A paixão pelo teatro é sem dúvida o que move o diretor e ator de teatro Cacá Rosset. E foi justamente essa paixão que o fez, juntamente com outros aficionados pela dramaturgia, criar sua própria companhia de teatro e ganhar o mundo num ofício tão antigo quanto a história do homem que é subir ao palco para contar uma história. Da fase mambembe até a consagração pela critica americana, ao dirigir uma peça de Shakesperare em NY, Cacá bateu um papo conosco para relatar alguns desses belos momentos até sua atual peça. Sobre o futuro? Muito teatro ainda, e uma “aposentadoria” inquieta, pois ele não consegue parar nem quando está dormindo!
Como surgiu a ideia de fundar o Ornitorrinco? O grupo foi fundado no final dos anos 70 por mim, Maria Alice Vergueiro e Luiz Galícia (já falecido), ligados à USP/SP. Maria Alice eu já conhecia desde os 11 anos. Na época ou você era “global” ou alternativo demais. Queríamos fazer de uma terceira forma. Algo com a nossa cara. Começamos a montar um espetáculo, modesto. Era tudo meio clandestino… Em um porão, informal, na base do boca a boca. Ao fim do espetáculo passávamos o chapéu. Não dava dinheiro. E às vezes até levavam o chapéu! (risso). Ao longo do tempo fomos ampliando nossos horizontes, se profissionalizando… Era bem aquela coisa ancestral do teatro, de viver viajando…
Você é se diria criativo ao extremo, ortodoxo, excêntrico ou alguém que sabe fazer as coisas de um jeito diferente sem medo de ousar? Eu acho que teatro é o que realmente eu gosto, tanto como ator como expectador. Ao contrário desse universo tecnológico em que vivemos de redes sociais, iPhones, iPads… o teatro é um dos poucos lugares no mundo, que é feito ao vivo. Sem cortes, sem lentes, sem transmissões. Acho que embora seja uma arte primitiva, ele relata as utopias humanas, onde se compartilha idéias, que acontece uma interação dos artistas com o público. O teatro vive da materialização dos sonhos. O teatro quem não viu, não verá. Não tem como “rebobinar”. Você pode até filmar, mas não é como o aqui e agora. É um castelo de areia com encontro marcado com o expectador, e todo dia vem uma onda e acaba tudo. O que sobra no corpo e na mente são as idéias, utopias, questionamentos… Isso é a função da arte. É o efeito transformador.
Você já recebeu inúmeros prêmios no Brasil e no Exterior, onde realizou diversos trabalhos. Você os buscou, eram objetivos seu ou foram simplesmente resultado de um trabalho bem feito? De fato foram resultado. Coisas que foram acontecendo decorrente do trabalho.
No final da década de 80 você estreou na TV Manchete o programa “Cadeira de Barbeiro”. Foi seu início na televisão e de lá pra cá muitas outras participações aconteceram como ator, apresentador, debatedor…gosta de experimentar diferentes situações, por em prática seus diversos talentos? É um inquieto? Olha, os trabalhos que fiz na TV sempre foram muito por acaso. Nunca investi na TV. Fiz programas esportivos, de entrevistas. Sempre estive presente durante a entressafra dos meus trabalhos no teatro. Eu diria que fazer TV sempre foi uma atividade secundária, mas nem por isso menos importante. Mas o teatro sempre foi minha preferência.
Os 30 anos do grupo Ornintorrinco foram comemorados com a peça A Megera Domada. Por que esta escolha? Nós do Ornintorrinco sempre tivemos uma ligação muito forte pelo Shakespeare. Nos anos 90 estreamos “Sonhos de Uma Noite de Verão”, que foi um sucesso de público e de crítica. Sempre foi um dos meus autores preferidos. A Megera Domada é a eterna guerra dos sexos. Divertida. Atinge todos os expectadores. Do mais sofisticado ao mais popular. Independente de idade, classe social. Um teatro verdadeiramente popular que consegue se comunicar com o amplo público.
Você dirigiu a atriz Marisa Tomei em Nova York. Pensava: “uau estou dirigindo uma atriz de Hollywood” ou não houve esse tipo de deslumbre? Foi uma coisa inesperada. Em 1993, logo depois que tinha estrelado “Sonhos de Uma Noite de Verão” em NY, fui convidado para dirigir “A Comédia dos Erros” numa montagem americana. Ela foi uma pessoa muito agradável. Muito profissional. Uma super produção. Na época saiu na revista TIME. Foi incrível trabalhar pela primeira vez com atores americanos. De maneira geral foi muito tranqüilo. Os atores e a estrutura toda é muito profissional. Quando fui dirigir, fui só o diretor. Dedicado apenas a só dirigir. Por que aqui no Brasil você termina fazendo um pouco de tudo né?! (risos)
Em 2001 você começou carreira de comentarista de futebol, foi pelo amor ao esporte ou para experimentar uma nova carreira? Como eu estava te falando, minha ligação com a TV foi sempre por acaso. Um dia (o apresentador) Milton Neves me ligou fazendo o convite para participar do programa dele. Fui, gostaram e me chamaram novamente. EU não estava em cartaz. O fato é que essa “brincadeira” durou 6 anos. Eu gosto muito de futebol, desde moleque. Não sou comentarista. Talvez que tenha funcionado seja justamente isso. Eu acabei fazendo um pouco um personagem de mim mesmo. (risos) Aquele torcedor apaixonado, que grita, vibra, xinga… de uma certa maneira como se comporta o torcedor. Mas não tinha pretensão de ser comentarista.
O Corinthias para você é… Ah o Corinthias é uma possibilidade de ver o mundo colorido através de lentes alvi-rubras. (risos)
Comédia, drama, esporte, o que mais te move? Olha, eu não tenho nenhum hobby específico. O trabalho que eu faço é tão gratificante. Nunca senti necessidade de me dedicar a outras atividades. Não sinto uma divisão entre trabalho e laser. Não tenho horário para trabalho e horário para laser. Quando você está no processo criativo, você não tem isso. Qualquer hora é para trabalho, até no sonho eu posso ter idéias.
Falamos do passado, e sobre o presente, o que está aprontando agora? No momento estamos fazendo o Ornitorrinco Canta Brecht e Weill, na Casa de Francisca, nos Jardins (SP). Weill é um grande compositor alemão, trabalhou com Brecht, escreveu grandes peças no teatro musical. Sempre com sátira política, provocativo, sensual, como o espírito do cabaret alemão dos anos 20. As letras de Brecht tem isso, um lado um humor forte e uma crítica social, acidez, algo corrosivo, irônico. Basicamente um cabaret musical em cima da obra desses dois grandes artistas. Ficamos em cartaz em São Paulo, depois vamos à Porto Alegre e em julho ou agosto voltamos para uma temporada em SP.
E ao mesmo tempo estou programando “Agonia, Êxtase e Steve Jobs”, do americano Mike Daysey. Que é uma peça bem intensa sobre a tecnologia nas nossas vidas hoje em dia. O texto fala dessa escravidão da indústria da tecnologia na China, com condições precárias… É mais dramática. Estou produzindo a peça. Não tem uma data precisa ainda.
E os planos pro futuro? Acho que continuar fazendo teatro, as peças… Eu sempre trabalhei com minha própria companhia. De certa maneira eu sempre escolhi meus projetos. Não sou o que se chama de “diretor de aluguel”. De resto é ter uma velhice tranqüila. (risos)
E como foi fazer esse ensaio, com essa maquiagem que lembra o Coringa? Na verdade essa maquiagem e figurino eu uso no espetáculo, que é uma tradição do cabaret desde o século 19. Essa máscara branca faz parte do teatro. Marca registrada do cabaret alemão, francês… Quando Ângelo (fotógrafo) e Patrícia (da assessoria de imprensa) assistiram, quiseram fazer essa ligação. Mas pô, eu sou muito mais bonito que o Jack Nicholson, (risos), só que a conta bancária dele é maior que a minha! (risos)
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