Quem vê o ator Dalton Vigh lutando espada com maestria ou enfrentando duelos perigosos em “Liberdade, Liberdade” não imagina todo o processo até chegar a isso. Acredito que nem ele se imaginava nisso tudo. Sempre disposto a um novo desafio, seja dentro ou fora da TV, Dalton em breve enfrentará mais um outro desafio, dessa vez bem mais longo e prazeroso, ao se tornar pai de gêmeos. Enquanto isso o ator segue com muito bom humor e dedicação a tudo que se propõe a fazer com maestria.
Com a chegada de Dom Raposo na sua vida você teve que mudar alguns hábitos e a aparência. Como foi e tem sido esse processo? Quando o Vinícius me ligou para falar do Raposo, as únicas recomendações dele foram para deixar a barba crescer e ganhar peso. Depois, quando li os primeiros capítulos, é que fui entender porque… Num mesmo capítulo, Raposo tinha três sequencias de lutas, além de erguer um bandido acima da cabeça e quebrar sua espinha. Por conta própria, resolvi começar com a musculação não só pra ganhar massa mas também pra “aguentar o tranco” do que viria pela frente. E, como já previa, foi um processo árduo e exaustivo, mas extremamente prazeroso. Cada uma dessas sequencias levou mais de um dia para ser gravada, porque ensaiávamos cada movimento com muito cuidado para que nada desse errado, afinal eram cenas onde acidentes não poderiam acontecer em hipótese alguma, e ao término de cada dia, comemorávamos como se tivéssemos vencido uma batalha. Claro que, para que tudo corresse bem durante as gravações, antes de começarmos tivemos um mês de “Workshop”, oficinas de leituras de capítulos junto com aulas de prosódia e treinos de lutas, esgrima, equitação além de palestras sobre História do Brasil, com foco no movimento da Inconfidência Mineira. Isso tudo, além de nos ajudar a encontrar nossos personagens individualmente, serviu para criarmos os laços entre personagens dentro desse universo tão distante dos dias de hoje.
O que é pior entrar na rotina, a musculação, lutar com espada ou deixar a barba crescer? Todas as alternativas acima…(risos) Não sou o maior fã de musculação, lutar com espadas me causou tendinite e a barba confesso que coça e pinica, mas claro que tudo pelo personagem.
De “Tocaia Grande” (1995), na Manchete, até “Liberdade, Liberdade”, no ar atualmente, já se vão mais de 20 anos de carreira. Que análise faz dessa trajetória? Se sente realizado? Quando comecei, minha única preocupação era se eu conseguiria sobreviver dessa profissão e minha única expectativa era que não me faltasse trabalho para conseguir pagar as contas, então, acho que posso me considerar até mais que realizado.
Do malvado Clóvis, de “O Profeta”, ao herói Dom Raposo, são vários tipos, de vilões à mocinhos. Algum tipo te deixa mais confortável ou te desafia mais? Sempre achei muito mais divertido fazer vilões, existe muito mais espaço e liberdade para o ator criar ao fazer um vilão do que um mocinho, que tem que obedecer certas regras de conduta, ao passo que o vilão, quanto mais louco, melhor. Aí vem o Raposo pra me fazer desdizer tudo isso… É o primeiro mocinho onde tive toda liberdade para sugerir ações, o que chamamos de “preencher a cena”, pequenas ações ou gestos que não estão no texto e que nos favorecem a mostrar o que o personagem está pensando ou sentindo.
Aos 51 anos os desafios como ator tem sido maior do que aos 30 quando você começou na TV? Ou o contrário, agora seu nome está bem firmado e a coisa flui mais fácil? Costumo dizer que é maravilhoso fazer um personagem que tenha cenas de luta, tiro, cavalos, é como voltar a ser criança, brincar de mocinho e bandido, só que, ter aparecido quando eu tinha uns trinta, teria sido bem mais fácil. (risos) Mas, falando sério, acho difícil traçar uma comparação, se, por um lado, a falta de experiência e o fato de ser um desconhecido no começo dificultaram um pouco, por outro, ter o nome estabelecido pode restringir também, existem muitos trabalhos onde se dão preferência a “caras novas”, independente de idade, então, não sei se sei responder a essa pergunta.
Grande parte dos seus trabalhos foram para a TV, isso facilitou na hora que encarar algum projeto para o teatro ou cinema? A vitrine que a TV dá realmente ajuda até na hora de captar recursos para uma peça? A TV, sem dúvida, continua sendo a grande vitrine, continua sendo o meio para mostrarmos nosso trabalho e daí abrirmos portas para outros convites no Cinema e no Teatro. Mas, da mesma forma que facilita de um lado, pode gerar um receio quanto à sua disponibilidade de outro. Quanto a ajudar na hora de captar, ainda não sei, nunca entrei com nenhum pedido de captação, nunca produzi nenhuma peça ou filme, mas pretendo começar em breve e aí vou poder responder…
Falando nisso, como você vê a atual discussão sobre Lei Rouanet e a extinção e volta do Ministério da Cultura? Nunca usei a Lei Rouanet e por isso não tenho propriedade para discutir sobre o assunto. Em relação a volta do Ministério da Cultura, foi uma vitória já que houve um grande clamor popular.
Como você avalia a produção de cinema nacional? Estamos indo bem? Acha que até melhor que o cinema americano, levando-se em consideração o volume das produções em cada país? Acho que estamos indo muito bem, mas ainda é muito gritante a diferença na quantidade de produções em exibição aqui no Brasil de filmes nacionais e americanos, é notável, os “blockbusters” sempre tem maior número de salas a disposição do que as maiores produções nacionais.
“Liberdade, Liberdade” muitas vezes em seus diálogos e situações mostra um Brasil bem atual à pesar do grande espaço de tempo entre a história e a situação atual do país. Como você vê isso? Acho que não poderia haver melhor momento do que esse pra a novela ser exibida. Podemos perceber que os problemas que o país enfrentava, como o descaso da Coroa para com a população, continuam no Brasil de hoje, onde quem governa pensa que tudo pode porque tem a garantia de imunidade que os cargos oferecem. E, de uma certa forma, estamos vivendo uma revolução, não sabemos ainda onde tudo isso vai dar, mas podemos ter a certeza que estamos testemunhando um momento histórico para o Brasil.
Ter como base fatos e personagens reais para uma história de ficção traz um desafio maior? O que achou dessa proposta de novela? O compromisso sempre é maior quando se trata de personagens reais. Já havia feito o Luigi Rosseti em “Casa das Sete Mulheres”, mas era uma minissérie, numa novela talvez seja inédito, e, como acho interessante juntar informação com entretenimento, torço para outras produções do gênero tenham cada vez mais espaço na TV.
Você está prestes a ser pai de gêmeos. Está preparado para esse novo desafio? Mais difícil que encarar Mão de Luva e Rubião juntos?! (risos) Ainda não sei se é mais difícil… Vou responder com mais propriedade essa pergunta daqui a uns vinte anos! Mas você acaba de dar uma boa ideia para os nomes dos meninos, Mão de Luva e Rubião. (risos)
Como é sua rotina quando não está gravando ou com peça? O que curte fazer? Gosto muito da nossa casa, tenho uma aparelhagem de som “Vintage” e fico horas ouvindo discos e gravando fitas cassete (isso mesmo), além de ver e rever filmes e às vezes, montar miniaturas da aviação civil e militar e espaçonaves de ficção científica. Ah, e passear com Charlie Jr., nosso golden retriever.
E a vida à dois, onde é mais fácil e mais difícil? O que aprendeu ao longo do tempo? A convivência do dia-a-dia as vezes gera atritos, a forma como se lida com esses atritos é que pode facilitar ou dificultar a relação. O que o tempo me ensinou é que a sua mulher tem sempre razão. (risos)
No dia-a-dia você lida bem com o espelho? É um homem vaidoso? O tempo que gasto na frente do espelho é o suficiente pra escovar os dentes, pentear o cabelo e ajeitar a roupa. Me preocupo em estar apenas apresentável e bem vestido.
Até onde pretende que a arte de atuar ainda te leve? O que você ainda almeja? Que eu continue me encantando com a arte de atuar, que a magia siga acontecendo e me proporcionando momentos inesquecíveis e indescritíveis, propondo indagações e questionamentos que mudam a forma de enxergar o que é a vida. O que almejo? Continuar pagando as contas fazendo o trabalho que gosto. (risos)