por Camila Klein
Dionisio Neto (@dionisionetoator) tem cinquenta anos. Nasceu em uma casa colonial na Rua do Passeio, centro de São Luís, em frente a um cinema, filho de um político e uma miss. Com ascendência libanesa e brasileira, seus agentes americanos o chamam de multiétnico, de beleza ambígua, mestiça. Ator de filmes icônicos como Carandiru, novelas do horário nobre da Rede Globo como A Favorita e A Dona do Pedaço, séries da Netflix e Canal+ como Crime Time: Hora de Perigo e peças históricas como Vereda da Salvação, por Antunes Filho, Ham-let, por José Celso Martinez Corrêa, As Três Irmãs por Bia Lessa, além das suas autorais, que viraram teses universitárias internacionais como Perpétua e Desconhecidos, e as que dirigiu como A Casa de Bernarda Alba, de .F. G. Lorca para sua Companhia Satélite do Amor, que desde 1995 se apresenta em teatros Brasil e do mundo. Ele também é um poeta ultrarromântico, escritor, diretor, produtor, vocalista de banda de rock (Krepax), professor de teatro e dramaturgia – um artista neorrenascentista.
Desde seu nome de batismo – o deus grego do teatro, festas, alegria, orgias, loucura. Atuou com grandes nomes da dramaturgia brasileira como Fernanda Montenegro e americana como Willem Dafoe. Formado pelo CPT (Centro de Pesquisas Teatrais), Dionisio é considerado pelos grandes, um grande. Atualmente ele estreará o longa Morte, Vida e Sorte, de Alexandre Setembro e o curta DNA, de Sarah Martins. Ele também atua na série O Rei da TV da Star+. Está em vias de lançar seu primeiro romance Perla Stuart – a ex-mulher, a coletânea de peças Opus Profundum (Ed. Benfazeja), e viaja com os espetáculos Desamor, de Walcyr Carrasco – especialmente escrita para ele, e Carta ao Pai, de Franz Kafka. Dionisio está sempre em ebulição. Neste ensaio inédito para a MENSCH, realizado no Cabelaria (@cabelaria), ele interpreta várias personas do seu imaginário – o pop star, o punk, o cowboy, o amante latino, o milionário, o empresário.
Você filmou durante a pandemia os independentes Morte, vida e sorte, de Alexandre Setembro e DNA, de Sarah Martins e a série O Rei da TV da Star+. Como foi esta experiência?
Eu tenho um carinho muito grande por estes dois filmes independentes. O importante é a longevidade, trabalhar sempre em boas produções, fazendo bons papéis e me comunicando e emocionando meu público. É o que me é mais caro e é minha missão aqui na Terra – emocionar. Na pandemia minha profissão praticamente paralisou. Se apenas 5% dos atores têm emprego, nesta época era menos ainda. Eu então aproveitei o período caseiro para finalmente terminar meu primeiro romance – Perla Stuart – a ex-mulher e aprender francês, italiano e alemão. Tive a sorte de filmar com o Alexandre e com a Sarah, dois diretores estreantes – ele fez alguns curtas nos Estados Unidos e este é seu primeiro longa e ela fez seu primeiro curta. Em Morte, vida e Sorte faço meu primeiro papel de rico no cinema, o empresário Luís. Eu sempre quis fazer um papel assim, fiquei dormindo na mansão em Alphaville onde filmamos. Precisava me sentir dono daquela casa enorme. O laboratório imprime na tela. É importantíssimo para que eu viva e não represente. Em uma apresentação pública recente para o cinema lotado, o filme explodiu na tela. O público ficou eletrizado como há tempos não via. Em DNA faço o papel de um homem pobre envolvido em agiotagem. Deixei minhas unhas sujas, sem maquiagem, eu precisava me afundar em mim para viver o Renê. Os dois personagens são fortes, trágicos, do jeito que eu gosto. Desejo que voem alto, e longe. Eu também atuei em um capítulo da série O rei da tv na Star+. Faço um delegado de polícia, busquei o que há de doce nele, para não cair em estereótipos. Fiz laboratório intenso também. Na pandemia eu conheci o método Demidov (ex-assistente de Stanislawski), que me libertou para sempre. Sou um ator infinitamente melhor depois de conhecer sua técnica revolucionária. Desde A dona do Pedaço eu utilizo seu método. Sou um homem e um ator mais livre.
Finalmente você terminou seu romance Perla Stuart – a ex-mulher. Quem é ela?
Eu perdi a conta de quanto tempo levei para escrever este livro. Acredito que dez. Eu tentei escrever dois livros na minha juventude, mas acabei perdendo os dois. O teatro, a minha vida de ator sempre me tomou muito tempo, mesmo eu tendo cursado Letras na USP. Eu acabava escrevendo nas horas vagas. Escrevi dezoito peças até hoje, quinze publicadas. Na pandemia isso inverteu. Eu fui ator nas horas vagas e nas outras escritor. É um excelente ofício para a minha maturidade e futuramente para a minha velhice. Tenho ideias para muitos romances. Com o Taekwondo (eu sou faixa ponta preta), eu pratico minha disciplina como nunca. Ainda não consigo escrever seis páginas por dia todos os dias como Stephen King recomenda, mas escrevo toda semana. Um dia chegarei lá. Também escrevi o livro infantil Miguel e Helena, sobre um menino que não gosta de brincadeiras de menino que se apaixona por uma menina que não gosta de brincadeiras de menina. Estou muito animado em voltar à Literatura. Muitos atores são romancistas. São artes que andam de mãos dadas. O Antunes dizia que o ator é um poeta. É sobre criar mundos, vidas e pessoas. É sobre a humanidade. Eu também lançarei pela Editora Benfazeja o livro Opus Profundum – peças reunidas volume dois. E preparo o terceiro volume e um novo romance – Perla Stuart – o ex-marido, sobre o vilão da história, o aristocrata falido Domênico. Perla Stuart é uma mulher dionisíaca, hipersexuada. Ela é apaixonante. Homens e mulheres irão se apaixonar por ela. E a vida dela não cabe em apenas um romance. Não vejo a hora dela chegar até o leitor. E que ele a devore com tanta paixão com quanto eu escrevi.
“Um dos maiores atores de sua geração.”, como disse Walcyr Carrasco, “o mais fofo de todos”, como lhe disse Walter Salles, “grande como Nelson Rodrigues e Plínio Marcos”, como disse Antunes Filho, elogiado por artistas, críticos e amado pelo público, Dionisio Neto e suas múltiplas faces está em êxtase na metrópole, pronto para viver os mais variados papéis. Do rico ao pobre, do bom ao mau, suas máscaras não têm fim. Recentemente foi lançado na Alemanha um livro sobre sua obra que diz que ele é tudo, menos invisível. Ele é um vulcão. Deleite-se! Evoé!
Fotos Nelson Aguilar (@neomachina)
Figurinos Nicole Nativa (@nicoleninaimagem) e Renato Cardoso (@revoltxcardoso)
Edição de fotos Estefani Fontes (@estefanifontes)
Agenciamento Adriana Costa (@dricosta.art)