Enquanto brinca com seu ócio, como o próprio Leo Falcão diz, Leo sai se aventurando por diversos caminhos, seja por cinema, música, quadrinhos, literatura ou mesmo desenhos e ilustrações. O importante, para esse inquieto Leo Falcão, é ir se descobrindo e descobrindo sua capacidade criativa em diversas mídias. Premiado nos festivais de cinema, como o Cine PE, Leo hoje transita por jogos e quadrinhos. Porém se espalha mesmo quando o assunto é cinema, contar ótimas histórias sejam elas reais ou não. O importante é criar. Criatividade que descobriu no curso de Propaganda e Publicidade e não largou mais. Conversamos com o inquieto Leo e descobrimos que o céu é o limite para esse Falcão que traz a veia criativa dos tios João e Adriana Falcão.
O seu blog “Leitor Ótico” é mais um espaço profissional ou pessoal?
Acho que os dois, até porque eu não dissocio tanto uma coisa da outra. De toda forma, estou trabalhando num novo site, mais completo, em que possa dividir melhor crônicas, notícias, vídeos e meus experimentos literários. Devo estar lançando no segundo semestre.
Você foi o primeiro cineasta pernambucano a filmar no formato digital. Pra você as novas ferramentas tecnológicas mais ajudam no produto final ou faz perder um pouco o charme original do cinema de arte? O cinema sempre foi tecnologia, e qualquer atribuição de “charme” vem da glamorização feita pela indústria. E o cinema “original”, mesmo aquele que apresentava alguma intenção artística, demorou a ser considerado uma atividade digna de figurar no hall da arte. Certamente que são dinâmicas diferentes de produção que resultam em trabalhos finais diferentes, mas via de regra trata-se sempre de uma expressão audiovisual intermediada por aparatos técnicos. O que importa mesmo é o que você põe na tela, e de como você consegue utilizar o formato a seu favor. Hoje em dia, é possível conseguir uma qualidade excepcional com suportes digitais — e charme também.
A publicidade te levou ao cinema ou o cinema te levou a Publicidade? Meu ingresso no mundo publicitário foi meio contingencial, pois na época era a forma de conciliar um monte de coisas que eu queria continuar fazendo e não sabia por qual optar (texto, desenho, música). E foi no curso de publicidade que aconteceu um episódio que costumo contar, de como descobri um possível talento para o cinema. Eu apresentei algumas páginas de quadrinhos para um professor que trabalhava com cartuns, e ele me disse que meu traço não tinha identidade (ele estava certo!), mas que eu daria um bom diretor de cinema. Meio frustrado, perguntei por que, e ele respondeu que os enquadramentos e o fluxo de montagem estavam muito bons. Neste sentido, acho que nem o cinema me levou à publicidade, e nem o contrário — acho que a escrita, os quadrinhos e a música me levaram aos dois. Da mesma forma, o cinema veio para preencher uma lacuna que permaneceu na minha vida depois que eu comecei a trabalhar com publicidade, que era a de contar histórias. Em termos técnicos, foi na publicidade que comecei a conhecer e praticar a gramática cinematográfica, além de ganhar experiência e estabelecer relações com produtores e técnicos. Neste sentido, meu trabalho em publicidade veio antes, mas não foi o que definiu minha carreira cinematográfica. Tudo aconteceu de forma bem natural, me parece.
Qual dos prêmios que você já ganhou foi mais representativo para sua carreira? Cada prêmio tem uma história, e não saberia dizer qual foi o mais importante. Lembro de alguns momentos especiais, como o primeiro que ganhei fora de casa, o da TV Cultura no Festival de Curtas de São Paulo. Foi especial porque eu não esperava, e terminou dando alguma visibilidade para a minha carreira. Mas também foi bom ter ganhado melhor roteiro de curtas digitais no Cine PE de 2007 — gosto do resultado e do filme, e na época fazia algum tempo que não frequentava festivais. Enfim, prêmios são bons se contribuem para você continuar trabalhando e indo mais longe.
Seus tios, João e Adriana Falcão, são sucesso na TV. Isto não te inspira a investir neste meio mais do que no cinema? A TV tem dinâmicas bem menos autônomas que o cinema, e é preciso saber jogar com elas. Eu me aventuraria na TV, sim, como me aventuraria em qualquer mídia — tenho feito isto, na verdade, com “Santo por Acaso” para a TV Jornal, em 2007, e “Carícias”, primeira peça de teatro que dirigi, em 2009. Recentemente, fiz alguns roteiros para jogos e instalações multimídia e estou cogitando fazer quadrinhos de novo, praticando um traço mais solto. Enfim, estou tentando fazer com que minha falta de foco se torne algo produtivo.
A sala de aula é um lugar de inspiração para futuros roteiros? Qualquer lugar é inspiração para roteiros futuros (ou presentes, no caso de você estar à caça de idéias para algo que já esteja sendo desenvolvidos). Mas pra mim a sala de aula é prioritariamente um espaço pra trocar idéias e dar vazão a outros roteiros, não meus. Tenho muita consciência do meu papel de professor neste sentido.
Pra quem você faz filmes? Muitos cineastas respondem que fazem filmes para si mesmos. Eu não sei se posso dizer isso, pois tento me comunicar com o público, mesmo que dentro de estatutos que estabeleço como expressivos de cada trabalho. Acho que eu faço filmes para o público, porém para um público parecido comigo. Talvez dizer isso seja a mesma coisa de afirmar que faço filmes para mim mesmo, mas há uma sutil diferença. Eu quero que a obra reverbere no público, mas antes de tudo quero estar feliz com ela. No fim das contas, quem está falando sou eu.
Ler, ver e ouvir. O que você curte em cada categoria dessas? É difícil dizer, tem muita coisa boa feita no mundo. Mas pra dar um resumão, em literatura me agrada muito as histórias fantásticas e policiais inglesas, como Agatha Christie, Conan Doyle, Edgar Allan Poe e, mais recentemente, Neil Gaiman, Suzanne Clarke, Paul Auster e Alan Moore. Gosto também de Umberto Eco (tanto sua produção literária quanto acadêmica) e outros nomes da literatura latina como Borges, Cortázar, García-Marquez e Saramago. Calvino e um escritor italiano contemporâneo chamado Alessandro Baricco também. A lista seria infindável se incluirmos outros clássicos, mas vamos parar por aqui. Em cinema, é igualmente difícil dizer, mas pensemos em Hitchcock, Eisenstein, Wilder, Capra, Truffaut, Kubrick, Fellini, Antonioni, Wenders, os filmes do Monty Python, além de outros contemporâneos como Paul Thomas Anderson, Lars von Trier, Alfonso Cuarón e Wong-kar Wai. Quanto a ouvir, Beatles e um monte de outras coisas. A música pra mim é um terreno infinito.
Você se define como Cineasta, professor e músico mas se tivesse que optar por apenas uma dessas 03 profissões, qual seria? Se fosse só uma, acho que nenhuma delas. Sou um contador de histórias, um escritor, só que em mídias diversas. Seria a maneira mais fácil de me conciliar, acho.
Você chegou a fazer um “estágio” de residência no núcleo de Guel Arraes, na TV Globo (Rio), como roteirista. Como foi essa experiência? O que ela agregou à sua carreira? Com Guel, Adriana e João (Falcão), além de André Laurentino, que trabalhava conosco na época, eu aprendi a ser rígido com o roteiro, de não me contentar em contar uma coisa de qualquer jeito, mas de elucubrar e exercitar e buscar o melhor modo possível de expressar as coisas. Terminei tomando um caminho diferente do deles em termos estilísticos, mas essa lição de buscar a justa forma ficou. Sou grato por isso.