Independente do personagem que caia nas mãos de Armando Babaioff, uma coisa é certa, iremos nos divertir e admirar o trabalho dele. Com seu atual personagem, o vilão Diogo da novela “Bom Sucesso”, não tem sido diferente. Segundo o próprio Babaioff, Diogo é um dos seus personagens mais ricos e bem construídos de sua carreira. “Quis investir na curiosidade do público em querer saber como o personagem vai se portar na cena, no jogo de cena”, comenta ele. Prestes a encerrar mais esse trabalho na TV e ganhar o mundo com sua peça “Tom na Fazenda”, Babaioff conversou com a MENSCH e leva mais uma capa por merecimento ao seu talento e seu olhar aguçado sobre o comportamento humano através de seus personagens marcantes.
Babaioff, se divertindo muito com esse vilão Diogo? Que desafios tem te trazido? Construir esse personagem sempre foi complexo, mas justamente por isso é uma diversão, desde o início. O Diogo é um dos personagens mais ricos que tive a oportunidade de criar, pois ele é dono de um humor muito específico e de um caráter extremamente duvidoso, fora o gosto musical que vai de Iza a Robertinho do Recife. O maior desafio que esse personagem me propõe, apesar de ser um personagem que aparentemente pode fazer tudo, é saber o limite, é sempre estar dialogando com a cena, sempre estar atento até onde posso ir como ator. Eu vou testando as possibilidades dia após dia, construindo e observando como o comportamento do personagem reverbera e assim vou compondo, criando, mas sempre tendo o texto como meu aliado, o personagem é muito bem construído pelos autores (Rosane Svartman e Paulo Halm), assim como toda a estrutura da novela e tenho também o privilégio de ter diretores que estão sempre atentos a essa construção, não só me dando limites, mas me ajudando a construir.
Depois do bonzinho Ionan em “Segundo Sol”, o malzinho do Diogo. Vilão é mais gostoso de fazer? Os dois personagens são bastante distintos, mas dentro de um processo criativo é sempre muito prazeroso criar, é a parte que eu mais gosto e eu adoro contribuir. Uma vez sabendo quem são os personagens e entendendo qual a estrutura da cena, basta deixar os sentidos abertos e a criação vem, era um prazer criar para o Ionan e tem sido um prazer criar para o Diogo. Cada um, dentro da sua lógica, é um universo de possibilidades, mas posso dizer que o Diogo é capaz de fazer mais coisas que o Ionan, e aí o céu é o limite.
O Diogo é lobo em pele de cordeiro. Que nuances de vilania você procurou passar para o personagem para não ser um vilão óbvio e manter a cara de “bom moço”? Na verdade eu não procurei vilania no Diogo, isso já está no texto, no figurino sempre de preto, nos comentários e atitudes. Já está ali. Eu não precisava alimentar mais esse lado. Eu resolvi apostar na contramão para justamente surpreender. Eu não ia alimentar o que já era óbvio, vou criar em cima do que não é esperado e aí nesse lugar eu consigo criar vários Diogos. O Diogo que está com a Nana é completamente diferente do Diogo que está com a Gisele que não é o mesmo Diogo quando está sozinho. Por isso a complexidade no processo criativo. A cara de bom moço eu sempre tive, a maioria dos personagens que fiz na televisão foram bons moços. Boa parte das pessoas que acompanham o meu trabalho tem esse registro na cabeça, principalmente depois do Ionan, então eu não precisava investir tanto neste lugar. Fui na contramão. Eu quis subverter essa lógica, quis que as pessoas ao invés de sentirem apenas ódio e repulsa tivessem interesse e prazer em acompanhar um trabalho de construção. Quis investir na curiosidade do público em querer saber como o personagem vai se portar na cena, no jogo de cena. O Diogo é imprevisível.
E como vai a dobradinha com Sheron Menezes e Fabíula Nascimento? Eu sou um ariano no meio de uma leonina (Fabíula) e uma Sagitariana (Sheron). A fagulha, a combustão e a chama. São as melhores parceiras que alguém pode ter. Inteligentes, curiosas, incansáveis. O nosso encontro sempre foi positivo, desde o primeiro dia que nos encontramos para a preparação. Sou muito feliz em ter o olhar das duas sobre o meu trabalho o tempo todo. Eu entendi muito do Diogo através da forma como elas enxergavam o personagem, sempre teve muita generosidade.
Para você como é a construção de um personagem? Qual processo você usa? Não tenho método, cada personagem é um personagem, são exigências distintas. Eu acredito na escuta. “Escuta” é um termo que usamos para dizer que o que importa é tudo o que acontece em volta no instante do jogo. Tudo é material para construir um personagem.
Esse ano no cinema você participou de “Homem Livre”. Como foi esse trabalho? “Homem Livre” é um filme onde tive a oportunidade de criar desde o início, pela primeira vez tive a oportunidade de apresentar ao diretor uma concepção minha, de um personagem estudado, pensado. Eu fazia anotações em papel e colava no camarim para não me perder, também por conta do curto tempo que tínhamos. Então, decupei o personagem inteiro. Apresentei isso para o diretor e ele “comprou” a ideia.
Já são 13 anos de carreira. Consegue destacar alguns bons momentos? Não, não são 13. Eu faço televisão há 13 anos, mas sou ator desde os 11 de idade. Tenho 38 anos, então pelas contas são 27 anos da minha vida dedicados a este ofício. Todos os momentos foram bons, tudo o que vivi me trouxe até aqui e contribuiu e contribui para a minha formação como ator. Mas os melhores momentos sempre são as conquistas, como quando passei no vestibular para estudar na Escola Técnica Estadual Martins Penna. Era algo que eu desejava muito e foi um dos lugares mais importantes que encontrei para exercitar o meu ofício, para aprender.
O que ainda falta para você como ator? Onde você quer se arriscar mais? Que ambiente ainda não é tão lugar comum? Carreira, me falta idade para muitos personagens ainda. Quero experimentar muita coisa nessa profissão, que apesar de extremamente injusta nesse país, é uma das mais lindas do mundo. Somos contadores de histórias, somos os cronistas do nosso tempo. A minha profissão é aliada do conhecimento, mesmo quando precisamos interpretar um personagem ignorante. O conhecimento de uma vida inteira agrega valor para um personagem. Eu tenho vontade de fazer tudo o que eu ainda não fiz, mas de uma coisa eu tenho certeza, farei teatro para o resto da minha vida.
Já usou seu lado ator numa situação da vida real? Se sim, como e qual? Eu não sou só ator quando subo num palco, eu sou ator todos os dias da minha vida, mas isso não significa que eu esteja interpretando 24 horas por dia. O ser humano é o meu material de trabalho. Falar do ser humano faz parte da minha rotina, então eu tento prestar atenção no comportamento das pessoas o tempo todo. Quase como se fosse uma biblioteca de possibilidades. Tento sempre me colocar no lugar do outro, meu trabalho exige isso, então talvez seja nesse lugar onde “uso” o meu “lado ator”.
Se imagina fazendo outra coisa se não fosse ser ator? Sempre. Todos os dias.
Como você enxerga o público de cinema e teatro hoje em dia? Vou falar de teatro, mas a minha opinião se aplica ao cinema também. Estamos há quase três anos em cartaz com “Tom na Fazenda”. Esse tempo me fez perceber que basta uma boa história para o público embarcar e se deixar levar a ponto de assistir ao nosso trabalho e atribuir a ele novas perspectivas, pontos de vista, ligações e identificação. Essa identificação acontece em diversos lugares. Você não precisa se identificar com o que é retratado na peça, mas como a peça fala de humanidade é quase impossível sair do espetáculo sem se deixar ser atravessado pelos dilemas universais que são mostrados no palco.
Temos a responsabilidade em dialogar com o contemporâneo, com o que acontece à nossa volta. Esse lugar encontra reverberação no público, é preciso identificação, não é à toa que Bacurau por exemplo é o fenômeno que é. Quando fala de todos nós encontramos potência. A peça fala de todos nós. A isto se deve o sucesso e a longevidade do espetáculo. Quando uma peça que originalmente foi criada para o Canadá e serve exatamente para a nossa realidade no Brasil. Não podemos e não devemos subestimar o público. Achar que o público quer assistir a um único tipo de teatro, a um único tipo de cinema. Precisamos sim de políticas públicas que incentivem a produção nacional, que fomentem teatros e cinemas e que entendam definitivamente que geramos emprego e movimentamos a economia. Sem isso, vamos continuar brigando com filmes de super herói nos cinemas. E a briga é desigual.
E o que curte para relaxar? O que te distrai depois de uma maratona de cenas gravadas? Estando com tempo livre eu gosto de viajar, de preferência para o meio do mato. Durante a semana, no meio do trabalho eu gosto de ler. Uma atividade física que me ajuda bastante a distrair é a corrida.
Qual seu pecado preferido? Por que? A Gula. Porque gosto de comer. Tenho prazer em comer bem.
Depois desse trabalho em “Bom Sucesso” quais os planos para próximo ano? Teatro, teatro e teatro. Começo o ano já com uma nova temporada de “Tom na Fazenda” no Rio de Janeiro, no Teatro PetroGold e na sequência viajamos para Montreal onde ficaremos em cartaz com o espetáculo no Usine C no mês de março. No segundo semestre vamos levar a peça para o Festival de Avignon na França, sendo um dos poucos representantes brasileiros num dos maiores festivais de teatro do mundo.