sobre sua participação ao lado da esperada vilã Odete Roitman. Mas essa não é a primeira vez que o galã português pisa em terras tupiniquins. Em 2014 ele veio estudar teatro durante um intercâmbio na UniRio onde terminou passando seis meses no Rio para terminar minha licenciatura pela Escola Superior de Teatro e Cinema. E em 2023 foi quando o grande público conheceu de fato esse ator que já possui 20 anos de carreira. Na época, ele deu o que falar com a série Olhar Indiscreto (Netflix), ao lado da bela Débora Nascimento em cenas tórridas. Apaixonado por viagens a lugares exóticos e distantes do roteiro básico de qualquer turista, Ângelo tem colecionado histórias e imagens que terminaram virando um projeto particular.
Ângelo, como surgiu a oportunidade par atuar em Vale Tudo e como foi a preparação para viver Martin? Recebi o convite através da minha agência (Am Company), que consultou a minha disponibilidade para o trabalho. Eu estava prestes a começar os ensaios de um espetáculo de teatro em Portugal e as datas propostas pela Globo coincidiam exatamente com esse processo. Conciliar os dois projetos foi uma verdadeira ginástica porque o espetáculo teve que ser adiado por uma semana. E, durante os 15 dias que passei no Rio por conta de Vale Tudo, gravava em alguns dias e nos outros ensaiava a peça por zoom por cerca de 5 horas. Foi um período muito exigente, que me esgotou fisicamente, mas também me alimentou artisticamente. Foi um bálsamo artístico! Para me preparar para o Martin mergulhei no universo da Odete Roitman, estudei tudo o que encontrei sobre ela e assisti muitas cenas com a Beatriz Segal, que construiu um verdadeiro monumento na dramaturgia brasileira. Além disso, me cerquei de outras referências que me ajudaram a compor um personagem que, embora novo, estivesse à altura da complexidade deste clássico.

Martin, seu personagem, é namorado da grande vilã Odete Roitman, vivida por Débora Bloch. Como foi essa parceria na frente e atrás das câmeras? Já a conhecia? Não conhecia Débora pessoalmente e contracenar com ela foi privilégio. Ela é generosa, inteligente, uma atriz que escuta. A nossa troca foi muito fluída e nos bastidores falávamos bastante sobre a construção da relação entre os personagens. O Martin tem uma relação com a Odete pautada no prazer, na leveza e, até por certo ponto, no hedonismo. Ele não é sustentado por ela como poderão pensar. Ele tem sua vida e o seu trabalho, mas aceita sem grandes dilemas os confortos que ela como mulher abastada lhe proporciona. Essa dinâmica moderna e sem culpa entre os dois foi muito interessante de explorar.
Você passou 15 dias no Brasil apenas pra gravar sua participação, que dura 10 capítulos. Como foi toda essa correria? Foram 15 dias de gravação intensa no Rio. Foi um ritmo puxado, principalmente porque eu conciliava com os ensaios do espetáculo que acabei de estrear em Portugal como mencionei antes. Nesse período, dormia pouco e trabalhava muito porque precisava decorar texto em ambos os projetos, mas foi uma experiência que me marcou profundamente. Estar em cena com grandes nomes da teledramaturgia brasileira e fazer parte de projeto com tanto simbolismo foi algo que me deu combustível pra dar conta de tudo.


Você apareceu nas chamadas de Vale Tudo antes mesmo da estreia e já causou comoção nacional, ganhando muitos seguidores nas redes e muito interesse da imprensa. Como você recebeu esse movimento? Foi bonito perceber o carinho do público brasileiro. Vale Tudo é um projeto tão simbólico que só de estar ali, mesmo que em poucos capítulos, já é privilégio imenso. A resposta calorosa só reforça o quanto o Brasil tem uma relação afetiva com a teledramaturgia e isso é algo que eu, como ator, respeito profundamente.
Ângelo Rodrigues já morou no Rio de Janeiro em 2015 já pensando em conseguir espaço no audiovisual brasileiro? Como foi essa temporada aqui? Quais as memórias dessa época? Morei seis meses no Rio em 2014, durante um intercâmbio na UniRio. Fui estudar teatro, aliás, fui estudar teatro por um semestre para terminar minha licenciatura pela Escola Superior de Teatro e Cinema. E guardo as melhores memórias dessa época. A vista da minha sala de aula era o Pão de Açúcar e aquilo me parecia profundamente poético. O meu exercício final de interpretação foi na Praia Vermelha, na Urca. Foi um tempo de descoberta. Mais do que decidir que tipo de ator eu queria ser, eu estava tentando entender que tipo de ser humano eu desejava me tornar. Com 27 anos, o Rio ressoou profundamente em mim. A cidade teve um impacto enorme na minha maneira de ver o mundo porque eu sempre fui uma pessoa mais introspectiva. E os cariocas me ensinaram a contrariar isso. Me tornei, espero, mais solar e mais receptivo. E mais certo de que não queria ficar eternamente num canto do mundo. Nos tempos da UniRio, diferentemente do que acontecia no meu curso em Lisboa, eu podia escolher as disciplinas que queria cursar. Era como se o estudante pudesse moldar o tipo de ator que queria ser.
Então, eu escolhi as matérias mais distantes de mim: Balé clássico, por exemplo. Fui, provavelmente, o pior aluno da história. (risos) A de Caracterização também. E a que mais me marcou foi a do Teatro e o Enclausuramento, que atuava dentro dos presídios do Rio. E foi aí que eu tive a minha primeira experiência de voluntariado no Complexo Penitenciário de Gericinó, na época Bangu, dando aula de teatro a detentos. Foi ali que eu conheci, de perto, a metodologia de Augusto Boal chamada O Teatro do Oprimido, que problematiza a cidadania através de exercícios que espelham o universo das relações humanas. E essa experiência foi realmente transformadora para mim. Só tenho a agradecer.

Você tem uma trajetória profissional super respeitada em Portugal. O que te desafia como ator depois de 20 anos de carreira? Me desafia aquilo que não me conforta e tenho buscado justamente os papéis que exigem de mim um mergulho mais profundo. Quanto mais distante está o personagem de mim, mais interessante é o processo. E porque eu acredito que o ator é também pesquisador. Pesquisador do ser humano. E essa matéria é inesgotável.
Além de atuar, você vem desenvolvendo um trabalho de diretor de documentários. Como surgiu a ideia de transformar em arte suas experiências pelo mundo? Fale destes projetos. Veio da necessidade de registrar aquilo que me comove. Em cada viagem que faço (e que tenho feito) percebo que há histórias que não podiam ficar só na memória. Então, decidi ligar a câmera e escutar o mundo. Já filmei na Amazônia, na China, em Moçambique, no Nepal, no Camboja, na Tailândia e na Mauritânia. E os projetos não têm roteiros. Nascem do encontro com o outro e do desejo de contar o que nos une enquanto seres humanos. Gosto de abordar questões universais.
Pensa em dirigir TV e teatro também? Nunca digo nunca, mas, por enquanto, estou completamente mergulhado na linguagem documental. Filmar o real me apaixona até mais do que a ficção. Em 2010, dirigi um curta chamado Luxúria e adorei a experiência. Quero repeti-la no futuro e, quem sabe, dirigir um longa. Por que, não?! O desejo de contar histórias está em mim seja no palco, na tela ou mesmo na vida real. Se encontrar uma ideia que justifique a minha assinatura como diretor estarei pronto.


Em 2023, fizemos sua primeira capa da MENSCH celebrando o sucesso mundial de Olhar Indiscreto, que você protagonizou, na Netflix. O que esse trabalho trouxe pra sua carreira desde então? Olhar Indiscreto foi um divisor de águas na minha carreira. A série ficou no top 10 de 57 países e foi a mais assistida do Brasil em 2023. E isso me trouxe uma projeção internacional que não conhecia até então, o que abriu portas para novas oportunidades como o convite para outra produção da Netflix portuguesa (a série Mar Branco, cuja primeira temporada foi sucesso estrondoso tanto em Portugal quanto internacionalmente). Além disso, essa visibilidade me possibilitou integrar o elenco de projeto muito especial da Globo: o remake da novela Vale tudo.
Assim como na série, vamos ver cenas quentes de Ângelo Rodrigues na novela da Globo. Como é pra você fazer esse tipo de trabalho que expõe o corpo? Lido com isso com naturalidade. Somos feitos de carne, desejo e contradições. O corpo é a primeira casa do ator, não?! Portanto, quando a nudez é justificada e é bem dirigida não vejo problema nenhum. Eu gosto de desafios que me tirem da normalidade, que me atirem para o desconforto.
Você é um cara vaidoso? Do que não abre mão? Como cuida da aparência? Gosto de me cuidar, mas sem neuras. Não abro mão de dormir bem, de treinar regularmente e de manter uma alimentação saudável. Para estar bem mentalmente, ter energia e foco para os projetos que abraço. Só isso.


Você é um cara que busca espiritualidade e há poucos meses passou por momentos de risco de vida, chegando até a ser internado em Portugal por conta de tratamentos estéticos que deram errado. Como isso impactou sua carreira e sua vida? Na verdade, não foram tratamentos estéticos. Foi uma má administração de uma reposição hormonal que eu fiz, acompanhada inicialmente por profissionais. Esse episódio sim me ensinou muito sobre responsabilidade com o corpo com limites e sobre o que realmente importa. A espiritualidade já fazia parte da minha vida, mas tornou-se ainda mais presente.
E onde podemos encontrar Ângelo Rodrigues quando não está trabalhando? Provavelmente viajando. Viajando por algum lugar remoto do mundo. Aprendendo com outras culturas ou captando imagens para um futuro documentário. Gosto do silêncio da introspecção e da contemplação. É nesses momentos que eu me reconecto comigo mesmo.
Para conquistar Ângelo basta… Ter curiosidade pelo mundo, bom humor, e leveza.
E quais os próximos desafios de Ângelo Rodrigues? Este ano estarei em quatro frentes como ator: no streaming com a terceira temporada de Mar Branco na Netflix de Portugal; na TV brasileira com Vale Tudo; e no cinema com o filme Cherchez la Femme, que é um projeto póstumo do diretor António da Cunha Teles (que faleceu no processo da edição). No teatro, em Lisboa, estou em cena com o espetáculo Jantar de idiotas até junho. Como diretor, continuo aprofundando a minha pesquisa documental. Estou desenvolvendo dois projetos: “A Heresia da Separatividade”, filmado durante 5 meses em realidades de reclusão em 3 países (Nepal Camboja e Tailândia). E o documentário Iron Train, filmado na Mauritânia que acompanha a rotina de dois vendedores de peixes que atravessam o deserto do Saara a bordo do trem mais longo do mundo. São projetos totalmente distintos, com pesquisas distintas e que me desafiaram artisticamente de maneiras diferentes. E é exatamente isso que me entusiasma a continuar crescendo enquanto artista e enquanto ser humano.

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