MUSA INSPIRADORA
Por Marco Antônio Ferraz
Em toda história, grandes mestres têm musas, da mitologia ao mundo das artes.
YSL teve a supermodelo Iman como sua musa inspiradora assim como a francesa Katoucha Rianne. As musas da Prada eram sempre adolescentes, as vezes insípidas e invisíveis para que o contraste da ousadia de Miuccia Prada fosse perfeitamente notado em todo o mundo, pela imprensa especializada. Debra Shaw foi inspiração de John Galliano e Alexander McQueen – rivais ingleses e talentosos com a mesma potência.
No Brasil, uma loira de Santa Rosa mudava o mercado da moda nacional depois de ser descoberta em um trem por um olheiro da Bloch Editores. Olhos azuis, cabelos finos de anjo, aos 16 anos fazia cara de sexy ainda sendo virgem, seu sonho era apenas realizar uma vida de conforto para sua mãe Dona Alda. Seu nome era Maria da Graça Xuxa Meneghel, adolescente moradora da zona norte e com jeito de menino, se tornaria o maior fenômeno do Brasil. Sempre teve seguidores muito antes de esse termo ser usado em redes sociais, no tempo em que ela ficou famosa, tinha que ser famosa mesmo. A Internet não existia e nem sonhávamos com o meio de comunicação que mudaria o comportamento do mundo.
Xuxa era o corpo da mulher normal e era tão especial que o Editor Roberto Barreira que foi um dos seus padrinhos, dizia que quando as revistas da Bloch Editores não vendiam era só colocar Xuxa na capa, que todo cenário mudava. Todas as bancas comemoravam quando ela estava nos posters abastecendo de glamour, um mercado que não existe mais. Roberto guardava todos os looks usados por ela nas capas das revistas.
A história de Xuxa e da moda se confundem, pois ela acabou sendo maior que as marcas que posava e usava. Todos queriam Xuxa. Todos já a amavam. Ela era capa, estava nas campanhas das marcas, nos editoriais de moda da publicação, além de ser contra capa e quarta capa. Pessoalmente, vi em várias publicações da revista Desfile do qual fui editor de moda pós-Xuxa, que só ela era capaz desse feito. As marcas brigavam por ela, as de lingerie então, nem se importavam se não tinham exclusividade sobre a imagem dela. Era comum ela estar em campanhas de marcas concorrentes.
Os cabelos louros eram frisados, escovados, com ou sem franja, presos e soltos. Os anos 80 passaram a ter a cara dela, as ombreiras, as maquiagens exageradas inspiradas no Clube 54 em NY e replicadas pelo icônico Hipopótamos que era considerada a maior boate de todos os tempos, no Brasil. O Carnaval tinha muita influência nessa geração – os bailes do Copacabana Palace, o concurso das panteras onde ela chegou a ser vencedora, no ano em que competiu. Era óbvio que seria. Em uma sessão fotográfica já nos anos 90, Xuxa e sua irmã Solange riram e se olharam cúmplices de algum fato no estúdio, que ninguém saberia. Perguntei a Solange, ela disse que elas se divertiam indo aos castings da irmã porque os porteiros dos prédios riam e se divertiam com elas andando de mãos dadas. Era a união das irmãs que tanto amo. Sim, eu as amo!
Nesse mesmo dia eu, com dificuldade de fazer os ajustes da roupa usada por Xuxa, tive a ajuda da Aldinha, que ajustou com linha e agulha o corpete( assim era chamado na época). Ela ficou calmamente dando pontos precisos e a roupa ficou perfeita. Anos depois, em outra sessão, com sua saúde já debilitada as enfermeiras trazem dona Alda para o estúdio onde estávamos fotografando sua filha Sasha. Uma caixa de perucas do lado e Xuxa as colocou todas em sua mãe e riu, sorriram, Alda balbuciava palavras que só a filha entendia. Sua mãe ficou morena, ruiva com franja, loira em poucos minutos.
Xuxa tem um olhar especial com todos da equipe, sem pensar nos mais ou menos importantes porque para ela, todos são iguais. Ouvi várias vezes das minhas camareiras e assistentes além dos motoristas… Marco, ela me olhou no olho. Juro pra você, ela me olhou no olho. E Xuxa olha nos nossos olhos mesmo.
Na Casa Rosa, uma vez levei um maquiador para fazer uma caracterização da Sasha e ele ao vê-la chegando, caiu e desmaiou na frente de todos. Ela já acostumada com isso, deu dois tapinhas carinhosos no rosto dele e disse “vamos lá, a luz já está acabando”. Todos riam timidamente e ela dirigindo o carrinho branco, foi ao ponto mais alto da casa e nem comentou o fato. É normal para ela. Quando foi ser modelo em NY era a época certa, pois as grandes modelos da época tinham seu biotipo. A revista Manchete usou as fotos do seu book na capa da revista.
E a capa dos sonhos para mim foi da saudosa revista Moda Brasil em que ela fotografou sem maquiagem alguma. Em outra ocasião estava na fundação Xuxa Meneghel em um evento com muitos cantores, artista. Nesse momento, Anitta era uma das convidadas e bem no início de carreira, entre estrelas do sertanejo – dona Alda ainda não tinha partido. Estava muito cheio, e era quase impossível chegar perto. No final entre seguranças, fãs, crianças em volta ela me vê de longe… dá um sorriso e percebo que ela vai mudando seu caminho e em direção a mim com todos em volta anda uns 50 metros fora da rota, me dá um abraço e diz ” vou fazer a foto que você falou viu”, só combinar lá no escritório. Está tudo certo.
Por uma ex-empresária fui boicotado e a foto não foi feita. Era um set na praia, como os do Peter Lindbergh, looks esvoaçantes e transparências! Teríamos fumaça e um cabo capaz de levantá-la como no lendário editorial de Linda Evangelista para a Happer’s Bazzar nos anos 90.
Nunca relacionei Xuxa com as fotos que fiz com ela ou as que não fiz. Já tinha minhas boas lembranças e não precisava. Ela já tinha me dado, naquela época, bons momentos pra eternizá-los.
Hoje super mãe, independente, consciente de sua história enfrenta o sistema pelas dores dos outros, inconformada com agressões aos LGBTS, voz ativa anti-racismo, a favor do povo indígena antes desse assunto virar pauta. Ativista pelos animais, quem não se lembra da música Boto Rosa? Fala de política, luta pela liberdade, pelo amor, sua voz ecoa e nos ajuda.
Eu não fui baixinho, mas fui e continuo fã da primeira pop model do Brasil, a modelo que transpôs as roupas para o imaginário popular. A moda deve muito a ela. E ela precisa saber disso.
MENSCH ENTREVISTA: XUXA
Você até pode não ter sido um baixinho ou baixinha oficial da rainha, mas aposto já cantarolou Lua de Cristal, sonhou em voar na nave ou tentou fazer a coreografia de Ilariê no carnaval ou em alguma festa anos 80. Xuxa é um dos grandes fenômenos de público da história da TV e dos palcos. É uma mulher que vive o que acredita, que sabe se reinventar como artista e viver o tempo do agora. Envolvida em vários projetos, a energia e a vontade de se divertir são as mesmas de quando começou na TV cercada de crianças. Filmes, viagens, shows e mais o que der vontade. Aos 61 anos bem vividos, os planos passaram a ser de curto prazo e a maior lição é sobre escolher bem as pessoas que se quer ter por perto. Xuxa é um “xou”. E nessa entrevista exclusiva para a MENSCH ela manda o seu alô. Venha conferir.
Por Nadezhda Bezerra
Janeiro começou com Xuxa, o documentário na TV aberta. A repercussão do doc no Globoplay foi o que você imaginava? Qual a motivação para fazer o documentário? São duas perguntas diferentes. Se foi o que eu imaginava?! Sim, foi muito bom. Quando a gente faz uma coisa bacana como um documentário desse, a gente imagina um resultado muito bom e foi muito bom, porque pude revisitar a minha história, porque está documentado uma coisa bacana que vai ficar para os meus netos verem, para a minha filha ver, para eu rever mexendo em coisas bem bacanas, bem fortes. E qual a motivação para fazer um documentário?! Acho que é o momento que estou vivendo, quando eu consigo não me imaginar parando, mas sim fazendo cada vez mais coisas. Então, foi o momento de eu puder reviver toda minha história e ver para onde vou e o que vou fazer – isso é muito bacana pra mim. Então, a motivação é essa, deixar a tua história atuada.
Como foi passar a limpo toda a sua trajetória? Qual parte foi mais difícil rever? Na verdade, é difícil passar 61 anos de idade ou quase 41 de televisão, 45 anos de profissão, porque comecei trabalhar aos 16 anos. É muito difícil passar isso aí em quatro capítulos, mas foi muito bem feito, muito bem elaborado. Foram muitas pesquisas, tem muitas coisas que eu não sabia, foi muito bacana – tudo. Então, não acho que seria passar a limpo, seria como revisitar, e foi muito bom. Algumas partes foram difíceis de rever – as minhas perdas, os meus abusos, colocando os meus abusadores nos lugares que deveriam estar nunca ter deixado de estar nesse lugar. É muito estranho e difícil ao mesmo tempo.
Em fevereiro, Carnaval e o navio da Xuxa. O que a gente pode esperar dessa navegação em alto mar e em alto astral? Como surgiu a ideia de ter um navio da Xuxa? Carnaval já é alegre e ainda com minhas músicas em ritmo de Carnaval – as músicas que as pessoas conhecem, mas em ritmo de Carnaval, é duplamente divertido. Na realidade, o navio não é uma ideia minha – é de outras pessoas que já fazem seus shows em navio. O que eu quis fazer foi um navio temático, acho que isso foi o diferencial. Colocar exposição, colocar alguns lugares como as minhas com fotos instagramáveis. Um navio com cardápio vegano, uma opção vegana em cada restaurante, tudo isso foi pensado para o público que cresceu comigo e sabe que sou assim, e que gostariam de entrar no meu mundo e, entrando no meu navio, seria entrar no meu mundo.
Hoje em dia, consegue se divertir enquanto trabalha? Hoje, ontem, anteontem e amanhã. Consigo me divertir, bastante.
Março chegou junto com seus 61 anos. Como foi a virada para seis décadas. Quem é a Xuxa de hoje, do que ela se distancia e se mantém próxima da Xuxa dos 15, 20…? Meu aniversário de 60 anos, eu passei no navio. Me senti mais velha e com um peso a mais. Tipo assim, agora não tem mais essa história de dizer que estou envelhecendo, agora, depois dos meus 60, eu repito o tempo todo – agora eu estou velha. Não estou ficando, já estou velha. 60 anos é um número que faz você saber que você, realmente, não tem para onde ir (risos), a não ser 61, 62, 63… Ou seja, não tem como. Nossa, muito! A maturidade é uma coisa marcante e não pra mim, não para essa Xuxa de 15 anos. Eu era uma adolescente que pensava só em trabalhar pra poder ter uma grana e conseguir comprar coisas pra minha família – principalmente, pra minha mãe.
A Xuxa de 20 anos estava entrando na televisão cheia de sonhos, a Xuxa de 23 anos estava realizando mais os sonhos, não só os meus, mais de toda minha família e de outras pessoas que trabalhavam comigo. Aos 30 anos, eu já estava pensando em ser mãe, aos 35 sendo mãe, aos 40 pensando que mundo posso deixar melhor para minha filha, que foi onde me expus, onde eu quis pensar em fazer o melhor pra tudo e pra todos e, aos 50 anos, eu já achei que estava apta a me aposentar e nem pensava em encontrar alguém e encontrei o Juno nos meus 49 anos para 50. Então, agora, nos meus 61 estou uma pessoa madura, vivendo um relacionamento maduro e ainda com muitas possibilidades de fazer coisas bacanas.
Muito se discute hoje sobre o etarismo. Por que envelhecer parece pecado? Ainda mais para mulheres, e mais ainda para as famosas e referência de beleza, como você? Não acho que seria a palavra pecado, mas envelhecer, principalmente, para uma pessoa que sempre trabalhou com a imagem, não é uma coisa fácil. Não é uma tarefa fácil de passar sem sentir o peso da idade. Talvez, para uma pessoa que não usasse tanto a imagem como eu uso, talvez, passasse com menos peso. Pra mim, é só isso. Não acho que seria um pecado, mas sim pesado. Eu acho que, na realidade, nós mulheres ou nós seres humanos, a gente tem certas coisas que são difíceis de aceitar e uma delas é ver os ídolos envelhecerem e, quando a gente passa a ser essa pessoa que estão cobrando, é muito mais difícil. Mas nada que eu não possa, tanto é que tanta gente se mata, tanta gente não consegue nem chegar a mais idade pela fragilidade que fica. Mas, no meu caso, nada que tenha mexido bastante, porque eu tive muita sorte de ter alguém do meu lado que gosta de mim do jeito que eu sou – me aceita do jeito que eu sou. Então, fica muito mais fácil. Além dos meus, tenho uma filha que me acha linda do jeito que eu sou. Então, está tudo bem.
As pessoas têm uma ideia da velhice como uma fase sem serventia, sem sonhos, sem produção, somente um período de espera para o fim da vida. Entretanto, faz tempo, temos grandes exemplos de pessoas que seguem ativas e cheias de planos e projetos depois dos 60, 70, 80 e até 90. Você pensava assim quando era mais jovem? E quais os planos pra daqui a 10, 20 anos? Olha, quando a gente é criança acha que chegar aos 20 anos é já chegar à maturidade. Uma criança constitui uma pessoa de 20 e fala, uau. Uma criança quando olha para uma pessoa de 30 anos – eu pelo menos pensava assim. Aquela senhora de 30 anos, quando eu via uma de 40 anos falava aquela vovó de 40 anos, e uma de 50 já era uma senhorinha. E quando você chega aos 20, aos 30, 40, 50, 60, você não consegue mais ver dessa maneira, mas ums criança pensa assim, porque 1 ano já é muita coisa, imagina 10, 20, 30, 40, 50 anos – é muito mais.
Não sei, não dá pra imaginar, quanto mais colocar números, acho que vai pela tua oportunidade e a tua vontade. Eu tenho muitas oportunidades e muita vontade de fazer muitas coisas. Então, eu acredito que vou continuar – vou ser uma dessas pessoas que não têm um número que vai me parar e sim. Vai ser a vontade dos outros, do público e a minha vontade também. Enquanto existirem pessoas que ainda querem me ver fazendo coisas na televisão, eu vou estar. Enquanto existirem pessoas que continuam me vendo de uma maneira carinhosa, respeitosa – eu estarei fazendo algo para essas pessoas.
Eu prefiro pensar nos meus planos para daqui a 1 ano, não para 10, porque acho que depois de certa idade, você não pode ficar pensando. Eu acho que ninguém deveria pensar assim. Você tem que viver muito o teu hoje no máximo, daqui a 1 ano. Eu me imagino daqui a 1 ano fazendo uma turnê linda, alguns projetos de filmes, fazendo alguma coisa bacana, bonita – talvez para a televisão mesmo, não só para cinema. Me imagino continuando a trabalhar com crianças fazendo meus XSPB, 14, 15, 16. Me imagino ainda fazendo fotos bacanas de uma mulher com mais idade , é isso. Agora não para 10 anos, mas para 1 ano só, 10 anos é muito. Daqui a 10 anos você me pergunta de novo.
Você parece não ter qualquer receio de expor sua opinião nas redes sociais. Como era sua relação com o público no auge do Xou da Xuxa e como é agora? No show da Xuxa todo mundo sabe, eu era aquilo lá saltitante, pulante, falando tudo o que eu pensava ou falando sem pensar e agora, depois dos 60, eu posso falar tudo porque eu já passei dos sessenta – posso falar as coisas porque é aceitável. Então, virei a menina do Show da Xuxa. Posso falar. Mas, na realidade, o que eu penso não é mais o que alguém fala pra mim o que tenho que falar. Aí eu falo, me informo, escuto as coisas, acho que aquilo é bom pra mim e repito ou não – já foi a fase que tinha pessoas que diziam “você fala assim, senta assim, pensa assim”.
Desde o início de sua carreira você já trazia o tema do meio ambiente, da ecologia. O que falta, além das mudanças climáticas e catástrofes ambientais, para as pessoas se conscientizarem que é preciso mudar a relação com a natureza e os animais? Nossa, se eu soubesse a resposta, tenha a certeza que eu te daria. Mas, o que eu posso te afirmar é que tem pequenos gestos que a gente pode fazer individualmente cada um, cuidando da natureza de uma maneira muito individualmente. Se você tirar os animais do seu prato, você já vai ajudar muito, muito, muito, muito, muito, muito mais mesmo. Na natureza, no meio ambiente, eu acho que é uma coisa que todo mundo poderia fazer e as pessoas não fazem por falta de informação. Então, o bacana seria que as pessoas se informassem – existem vários documentários falando sobre isso. Como é importante as pessoas tirarem os cadáveres dos animais dos pratos para que a gente possa ter um resultado melhor. Menos árvores destruídas, menos sofrimento animal, porque a gente não pode se achar superior ao ponto de querer não só comer outros seres, como também achar que a gente não vai pagar um preço como já estamos pagando agora – e vamos pagar cada vez mais, se não nos conscientizarmos disso. Acho que estamos bem atrasados, deveríamos fazer para ontem.
Falando em animais, já faz muito tempo que você é adepta do veganismo. Podemos dizer que mais do que uma escolha alimentar, o veganismo é uma ideologia de vida? Com certeza o veganismo é uma grande mudança na vida das pessoas. Mas, pra mim, o que eu posso dizer é que entrei no veganismo por paixão aos animais, o Ju foi por saúde e a minha filha foi porque não gosta da energia da morte dentro dela. E eu tenho certeza que algumas outras pessoas vão dizer que é para ajudar o meio ambiente, que é pra poder se sentir bem e, assim, vai indo. Quanto ao mais, é as pessoas começarem com uma alimentação à base de plantas, e verem o quanto vai ter de mudanças positivas – não só na vida da pessoa que faz, como no meio ambiente l, em tudo envolta, porque é uma outra energia, é um outro olhar pro mundo. E, realmente, você olha para as pessoas de forma diferente. Você olha para os animais de forma diferente – você se vê diferente. Sem dúvida nenhuma é uma grande mudança de hábitos, de costumes, e é muito saudável a gente poder se vê nessa tribo pequena, pequena ainda, porque eu acho que o veganismo é o futuro.
Conta pra gente como foram as filmagens de Tarã, a nova série de ficção da Disney + que debate o meio ambiente, povos originários, ancestralidade, sustentabilidade e outros temas importantes? A gente fez o Tarã em um tempo bem curto. Passamos por alguns maus momentos. Fomos ao Acre onde estava muito quente, depois fomos a SP e estava muito frio e agora, estamos no processo de pós-produção que é bem difícil porque me parece que a Disney tem, como se fosse uma apostila para seguir, que não estamos muito acostumados. Quando digo “a gente”, é a produção com tudo com que a gente tem que aprender a lidar – com essa apostila, com essa bíblia que é dada pela Disney Plus. Mas, eu gostaria muito de fazer outros projetos, não só o Tarã e gostaria que Tarã deixasse uma sementinha no coração das pessoas. É essa a minha vontade.
2023 também foi o ano de sua volta às telas do cinema com Uma Fada Veio Me Visitar. Como foi essa estreia depois de tanto tempo, o que sentiu de diferente e o que estava diferente em você como atriz? A gente fez o filme em tempo bem curto, porque eu tinha acabado de sair da Caravanas das Drags e já ia entrar em outros projetos e tinha pouco tempo para poder fazer tudo. Eu acabei a filmagem e já entrei no documentário. E uma das coisas bacanas foi a história que eu já conhecia da *Talita* Então, para mim foi muito bacana poder fazer uma Fada Veio me Visitar e trabalhar para o público infantojuvenil. Para mim, para a família é muito legal. Seja qual for – seja fazendo uma campanha de vacinação ou seja indo para uma tela grande, é sempre muito bom, muito bom. E foi uma descoberta muito bacana trabalhar com a Tonton que eu acho uma menina de ouro e eu gostaria muito de continuar fazendo trabalhos para a família e para a criança, como eu disse antes, na telinha ou na telona.
No Criança Esperança houve o histórico encontro entre você, Angélica e Eliana, que inclusive fez um discurso lindo e importante sobre as inúmeras tentativas de se criar uma rivalidade entre vocês. A dita rivalidade feminina é um projeto machista? Como reverter essa ideia e prática? Bem, eu acho que você já perguntou respondendo. Sim, é um projeto machista. É um projeto que, na minha opinião, só existe porque, ainda, algumas mulheres não entenderam o quanto é difícil sermos mulher em um mundo onde as pessoas acham normal um homem bater em mulher, um homem xingar mulher. Acha normal a mulher ganhar menos que o homem, acha normal esse título de sexo frágil, e a gente repete muitas coisas e não quebra esse ciclo e não faz isso mudar. Então, foi bacana a gente ouvir aquilo, mas, como você mesmo disse é um projeto machista. E para reverter tudo isso em pequenos gestos, em pequenas coisas que somam grandes atitudes. O que as pessoas não estão vendo é que existem pessoas boas, mulheres, jovens que brigam diariamente por um espaço maior. O que as mulheres não estão vendo é isso – muitas mulheres não valorizam o que muitas outras mulheres fizeram no passado, que ainda estão fazendo agora e vão continuar fazendo para que isso não aconteça. Mas, o mais importante é a mulher dar a mão a outra, não derrubar porque quando a gente faz alguma coisa errada e bota, por exemplo, no Instagram uma foto sem maquiagem, se tiver mil comentários ruins, tenha a certeza que mais de 50% são de mulheres te criticando. Isso já é uma grande falha, eu acho que a mulher não deveria nunca criticar uma outra mulher, seja ela qual for – pelo corpo, pela roupa, pela atitude. Homem não faz isso – é raríssimo a gente ver isso. Homem, o primeiro passo que faz é ficar do lado do outro homem. A mulher, a primeira coisa que faz, é criticar. Então, enquanto não mudarmos isso, mudarmos esse pensamento será difícil a gente querer mudar o mundo.
Voltando sobre os projetos, para outubro tem produção de documentário sobre as Paquitas, o que pode adiantar para a gente? É que vai ser um documentário que vai mexer com muitas pessoas de muitas idades, muitas meninas que queriam ter sido Paquitas, muitas meninas e meninos que hoje são homens e mulheres, que não entenderam que é ser Paquita. Muita gente que vai realmente se emocionar, porque são histórias bonitas, muitas pessoas que vão se colocar no lugar, porque elas passaram por abusos e tal, e vão-se ver e vão dizer nossa, uma pessoa para quem eu trabalho me trata assim e não deveria, estou vendo dessa maneira agora, abrindo meu olho. Acho que vai ser muito importante para as Paquitas principalmente, porque elas vão poder depois, como aconteceu comigo, eu pude me abraçar, abraçar aquela criança, aquela jovem, aquela menina, aquela adolescente, aquela mulher que sofreu tanta coisa e não recebeu abraço, eu pude me abraçar agora e acho que para as Paquitas também falta isso é o documentário vai dar essa oportunidade para elas.
2024 é também o ano da turnê O Último Voo da Nave. O que o público pode esperar e, por que o último? Porque a nave precisa se aposentar, eu não. Mas, a nave, sim porque cada vez que eu trago a nave fisicamente para os lugares, as pessoas me imaginam saindo dessa nave – aquela pessoa de xuquinha, de botas com aquelas roupinhas – eu acho. Eu não quero aposentar minhas botas, não quero aposentar meu estilo de roupa, de vida, mas eu quero aposentar a nave. A nave sim, e vai ser o último voo dela fisicamente. Talvez, ela possa voltar em desenho de computador, em uma outra maneira, em um outro lugar – mas, ela, fisicamente ,vai ser a última vez que eu gostaria que as pessoas a vissem. E as pessoas podem esperar o último voo da nave.
Dentre seus projeto futuros está a série Rainha, na Globoplay sobre sua vida com interpretação de muitos autores e atrizes já conhecidos do público. Em que pé está? Qual sua expectativa em ver sua história contada por outras pessoas? Essa história de perguntar qual é a expectativa, eu sempre vou dizer que são as melhores. Então, não gostaria de responder essa pergunta. Mas vou te falar em que pé está. Estamos fazendo modificações da linha do tempo e buscando os atores e atrizes que vão interpretar a minha história no filme.
Com o tempo, a experiência e o conhecimento de hoje teria sido uma Rainha dos Baixinhos diferente? Em que? Com a minha maturidade de hoje, fizesse o Show da Xuxa?! Nossa! Eu não teria muita gente ao meu lado me mandando fazer um monte de coisa, não precisaria e nem teria.
Você conheceu o Papa João Paulo II, passeou por NY com John Kennedy Jr., voou com Senna, jantou com Michael Jackson… O sonho de muitos era uma realidade para você. Como isso lhe tocava? Faltou conhecer alguém que você admirava muito? Na realidade, eu acho que todas essas coisas aconteceram porque eu as estava vivendo, também. Um dos momentos mais importante da minha vida da minha carreira, porque eu tive um tempo na televisão que acho que ninguém teve de domingo a domingo, na terceira maior televisão do mundo e eu tinha a manhã toda, de domingo a domingo, das 8h até 13h. Eu acho que era normal ou até ter todos esses encontros e muitos outros mais. E, com certeza, gostaria de ter conhecido outras pessoas, mas não quero falar o nome dessas pessoas para não desmerecer as que eu conheci.
Olhando toda a sua trajetória de muitas emoções, perdas e ganhos. Faria tudo novamente da mesma forma que foi até aqui? O que faria diferente que resultaria numa mudança nessa Xuxa de hoje? Não. Claro que não. Tiraria muitas pessoas de perto de mim – sanguessugas e que abusaram de mim afetivamente, psicologicamente, usando seus poderes e sua ruindade. De jeito nenhum eu deixaria isso. Não queria. Não faria isso novamente, não daria permissão para fazerem isso que fizeram comigo. Hoje, eu seria, talvez, menos machucada, menos, não digo amargurada, porque não sou uma pessoa amargurada, mas menos machucada com certeza. É isso, acho que, acreditar nas pessoas erradas, é uma coisa que me machuca muito.
Para encerrar… Pode mandar um beijo pra minha mãe, pro meu pai e eu mandar pra você? Para quem você mandaria um beijinho e um tchau tchau? Com certeza os meus melhores beijos sempre vão para minha filha e tchau tchau para os políticos ruins que passaram nessa vida e que ainda vão passar.
Fotos Brunno Rangel
Direção criativa Marcelo Feitosa