Desde que estreou no remake de Renascer nossa estrela Juliane Araújo tem trazido pautas relevantes para o grande público através de sua personagem Kika na novela. Personagem essa que hoje em dia se apresenta bem diferente do que foi interpretado em 1993 pela atriz Cláudia Lyra. Depois de passar por sucessos como Êta Mundo Bom!, Juliane vive um momento especial em sua carreira com curta-metragem como roteirista e breve vem série chegando em breve. Enquanto isso, confira nosso papo com essa encantadora atriz.
Juliane, da primeira vez que conversamos, você estava na reta final da novela Êta Mundo Bom! (2016). De lá para cá, muita coisa aconteceu. O que destacaria ao longo desse período? ÊTA foi uma novela muito incrível pra mim, divertidíssima, tenho saudades. Fiz, depois, vários outros trabalhos. Uma pandemia no meio disso tudo. Publiquei um livro. Fiz um curta metragem. Acho que destacaria esses feitos, projetos meus que materializei. Cresci muito como artista, como pessoa.
E agora você está na TV como a Kika de Renascer. Como encarou o convite e como tem sido participar de uma obra clássica da TV brasileira? Renascer faz parte do imaginário do brasileiro. É muito lindo poder ver que a história continua muito potente. A narrativa não envelheceu – é bonita, conta história. As abordagens mudaram a preocupação de contar essa história com mais cuidado e respeito, seguindo a época que estamos – as discussões que hoje elaboramos e que são necessárias. Bruno Luperi tem feito isso. É bonito ver que o ser humano se aprimora, a sociedade também. Então, muita coisa mudou na história que é contada hoje. As histórias ganharam mais rostos, abre discursos para os avanços de gêneros, de multiplicidade de povos, de lutas, de culturas. Tem muita poesia. Só ganhamos com o tempo. A novela é linda!
A personagem traz pautas bem importantes para serem discutidas nos dias atuais, tais como feminismo e homofobia. Como enxerga isso e como você se sente em ser porta-voz disso? Ela cumpre esse papel na trama – trazer à tona um olhar lúcido, mais aprimorado, político e justo – uma enxurrada de assuntos importantes e necessários estão na boca de Kika. A gente tá nesse momento de não passar pano, né? Ela tem essa personalidade, fala o que entende como sendo certo, e realmente é. Eu amo poder expressar muitas opiniões que eu tenho na vida, através dela.
Como a Kika de 2024 se diferencia da Kika de 1993 (interpretada por Claudia Lyra)? Os debates hoje são mais aprofundados em relação ao feminismo. Chegam a mais gente, mais mulheres dominam melhor o assunto do que quando foi ao ar a primeira versão de Renascer. Já é outra sociedade, por mais que ainda seja um assunto que gere debates – e que bom. Estamos mais próximos disso e, consequentemente, mais interessados. Sempre é um presente discutir pautas assim em uma novela. Uma novela alcança muita gente, entra em muitas casas – isso é importante. A Kika de 93 é diferente da Kika de hoje também por isso, o discurso ampliou.
Sua Kika viveu um relacionamento com Zé Bento, que é um típico macho tóxico. Já conviveu com alguém com esse perfil? Como você enxerga isso? O que não cabe mais nos dias de hoje? Muitas mulheres vivem ou já viveram isso – algum grau de toxicidade em um relacionamento. Infelizmente, é quase cotidiano ouvir histórias assim. Nunca vivi uma narrativa parecida com a Kika, de ser explorada financeiramente, conviver com uma pessoa que é claramente um adulto disfuncional, como o Bento, mas acho que deve ser muito desgastante e devastador para o amor. Nenhum sentimento sustenta isso para sempre. Nenhum tipo de abuso cabe, na verdade, nunca deveria ter existido em época nenhuma. Mas, hoje em di,a existem leis, por mais que ainda façam valer com muita dificuldade ainda, informação e mais mulheres que se empoderam e compartilham seus processos. Acho isso importante, falar, compartilhar historias de abusos, diversos – ajuda outras mulheres abrirem os olhos. O abuso se manifesta de inúmeras maneiras. É importante a gente estar desperta pra não aceitar nenhum tipo dele.
De todas as suas personagens, alguma tem características que você se identifique e não percebia até então? Acho que todas têm muito de mim. Não na identificação mais óbvia, mas no profundo, no que está mais escondido. A Kika é a personagem com a qual mais me identifico no discurso, sabe? Ela fala umas coisas que eu falaria na vida. A Sarita de Êta, já que citei, tinha o senso de humor. A gente vai se montando tipo im Frankenstein, um pouquinho de cada uma (risos).
Já guardou algo de alguma personagem que levou para a vida, que levou como ensinamento? Do filme que eu fiz agora, que ainda não estreou – Infinimundo. O percurso da personagem é muito baseado na cura de seus próprios traumas. Voltar a enxergar o amor sem tantas barreiras, acho isso muito bonito, levo isso comigo isso -tentar identificar sempre onde ou em que monte que não deixo o amor entrar.
Fora Renascer, em breve você será vista na série (Globoplay) Veronika. Fala um pouco da personagem que vamos conhecer e como foi participar desse projeto? A Renata é uma mulher intensa que tem uma enorme atração pelo poder. Isso e também a paixão perigosa que sente por Rod (Dério Chagas) levam-na a percorrer uma trajetória digna de uma tragédia grega. Foi uma personagem que exigiu de mim um profundo acesso a lugares difíceis, como a raiva e a ira. Todo mundo sente todos os tipos de sentimentos, mas quanto mais a gente amadurece, a gente tem mais consciência e controle sobre eles. Não é o caso da Renatinha (rsrs). Ela vai até o fim. A série é ambientada no Rio. O ambiente de quase todos os personagens da série, é uma favela, um território em que moramos, frequentamos ou que já está bem estabelecido no imaginário do carioca, do brasileiro. Além de tudo, é uma série que fala sobre amor, e de como a vida muitas vezes nos leva a tomar atitudes completamente diferentes do que planejávamos. Agora em Junho, também estreia O JOGO QUE MUDOU A HISTÓRIA, também da Afroreggae Audiovisual – um dos melhores roteiros que já li e do que eu vi da série, vai ser um escândalo. Muito boa. Minha participação nessa primeira temporada é pontual, mas super interessante.
Ano passado você estreou como roteirista, diretora assistente, produtora e montadora do curta-metragem Travessia. Como isso foi acontecendo e como foi para você? Já tem planos para novos projetos nessas áreas? Os artistas que mais admiro são criadores, ocupam mais de uma função, pilham os próprios projetos. Percebi o quanto isso era importante pra mim e me fazia feliz no Travessia. Isso abriu uma frente de trabalho enorme. Comecei a estudar cinema – tem sido uma paixão. Escrevo também. Comecei a estudar roteiro – tenho o roteiro de um longa pronto e um outro curta. Fico muito empolgada com essas possibilidades. Acompanhar um projeto do zero – isso tem feito meus olhos brilharem. Aprender coisas novas me faz sentir em movimento. Tenho coisas legais para serem materializadas.
Fora muito trabalho, o que curte fazer para se distrair? Onde é sua praia? Morar no Rio abre muitas possibilidades, né?! Passeiozinho na rua, praia, cachoeira, livraria, mas tô numa fase que, em qualquer folga, viajo para a serra. Amo.
Como lida com o espelho e a vaidade? Qual o limite? Oscilo muito nisso. Às vezes, é difícil pra mim. Percebi, esses dias, que em todas as fases e idades da minha vida sempre tive algum grau significante de insatisfação, desde adolescente. Acho importante a gente passar um scanner, às vezes, pra identificar o que é cobrança exagerada, muitas vezes espelhada de uma sociedade que cria padrões inalcançáveis – e o que é real. Terapia ajuda, terapia sempre ajuda (risos). Tenho cuidado mais do meu corpo, numa amorosidade mesmo – fazer exercícios ajuda muito, a mente e o corpo. Comecei a me tratar com Dr. Lucas Costa que é endocrino e aí descobri que meu desânimo vinha de uma baixa de B12. Tipo isso, sabe? Às vezes, o que a gente precisa é manter a saúde em dia. O limite pra mim é esse, tá saudável, então tá bom!
Este ano promete o que ainda? Quando terminar a novela, estou já com alguns projetos meus pra desenvolver e algumas outras possibilidades engatilhadas, que volto pra contar mais pra frente. Tem sido um ano bom. Tô feliz e animada.
E para conquistar Juliane basta… Pra me conquistar? (risos) Acho que qualquer coisa que me conquista tem que ter uma profunda abertura pra vida. Amo tudo ou todos que amam viver ou que pensam a vida com profundidade. Sou muito emocional. Quero viver muito e bem.
Fotos Priscila Nicheli / Styling Samantha Szczerb / Beleza Zuh Ribeiro / Agradecimentos @casavista.joatinga Juliane usou: Nayane, Inti, Carol Rossato