É sempre um prazer ter Eriberto Leão conosco. Capa da nossa 2ª edição impressa em 2012, e outras duas digitais, ele está de volta e num momento bem especial de sua vida e carreira. Na plenitude de seus recém completados 50 anos, subindo aos palcos com uma nova peça e deixando mais personagens marcantes na TV, como os recentes Leônidas (Além da Ilusão) e Diogo (Ilha de Ferro). Eriberto com a cabeça nas estrelas e os pés bem fincados no chão, nos inspira e nos faz ver a importância de viver o hoje em sua plenitude.
Eriberto, você acredita em vida extraterrestre? Existem mais planetas no universo do que grãos de areia em toda a terra. Acho que isso responde à pergunta. Eu pergunto novamente: qual a probabilidade de não existir vida extraterrestre com uma quantidade dessas de planetas?
E pegando o gancho nessa pergunta… Como é viver um astronauta no teatro? Como surgiu a ideia do projeto? Viver o astronauta no teatro é uma grande realização. Quem não quis viajar pelo espaço sideral? E o ator tem essa possibilidade de viver várias vidas, experienciar várias existências. E, agora, eu estou experienciando um astronauta que parte da Terra em busca de um sinal extraterrestre nas luas de Saturno. Então, é uma sensação absolutamente boa. O projeto surgiu do diretor José Luiz Jr., do autor Eduardo Nunes e da produtora Carla Yared. Eles me chamaram e, claro, eu me apaixonei de imediato. Sou um grande fã de ficção científica, um grande fã de Isaac Asimov, de Arthur C. Clark – não só dos livros de ficção científica como dos filmes, talvez os principais. Talvez os filmes mais importantes da minha vida tenham sido os de ficção científica, de 2001 a Interestelar, Contato Imediato de Terceiro Grau, Matrix, Avatar – todos ficção científica. Sou apaixonado por ficção científica.
A peça traz referências de filmes clássicos do cinema como você citou acima, 2001 – Uma Odisseia no Espaço, Duna, Interestelar e tantos outros. Algo em especial que lhe marcou? Sempre me fascinou esse universo, desde menino. Meu pai gostava muito de ficção científica. Eu tive um professor de ciências no Dante Alighieri, em São Paulo, e líamos livros do Arthur C. Clark, do Asimov, pra discutir vários temas relacionados às matérias que ele ministrava. Eu me lembro que o primeiro livro de ficção científica que li foi Encontro com Rama, e depois Eu, robô. Encontro com Rama é do Arthur C. Clark e Eu, robô do Isaac Asimov.
O que mais te fascina nessa jornada do homem pelo espaço? Teria coragem de participar de uma experiência dessas? Sempre me fascinou essa possibilidade da gente enxergar além, além do nosso próprio umbigo. Eu gosto muito do mundo microscópico e do mundo macroscópico. Isso realmente me interessa muito. Então, desde os átomos até o mundo biológico ao reino dos fungos, ao reino dos vegetais, animais e ao reino mineral – tudo isso me interessa muito. A biologia me interessa muito, a física me interessa muito. Eu penso que isso tem tudo a ver com a minha profissão. Eu sou um intérprete, e acredito numa frase que tem na peça “… nós não estamos em evolução, somos a própria evolução”. Essa evolução começa na explosão do Big Bang e continua até hoje. É compreender o micro e o macro, a biologia, a física, tudo faz parte da compreensão humana. E a filosofia e a arte conseguem direcionar essa ciência de uma forma poética para uma compreensão importantíssima para humanidade, para nossa sociedade.
Eu penso ser esse o papel do artista – contribuir para a evolução da nossa civilização. Além de ser entretenimento também, que você tenha momentos também de relaxar. O entretenimento com conhecimento é para mim imbatível. É onde você consegue fazer as pessoas relaxarem, saírem um pouco do dia dia de compromissos, de burocracia e de luta da vida material para um outro momento, de uma abertura de percepção prazerosa. No O Astronauta, a gente trata de vários temas importantíssimos, mas de uma maneira extremamente divertida e prazerosa. Eu acho que é a união desses fatores é a minha busca, sempre. Conseguir levar a mensagem de uma maneira muito lúdica e agradável. E a gente conseguiu isso com O Astronauta, graças a Deus. O que mais me fascina nessa jornada do homem é a possibilidade, como eu disse na pergunta anterior, de enxergar além, de ir além e descobrir novas fronteiras e novas galáxias, novas possibilidades. Eu teria coragem de participar de uma experiência dessa – tanto teria que estou participando (risos). Um ator no palco vivendo isso quase como se fosse realidade, porque o mergulho interno é igual ao mergulho externo. O Astronauta é um psiconauta, ele é um astronauta da própria mente. Então, eu já estou realizando essa viagem espacial no palco, e tenho certeza de que as pessoas que estão lá assistindo, saem de lá como se elas também tivessem feito essa viagem espacial comigo.
Você anda com a cabeça no espaço ultimamente mas com os pés bem seguros na Terra com muitos projetos em andamento. Tais como escrevendo uma série e preparando a volta da peça Jim. Anda na fase workaholic? Eu sou geminiano. Mercúrio é o planeta que rege meu signo, e cuja figura mitológica é simbolizada por um homem que tem um capacete com asas, tem asas nos pés também e um saquinho de dinheiro no cinto. Isso representa a dualidade geminiano, que ao meu ver é muito positiva, se bem direcionada. É onde vamos para o céus mas estamos com os pés no chão. Então, são as asas e a matéria. As asas representando o céu, e a Terra é representada por esse cinto com um saco de dinheiro. Eu estou sempre nesses dois lugares, fazendo uma conexão entre eles. Eu penso que é essa também a função do artista – fazer essa conexão, ser um mensageiro. Não por acaso Gêmeos é o signo da comunicação. Então eu não consigo parar, estou sempre criando, gosto muito disso. Estamos escrevendo uma série chamada Tomé, que é sobre um padre detetive que tem uma habilidade que todos nós podemos ter mas que ninguém utiliza – só vou revelar mais à frente -, ela faz com que ele possa resolver casos que nenhum outro detetive conseguiu resolver.
Falando em Jim soubemos que a ideia é trazer a história de Jim Morrison para os dias atuais com ele aos 50 anos. Como está o trabalho de pesquisa e criação para isso? O que o público pode esperar dessa nova temporada? A volta do Jim seria uma comemoração especial dos 10 anos da peça que foi o meu grande sucesso no teatro, e ele (Jim) voltaria aos 50 anos. Estou planejando fazer isso no ano que vem, mas depois de O Astronauta ter viajado o Brasil inteiro. Nós já vamos fazer uma temporada em Curitiba, vamos para São Paulo depois, e pretendo passar pelo país todo. Também tem um podcast meu, num veículo muito interessante, que está me apoiando. Eu vou guardar onde vai ser, mas esse podcast vai tratar de todas essas questões que eu trato em O Astronauta, que eu tratei no Jim – questões que eu acho interessantíssimas e tenho certeza de que todo mundo vai achar. Vamos falar do Big Bang aos fungos fantásticos. Trabalhos de pesquisa já estão em mim. Como eu tenho 50 anos, a maneira como Jim Morrison pensaria hoje, acho que seria muito parecida com a que eu penso. Acho que ele lançaria um podcast, como eu vou lançar (risos), falaria das mesmas questões que vou falar, dos mesmos assuntos. Acho que temos uma personalidade muito parecida. A diferença é que ele se foi muito cedo. Então, não pode viver a maturidade cronológica, biológica, que faz toda diferença. Então, quero aproveitar para emprestar a minha maturidade cronológica e biológica a essa figura mítica que, se tivesse 50 anos, teria muito mais ideias do que eu estou tendo, mas penso que posso contribuir juntando meu trabalho de ator e meu trabalho de cidadão e de ser humano. Penso que essa é a conjunção ideal – onde um ator empresta todo o seu conhecimento, soma esse conhecimento ao do gigante que se foi aos 27. Ele não pode viver até os 50. Eu creio que tenho muita coisa para contribuir também para a obra dele. E o que o público pode esperar dessa temporada? Quem assistiu Jim sabe o que acontece quando a gente se conecta, pode esperar um grande espetáculo como é O Astronauta, pelo qual eu também estou muito satisfeito. As pessoas têm saído extremamente tocadas, extremamente modificadas, e esse é o papel da arte. É isso que o Morrison aos 50 anos vai fazer.
Sua relação à música, continua sempre atrelada ao trabalho de ator. Fora a peça sobre Jim Morrison, você canta música de David Bowie na peça O Astronauta. São ídolos seus na música? Como te tocam? A minha relação com a música continua sempre atrelada à de ator sim. São ídolos meus sim, claro, Jim Morrison, David Bowie. E tantos outros, como Raul Seixas – todo mundo sabe, tenho meu show do Raul que, vira e mexe, estou tocando pelo país. Eles são meus ídolos e me alimentam diariamente com suas mensagens e com a possibilidade de abertura da minha percepção para uma visão mais plena do que quando a gente fica só com notícias e informações de redes sociais, mais egocêntricas. Então, é assim que a gente viaja pelo espaço da nossa própria mente e se liberta de determinados grilhões que podem nos aprisionar a uma limitação de percepção e consciência. Aí é “ao infinito e além” mesmo – que não é do Toy Story. Todo mundo acha que é de lá, mas surgiu antes (a expressão).
Você completou 50 anos mais ativo do que nunca. De onde vem isso? Como o número 50 te tocou? Eu completei 50 anos mais ativo do que nunca, sim. Isso vem dessa minha busca incessante e dessa minha paixão, a paixão que tenho por meu trabalho, por meu ofício, a paixão que tenho pela arte. Como diz Ferreira Gullar a arte existe porque a vida não basta, então a vida não bastaria para mim sem arte, sem eu estar produzindo, criando. Pode até ser que mais pra frente eu dê uma pausa, mas vou plantar, conhecendo as árvores, o reino dos fungos, o reino mineral, os tipos de pedras e cristais (risos). Mas parado, parado, talvez eu não consiga mesmo. O número 50 me tocou porque ele é muito bonito – 50 é meio século. Meio século de muitas realizações. Eu me sinto muito realizado aos 50 anos de idade, me tocou de uma maneira muito plena com um sentimento de realização gigantesco.
Como lida com o tempo? O tempo é relativo. Eu busco sempre estar no agora, com meus filhos, para aproveitar cada momento deles. Eu tenho um filho de 5 e um de 11. O tempo passa muito rápido, daqui a pouco eles já vão estar adultos. O tempo, como diz Gilberto Gil na música Tempo Rei, “ensinai-me pai o que eu ainda não sei”. Eu vejo o tempo como uma divindade que nos ensina a cada segundo.
Voltando um pouco no tempo… recentemente, você encerrou um belíssimo trabalho onde interpretou o aspirante a médico psicanalista Leônidas em Além da Ilusão. Pra nós, assistir, foi um prazer. Como foi para você? Foi belíssimo mesmo – foi uma das novelas mais lindas que já fiz, um dos personagens mais lindos. Foi um grande prazer assistir, e fico muito feliz aqui com o elogio na pergunta. Foi um prazer assistir como foi um prazer fazer. Fico muito feliz – muito obrigado. Por isso que foi prazeroso para quem assistiu, porque que foi prazeroso para todos nós que fizemos. Foi uma obra prima e um daqueles personagens eternos – vão ficar para sempre. Fiz 50 anos durante a novela. Então, imagina meu sentimento de estar comemorando 50 anos fazendo o Leônidas de Além da Ilusão – uma novela e um personagem tão marcantes.
Qual a influência do psiquiatra suíço Carl Jung no Leônidas e para você? Esse universo já fazia parte de você ou veio com o personagem? Influência do Jung foi total. Primeiro, que era uma característica do próprio personagem – tanto que ele tem um encontro com Nise da Silveira, no final da novela. Sempre fui ligado no Jung – a minha avó era uma estudiosa de Jung. E como meus pais nasceram no mesmo dia, mesmo mês e mesmo ano, ela sempre me ensinou sobre a sincronicidade, me mostrou o que a sincronicidade é uma lei que rege o universo. Talvez eu tenha a missão de tocar nesses temas, não à toa eu atraí Leônidas para mim. Porque não existe acaso. Talvez seja sinônimo de sincronicidade, a diferença é a maneira como você aborda uma questão. Você está aqui por acaso? Eu estou aqui por acaso? Seus pais se conheceram por acaso? Seus avós? Pra você estar aqui, foram uma série de acasos ou uma série de coincidências significativas. Eu não chamo isso de acaso, chamo de coincidências significativas. Nós estamos vivos e fazemos o que fazemos porque uma série de coincidências significativas aconteceram, e não acasos. Se algum cético quiser discordar desse nome, pode discordar – ele vai continuar sendo o que é, a lei que rege o universo. Eu não tenho dúvida nenhuma, eu sou Jungiano de coração e alma.
Ainda falando em trabalho, atualmente, você está na 2a temporada da série Ilha de Ferro interpretando o mal caráter Diogo. Como foi participar dessa série cheia de adrenalina e uma boa dose de responsabilidade sócio- governamental em relação ao petróleo brasileiro? A série Ilha de Ferro trouxe um personagem completamente diferente de todos que eu fiz na televisão. Havia feito no cinema e no teatro personagens assim, mas, na televisão, é o primeiro que faço como um predador. Se bem que teve o Ernesto também, de Êta Mundo Bom, que também foi um belo vilão. Então, é isso, é o segundo vilão que eu faço na televisão. Fiz no cinema, e também no teatro, ao lado de Ana Beatriz Nogueira Fala Baixo Senão Eu Grito, em 2008. Essa série é incrível, com muita adrenalina, e como eu faço um vilão, não tive nenhuma responsabilidade em relação ao petróleo brasileiro – pelo contrário. O Diogo quer vender a petrolífera para os chineses – então, ele não tem ética nenhuma, é um personagem amoral.
O que te instiga mais na hora de pegar um novo personagem? O que te move? O que me instiga mais é o desafio, e o que ele vai me trazer também de aprendizado, de expansão de consciência, de expansão de percepção. Eu quero sempre estar vivendo grandes personagens. O que me move é isso, a possibilidade de ele ser um grande personagem.
Nossa primeira capa foi na edição impressa #02 em maio de 2012 (depois tivemos capas web em 2013 e 2018). Dez anos se passaram. O que continua igual e o que mudou em Eriberto nesse período? É verdade! Que homenagem legal vai ser essa, que momento simbólico. O que mudou? Muita coisa. Dez anos é muito tempo, uma década. Estou mais maduro, eu diria isso. Mais maduro e mais tranquilo. E querendo aproveitar cada vez mais o agora, as coisas simples da vida, as pequenas alegrias, que são para mim as grandes alegrias. Coisas mais simples, os sorrisos dos meus filhos, suas descobertas, o amor incondicional, viver ao lado da minha esposa, com meus cachorros.
Chegou a hora de relaxar, o que faz sua cabeça? Brincar com meus filhos, ler, escutar música, tocar o meu violão e a minha guitarra.
E para conquistar Eriberto, basta… Bom papo. Ter uma boa conversa, ter assuntos interessantes. E amor no coração.
Muito obrigado, também desejo mais sucesso pra vocês, e agradeço o carinho. Desculpa estar mandando em cima da hora, estou numa correria gigantesca, espero que dê tudo certo. Qualquer coisa eu estou aqui. Um beijo. É um prazer estar com vocês e aguardo ansiosamente a nossa capa na revista.
Fotos Guto Costo
Styling Samantha Szczerb
Agradecimentos Portinho RJ, Eduardo Guinle, Edu Bogosian, Doct Jeans, Skipper, Index Jeans