Mesmo tendo um vilão nas mãos o ator Gabriel Godoy tinha o desafio de conquistar o público com um vilão divertido e romântico. Esse era o desafio de Gabriel no início de “Haja Coração” e que soube fazer com maestria. A trajetória do seu Leozinho chega na reta final com a popularidade em alta e Gabriel com a sensação de missão cumprida. O grande público perdeu um jornalista esportivo mas ganhou um ator sensível, responsável com sua função de ator e muito talentoso. Das campanhas publicitárias para o teatro e depois a TV. Desafio após desafio, Gabriel segue trilhando um caminho de sucessos e que guarda ainda muitas surpresas. Como esse belo ensaio cheio de atitude e classe (e um pouco de romantismo).
Gabriel, encerrando mais um trabalho, e dessa vez com mais sucesso ainda. Que avaliação você faz? Leozinho vai deixar saudades? Fazer uma avaliação sobre um trabalho é algo muito difícil, então eu prefiro fazer uma reflexão sobre o que foi essa jornada com essa personagem. Saio me sentindo muito mais maduro – tanto como homem, tanto quanto artista – porque eu ainda estou aprendendo muito sobre como fazer TV. Eu tenho mais experiência no cinema, em séries e no teatro, que é muito diferente de fazer novela. Desde a velocidade do trabalho, passando pela popularidade que uma emissora desse porte traz e que mexe muito com o nosso interior. Então, posso dizer que saio muito feliz por ter feito essa personagem tão rica! Porque é muito difícil fazer comédia nesse lugar mais “over acting”, mas me ajudou bastante estar cercado de grandes artistas. Tive momentos difíceis nessa adaptação, mas nunca desisti. Usei essa dor como combustível pra tentar melhorar. E isso é uma vantagem que a televisão tem, porque você pode no dia seguinte melhorar e ir nesse crescente… Então sempre busquei usar tudo que a TV podia me dar a favor para que eu pudesse crescer.
Mesmo sendo um pouco vilão, digamos assim, não tinha como não gostar do Leozinho. A que você atribui isso? Aprendeu algo com ele? Tornar o Leozinho uma personagem querida pelo público foi um trabalho sutil, sempre bem amparado pela direção do Fred Mayrink e pelo texto do Daniel Ortiz. Porque é difícil fazer uma personagem com frases formadas por um vocabulário pesado, como “vou matar” e “vou derrubar aquela inútil”, por exemplo. Como tornar isso leve e engraçado?! É bem complexo, né?! Foi um trabalho com o Fred trazer a sutileza pra personagem e deixar o carisma do Gabriel à frente, também. Então, sempre que podia, fiz algo um pouco “loser”, a fim de trazer essa leveza, essa coisa meio atrapalhada. E quando havia alguma cena com mais romantismo ou drama, era a hora de conquistar o público, porque era a hora da verdade, né?! Sempre que se consegue humanizar, facilita o processo do público “comprar”. Essa parceria que o Leozinho tinha com a Fedora era algo bem louco, né?! O cara queria aplicar um golpe, e até mesmo matar a vítima… Logo, como ele vai ser querido? Essa pergunta eu me fiz desde o começo. Às vezes eu percebia que ele era bem odiado, mas depois rolava uma dúvida tipo “Ah, mas ele gosta dela de verdade”. Então eu tive várias nuances na personagem, e acredito que isso o deixou ainda mais rico.
Você é um ator que se formou no teatro e essa é praticamente sua 2ª novela de destaque (antes veio Afeganistão em “Alto Astral”). E aí cada vez mais está envolvido com TV? Pra você é um desafio muito diferente de teatro? São áreas muito diferentes. Eu me considero um profissional que ainda está aprendendo muito com a televisão. Por muitos anos eu fiz publicidade pra TV e isso me ajudou a ter uma experiência com set de filmagem, onde existem muitas pessoas trabalhando. É muito diferente do ritual de concentração do teatro ou mesmo do cinema, onde o processo é mais artesanal. A adaptação a um novo território sempre requer um tempo, um estudo e atenção para ir aprendendo. Foi bom ter feito um personagem mais coadjuvante antes, como o Afeganistão em “Alto Astral”, para que pudesse ir entendendo essa estrutura e, agora, poder pegar outro um pouco maior. Eu sou muito grato a essa trajetória um tanto inesperada que estou tendo, porque dá tempo de ir entendendo as coisas – tanto a parte técnica, quanto essa parte de ser uma pessoa pública. Esse, aliás, é um outro desafio que temos que equalizar internamente, psicologicamente, para sempre deixar os pés no chão e não se deslumbrar. Considero uma sorte entrar na TV após os 30 anos. Acho que isso ajuda bastante nesse processo de autoconhecimento.
No início da sua trajetória você pensou em ser jornalista e terminou nos palcos. Como foi essa mudança? Quando despertou que queria ser ator? Como eu estudei na escola alemã Waldorf Rudolf Steinert eu tive contato com a arte desde pequeno. Lá tive aula de argila, crochê, desenho com carvão, aquarela, macramê, marcenaria, jardinagem, música, coral, teatro… Essa escola trabalhava muito com o lúdico. Quando fiz teatro na escola, me apaixonei. Só que eu mesmo tinha um receio com isso de “ser ator”. Pensava “Ah, eu vou ser ator?! Imagina!”. A única certeza é que eu gostava de me comunicar e queria fazer algo de comunicação. Então fui fazer Jornalismo, que é outra coisa da qual eu gosto bastante. Mas durante aquele um ano e meio de estudos eu percebi que não aguentava ficar parado numa sala de aula com tanta teoria. E, ao mesmo tempo, eu estava fazendo um curso de teatro amador na Oficina dos Menestréis, com o Deto Montenegro (irmão do Oswaldo Montenegro) e o Candé Brandão. E era um curso muito legal, ficávamos em cartaz, era uma moçada boa. E eu pensava “Como eu gosto de palco! Como eu gosto disso!”. Nessa época ainda trabalhava num escritório de marketing, então fazia essas três coisas em paralelo. Pensei muito e resolvi, então, sair do Jornalismo e ir atrás do meu sonho. Fui para a Oficina de Atores Nilton Travesso e lá tive o privilégio (ou a sorte, não sei como definir isso) de já conseguir trabalho. Entrei no teatro infantil, as coisas foram acontecendo aos poucos e não parei mais. E também nunca fiquei parado porque nunca deixei de ir atrás, sempre insisti e persisti muito.
E o que o jornalismo te despertou que te levaria a seguir a carreira? Como você vê o jornalismo hoje? O que me levou ao jornalismo foi a paixão que eu tenho por esportes e, sobretudo, pelo futebol. Naquele momento eu me via muito como jornalista esportivo, e ainda tenho essa vontade de fazer as duas coisas – de seguir como ator e ter um programa nesses moldes. Até pretendo seguir com o Canal dos Fominhas, um projeto sobre futebol, gastronomia e humor que criei com mais três amigos – Marcos Dadi, Fabiano Tatu e o Vinícius de Oliveira (o ator que protagonizou o filme “Central do Brasil”). Só ainda não sei em qual plataforma, se internet, TV ou rádio. Hoje, com as redes sociais, sinto que somos bombardeados por muita informação, e isso é muito delicado. O lado bom é que podemos entrar em debate e provocar reflexões de uma forma mais ampla. Ao mesmo tempo é difícil, porque as pessoas não te leem sempre da maneira como você escreveu. Existe também uma mídia muito sensacionalista que eu não considero bacana pra sociedade, com tanta notícia de violência. Precisamos mesclar a informação factual com mais cultura, música, viagens… Acredito que estejamos numa transição, onde temos que tomar muito cuidado com o que falamos e com o que escrevemos. O que é uma pena, porque acabamos perdendo um pouco a espontaneidade. Existe quase uma censura, o que é um absurdo em 2016.
Você acha que o poder da internet e redes sociais meio que banalizaram o jornalismo (de modo geral)? Como você vê essa revolução na comunicação de hoje? A chegada das redes sociais fez com que as pessoas fizessem uma leitura mais rápida e já emitissem opinião, o que pode ser complicado quando não se aprofunda no tema. E isso acaba indo para a leitura de modo geral. Antes dessa tendência, eu mesmo lia quatro, cinco livros por ano. Agora tenho lido uns dois ao ano, o que considero uma média muito baixa. A gente se vicia no formato das mídias sociais e acaba se contentando com uma informação muito superficial. Acho muito delicado ver as pessoas preocupadas em mostrar um lado seu que não existe. Já ouvi de um amigo uma frase que resume bem isso: “Meu sonho é ser o que pareço ser no Instagram”. Esse é o modo como as pessoas estão se colocando no mundo. Observando pelo viés das críticas da novela em espaços como o Twitter, existe uma legião de pessoas “corajosas”, que falam tudo o que querem, porque estão protegidas dentro das suas casas, e às vezes pelo anonimato, também. Isso é diferente de uma crítica autoral, assumida, mais embasada e menos pessoal. Então acho esse movimento bem delicado…
Você acha que sua função como ator é só entreter ou vai além disso? Jamais pensei que a minha função fosse só entreter. A partir do momento em que me torno uma pessoa pública, acredito que eu tenho uma responsabilidade social, também. Esses dias, inclusive, eu pensava sobre qual causa eu quero abraçar, com qual tema quero me aprofundar. Hoje vemos muitos artistas se envolvendo com a defesa do meio ambiente. Vi um documentário super forte do Leonardo di Caprio falando sobre o efeito estufa. Então já que estamos vivendo essa coisa de ter seguidores virtuais, sempre que faço uma postagem busco provocar alguma coisa e ir além do “estou feliz, sou alegre, etc”. Tento propor uma reflexão, seja lá qual for, porque acredito que temos uma responsabilidade, sim, e devemos estar atentos a isso. Ser artista vai muito além de entreter.
O humor faz parte do seu jeito? A comédia tem um espaço grande no seu DNA como ator? O humor faz parte de gerações da minha família! Meu pai e meu avô paternos são muito engraçados, assim como alguns tios nos dois lados da família. Então acho que isso fez parte da minha criação e eu sempre gostei, sempre levei a vida muito leve. Acho que com humor você consegue fazer uma crítica bem interessante. Essa capacidade dos comediantes de provocar é muito boa. E é muito difícil fazer humor, é preciso sempre trabalhar para não perder isso. É sempre um jogo entre texto e direção para que o ator não fique cristalizado, duro. Eu sou um apaixonado por comédia, levo minha vida com muita alegria e leveza. Acho que a comédia pode transformar positivamente as coisas, além de provocar e alegrar as pessoas.
Voltando ao Leozinho… Ele terminou virando um “galã” e toda mulher agora quer ser sua “Fedora”. O assédio aumentou? Como tem lidado com isso? Eu estou sabendo agora que o Leozinho terminou como galã (risos)! Estou me divertindo muito com esse momento. Por estar fazendo comédia, o assédio é mais divertido, alegre. Agora quando estou no ar com “O Negócio”, a série que faço na HBO, o assédio é mais sexual. Então percebo que o assédio vem de acordo com o personagem que faço no momento. Mas tudo bem, eu acho isso engraçado e bem gostoso.
O que uma mulher precisa ter e ser para chamar sua atenção? Não existe uma regra, mas um dia quero encontrar alguém que me faça bem e me traga tranquilidade e paz, além de alegrias e boas risadas. Mas tem que ter assunto, porque isso é importante! Li um texto do Rubem Alves que falava sobre isso, que quando você se interessar afetivamente por alguém, deve se perguntar “Eu terei assunto com essa pessoa?”. Porque a atração pelo físico é algo passageiro, e na velhice o que fica é o seu parceiro. Esse costuma ser um bom parâmetro quando conheço alguém. Porque é muito comum a gente buscar sempre o par ideal, mas é preciso aprender a trabalhar com o real. Ouvi isso na terapia, e entendi que temos que lidar com o concreto, com quem está na nossa frente. Isso, por si só, já é um grande desafio.
Aliás a química entre você e Tatá Werneck foi explosiva não é? Dá pra explicar isso? Química não se explica, ela acontece. Eu e a Tatá conseguimos nos entender muito bem porque desde a preparação tivemos muito respeito e cuidado um com o outro, algo como “Com licença, posso entrar na sua vida?!”. Isso foi fundamental. Depois foi rolando a afinidade, como temos com amigos e pessoas do dia a dia com as quais nos identificamos. Tivemos o humor, que divertia a ambos, assim como a admiração, que é algo que sempre ajuda muito. Então, mesmo quando a gente brigava, a química aparecia. Acho isso muito bom, né?!
Seu personagem vivia todo alinhado e era bem vaidoso. Você também é? Como lida com vaidade e espelho? Eu me considero um “falso vaidoso”. Eu tenho alguma vaidade, mas não a exponho muito. Não sou um cara que anda super arrumado, com o cabelo sempre ajeitado… Mas sou atento, gosto de um bom perfume, reparo se meu cabelo está bom, me preocupo com a boa e velha barriguinha da cerveja, observo se ela está aparecendo… Acho que possuo uma vaidade normal, gosto de me sentir bem e estar bem.
Qual sua maior vaidade como ator e sua maior vaidade como homem? Minha vaidade como ator é que eu gosto de me assistir, seja na novela, no comercial, na série, no filme, enfim, no que eu estiver fazendo. E quando eu vejo uma cena que eu não gosto, eu sofro! Mas não sofro para ver, como alguns artistas que nunca se assistem. Eu gosto de ver minhas cenas! Acho que tenho essa vaidade. E como homem eu gosto de estar perfumado, gosto dessa vaidade com o cheiro.
Com o fim desse trabalho pretende relaxar como? Eu preciso muito ficar em silêncio, porque novela gera muita informação. Vou voltar pra minha casa, em SP, e me recolher um pouco, estar com a família e meus amigos mais próximos. Depois vou viajar pra Disney, que eu ainda não conheço, e volto a Nova Iorque com amigos. E como o ano já está terminando, vou começar a preparar meu ano de 2017, que espero que seja um ano muito bom pra mim.
Depois do furacão Leozinho quais os próximos passos? O que vem por aí? Agora que eu me despeço do Leozinho e volto a gravar “O Negócio”, da HBO, onde faremos a quarta temporada dessa série pela qual eu tenho um carinho imenso. Em se tratando de séries do Brasil, considero isso um privilégio… É algo muito rico pro audiovisual esse crescimento das séries no mercado. Além de ser um ambiente onde me sinto muito em casa. Devo gravar essa temporada até Abril, aproximadamente, e pretendo estar bem focado nisso até lá.
Fotografo Thiago Dias
Styling/ Produção de Moda Wesley Madson
Make-up/ Hair Vivian Genari
Assistente produção Sil Alves
Modelo Iannelly Machado
Motorista Sérgio (JC Leal transportes)
Agradecimentos: Daniel Diones (garçom), Madrepérola Restaurante (Douglas), Marques e Souza (gerente)