BEBIDA: Vinho Tinto, a excelência e a tradição dos vinhos Ramos Pinto.

 

Um dos vinhos mais populares e consumidos, o vinho tinto é apreciado tanto por enólogos que param para avaliar sabores e safras, quanto por consumidores em geral que procuram um bom vinho para celebrar bons momentos. E a tradição do vinho tinto e do vinho do Porto em Portugal é algo que vem de geração em geração, apurando o sabor em busca do vinho perfeito. É dentro desse espírito que recebemos o enólogo de uma das mais tradicionais vinícolas européias, a Ramos Pinto, para sabermos um pouco sobre essa bebida clássica e um pouco da história dessa marca que se excede na fabricação de vinho tinto, vinho do Porto (principalmente).

Mas o que fez a Ramos Pinto se tornar uma referência de qualidade em vinhos? A tradição da família começou com a fundação da Casa Ramos Pinto em 1880, por Adriano Ramos Pinto, através de uma estratégia inovadora e empreendedora para a época, graças à visão de mercado então adotada. Foi no início do século XX que a marca chegou ao Brasil e em pouco tempo se espalhou pela América do Sul. Paralelo a isso, a marca foi conquistando cada vez mais apreciadores de vinhos em Portugal e toda a Europa.

Sempre prezando pela qualidade, uma das características da Ramos Pinto foi investir na modernização de todo o processo, desde a fase de seleção, lotagem até o envelhecimento. Para melhor contar essa história de sucesso que já atravessou oito gerações, fomos conversar com o enólogo João Nicolau de Almeida, que entrou na empresa em 1976 e juntamente com José Ramos Pinto Rosas criou o projeto de seleção das cinco castas na região do Douro, o que resultou em excelentes Vinhos do Porto e de Mesa. Foi nas Quintas do Bom Retiro e dos Bons Ares que ergueram um dos mais modernos centros de vinificação da região. O reconhecimento veio tanto da aceitação do público quanto na forma de prêmios e reconhecimentos, como aconteceu em 1990, quando foi eleito melhor vinho de mesa, e em 1992, quando a Inglaterra o elegeu o melhor vinho ibérico.

Com 35 anos de vivência na área, um extraordinário conhecimento e profundas contribuições para a viticultura portuguesa e mundial, João Nicolau de Almeida chegou a ser considerado um dos enólogos mais influentes do mundo, tendo sido eleito “Man of The Year 1998” pela revista especializada “Wine & Spirits“. Segundo João Nicolau “é uma alegria quando se percebe em cheiro e sabor que se conseguiu engarrafar o que a natureza lhe deu. E quando o vinho é bem reconhecido. É uma alegria ter conseguido dar personalidade ao vinho, uma constância ao longo dos anos, é ter o reconhecimento do público“. “É preciso aprender com os erros. Gosto dos desafios“.

Questionado sobre o futuro do vinho brasileiro, e em particular se ele conhecia o vinho do Vale do São Francisco (nos Estados da Bahia e Pernambuco), João Nicolau diz não ter muita experiência com vinho brasileiro. “Para se ter um grande vinho, tem que haver horas, haver uma técnica de maturação. Pode-se fazer vinhos bons com a maturação rápida, especialmente para vinhos do dia-a-dia. Ou um espumante, por exemplo. Em outros lugares do mundo, consegue-se duas safras e meia em média por ano”.

Tanta dedicação e apuro no cultivo das uvas e fabricação dos vinhos levaram João Nicolau a ser eleito Presidente da ADVID (Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense), Director da AEVP (Associação das Empresas de Vinho do Porto) e Copeiro Mor da Confraria do Vinho do Porto, além da função de administrador-delegado da Casa Ramos Pinto desde Março de 2001, e diretor de enologia. E uma das suas ações em prol da qualidade desse vinho foi ter conseguido a autorização para irrigação nessa sub-região, o que o trouxe para a viticultura do Douro Superior. “Foi autorizada com uma grande resistência, mas as pessoas viam as irrigações como uma forma de produzir mais. Não de qualidade. Então, através de estudos, chegamos à evolução da maturação. Antes os elementos qualitativos não passavam pelas uvas. Como não havia água, as videiras não amadureciam bem, e ficavam secas. Com a pressão condutora da água, pode-se manter a dose certa de água, melhorando a qualidade da cepa. Hoje você olha e percebe a diferença qualitativa da uva. E por consequência do vinho”.

 

Em 2010, o Douro Duas Quintas Reserva 2007, foi eleito o melhor vinho tinto da Europa, conquistando a Grande Medalha de Ouro. “Foi na Alemanha que tem uma credibilidade para vinhos. É sempre um marco ter um reconhecimento dessa qualidade”. Outros vinhos como o Ramos Pinto e alguns Reserva Especial, por demonstrarem longevidade entre os vinhos produzidos pela viticultura do Douro e  o Duas Quintas Reservas têm demonstrado  um grande potencial de envelhecimento, questionamos João Nicolau sobre como saber com que tempo, vinhos como esses devem ser consumidos. Ele nos respondeu: “Há alguns anos atrás, antes de entrar na moda, bebia-se vinhos já envelhecidos. Com as novas tecnologias pode-se beber vinhos velhos-novos com qualidade de envelhecido. Em algumas regiões  os vinhos envelhecem bem (80 castas). O Vinho do Porto envelhece espetacularmente bem. O vinho que envelhece bem é um vinho delicado, que desce bem. Até já existem concursos para  vinhos novos. O Quinta já participou.”

Ainda sobre o Vale do São Francisco, perguntamos sobre as técnicas de irrigação e dos dois e meio a três ciclos vegetativos por ano, se essas características podem interferir na qualidade dos vinhos produzidos na região. “Podem gerar um tipo de vinho diferente. Só depende do tipo de vinho que se quer. Se for bem feito, depende da tecnologia, pode resultar num vinho de qualidade. Mas não chegará a um Vinho do Porto. É importante observar onde estamos e aproveitar dessas diferenças de região para um vinho mais adequado”.
Como alguns países têm um tipo de uva que os distingue, como por exemplo, a Malbec, na Argentina; a Carmenère no Chile e a Tempranilho na Espanha seria a Touringa Nacional a uva típica de Portugal? Segundo João Nicolau, sim. “É uma casta portuguesa com mais de 80 anos. Portugal é um dos países mais ricos de variedades. Uma intensidade muito boa. Há um jogo enorme a se fazer dentre as variedades, tem que trabalhar bem. Eu diria que Touringa Nacional é a menos preguiçosa. Suas folhas captam a energia do sol na fotossíntese e demora mais tempo aberta, sendo assim, destaca-se ao longo do processo.”
Um fator importante na produção de vinho atualmente, é que muitas vinícolas estão substituindo a tradicional rolha de cortiça por produtos similares de material sintético. Para João Nicolau, perde-se o charme. E ainda segundo ele “houve uma acomodação das empresas de cortiça, que terminaram sendo ultrapassadas pelas rolhas sintéticas. Isso na conservação do vinho novo não faz diferença. Agora se for um vinho para envelhecer, já não é tão adequado. Sou mais naturalista nesse aspecto. A rolha sintética não é ideal para envelhecer um vinho. A indústria precisa evoluir. Ela tem capacidade de melhorar nesse aspecto.”

Mas segundo João Nicolau, nem sempre o problema de engarrafamento é da rolha. Muitas vezes a forma de colocação da rolha é o problema. Por exemplo, se ela encaixar na diagonal, ou se as garras que seguram e introduzem a rolha na garrafa deixar alguma marca ou pressão, termina influenciando no engarrafamento.

Será que um vinho “quanto mais velho melhor?” Ainda sobre envelhecimento de vinho, questionamos sobre que tipo de vinho pode envelhecer. E João Nicolau nos respondeu que essa pergunta, eles também fazem. “Tem que ter em geral cor, que representa a intensidade do fruto, o tanino* que seca e não deixa passar o sabor do vinho. Tem que ter taninos que futuramente deixem passar o sabor. Taninos suaves. Até por que depois, não tem milagres.”
*Tanino – corresponde a um grupo de compostos fenólicos que têm como principal característica a afinidade em se ligar a cadeias de proteínas e precipitá-las. Nas uvas, os taninos encontram-se principalmente nas cascas, sementes e engaços. Assim como os açúcares da uva, eles também passam por um amadurecimento e, conforme atingem esta maturidade, perdem agressividade, tornando-se macios e sedosos.

Texto: André Porto
Consultoria: Anezio Lau
Fotos: Ramos Pinto, Divulgação
Agradecimento: João Nicolau de Almeida (Ramos Pinto)
Site oficial: www.ramospinto.pt