Quando Rainer Cadete estreia um novo personagem, seja na TV ou nos palcos, já pensamos em uma nova capa. Não é à toa que essa é a sexta capa dele conosco. Um recordista! Mas motivos não faltam. São tantos personagens legais, histórias para contar e planos compartilhados conosco que sempre fica um gostinho de quero mais. Depois do sucesso de seu personagem Luigi em Terra e Paixão, Rainer nos conquista com seu personagem Renato nos palcos com a peça “Norman” (em cartaz em SP até 05/05 e depois segue outras paradas). E mais uma vez o papo fluiu fácil, falando de carreira, desafios, desapegos, nudez, paternidade e masculinidade. E garantimos que ainda sobrou papo para outras capas. Até porque Rainer não para e adora um novo desafio.
Rainer conta pra nós… o Luigi te deu muito trabalho? Por que aquele ali aprontou todas! Durante cerca de um ano, meu cotidiano consistia em jornadas de segunda a sábado, totalizando 11 horas de trabalho diárias, além de duas horas em deslocamento. Complementando isso, ainda dedicava tempo aos estudos, aulas de canto e sessões de academia. Essa rotina intensa quase não me deixava tempo para dormir. No entanto, a experiência trouxe muitas alegrias e foi extremamente gratificante. Tenho um carinho especial por Luigi, esse trambiqueiro divertido que me conectou mais profundamente com minhas raízes italianas, permitindo-me reviver e aprofundar minha ligação com a cultura da minha infância na Itália.
Como você desapega de um personagem, ainda mais quando ele é muito querido do público? É algo simples ou leva um tempo? Ah, desapegar é difícil, né? A vida é sobre isso, sobre o desapego; nada é nosso, tudo é emprestado. Sinto muita falta deles, como se fossem amigos queridos. Mas, para mim, personagem é como amor: você só “esquece” um quando encontra outro. (risos)
Você chega a sonhar sendo o personagem? Ou mesmo reagir como o personagem? Sim, isso é bem recorrente. Eu tenho sonhos muito realistas em que sou o personagem e, às vezes, sonho que estou ali interpretando-o. Então, aparece outro personagem e eu tenho que pedir licença para ele ir embora porque já estou fazendo outro.
Uma grande característica sua é trazer uma humanidade aos personagens. Belos exemplos disso temos o Téo, de A Dona do Pedaço, o Visky de Verdade Secretas e agora o Luigi de Terra e Paixão. Como você constrói isso? Com muito estudo, aulas e mais aulas, caracterização, figurino, referências… Amo mergulhar no universo do personagem o mais fundo possível. É lindo o exercício de ver o mundo por outras óticas. Meu ofício me convida a fazer isso cada vez que me proponho a contar uma história. Eu procuro criar uma relação íntima. Mas acima de tudo, eu me apaixono pelos personagens. Reflito sobre o que o leva a ter determinado comportamento. A partir daí, percebo que tenho muitas coisas em comum, e outras eu pesquiso e construo pensando em cada detalhe, qual o tom da voz, repertório de movimentos daquele corpo, etc… É uma sensação única.
Recentemente grande parte do público ficou surpreso com a foto ao lado do seu filho que é um rapaz. Você foi pai muito jovem (aos 20) e quando o tempo passa as diferenças de idade parecem menores. Como é isso para você? Eu fui pai aos 19 anos. Toda vez que posto alguma coisa com o Pietro, sempre há uma grande surpresa. Ele está crescendo e se tornando um homem incrível. Conversamos abertamente sobre tudo. Acredito muito na força da presença, do diálogo e do afeto. É lindo ver o desabrochar de uma pessoa que eu amo tanto, sabe? Aprendo a ser pai com ele. Nossa troca é muito especial.
Como é Rainer pai? Tão pai quanto amigo ou tão amigo quanto pai? Eu dedico meu tempo, meus pensamentos, minha energia e minhas orações. Ser pai me faz querer ser um homem melhor. Então, busco isso. Afeto, amizade e amor andam de mãos dadas. A amizade entre nós se desenvolve como consequência, à medida que vivenciamos momentos juntos e compartilhamos nossas experiências de vida, sabendo que podemos contar um com o outro. Mas eu sou o pai; tenho essa consciência. A presença paterna na vida dos filhos deveria ser normalizada, não apenas no papel de provedor, mas também como companhia e cuidador.
Nas redes sociais você sempre surpreende o público com fotos pelado. Se considera um naturista ou é só curtição? Como lida com a nudez? Acredito que nosso corpo é um templo sagrado. Reflito sobre como frequentemente o objetificamos, percebo que é apenas um corpo — no meu caso, um corpo de 36 anos, com algumas cicatrizes e bastante pelo, que gera muito engajamento nas redes sociais. Então, eu posto. (risos) Prezo pelo auto respeito, amor próprio e respeito pelo próximo.
Da TV para os palcos, como está sendo a temporada de Norma ao lado de Nívea Maria? Pelo que vimos lotando teatros. Muito legal, Norma tem sido uma grande surpresa. Assisti a esse espetáculo há 22 anos, um texto muito importante, e agora, depois de todo esse tempo, quando a Norma bateu na minha porta, eu não pude deixar de abrir. E não apenas pelo texto, mas pela direção de Guilherme Piva e por estar em cena com Nívea Maria, uma atriz que admiro profundamente. Então, quando o Edgard, que além de um grande amigo, é um produtor responsável e sério, me ofereceu esse projeto, não consegui recusar. Estou vivendo uma das experiências mais interessantes nas artes cênicas da minha vida, fazendo esse texto, que é um sucesso. As sessões estão esgotando, e as pessoas vêm falar comigo completamente emocionadas depois, contam suas histórias e compartilham como a peça os atravessou e transformou. É muito gratificante.
Para quem ainda não viu a peça, conta um pouco da história e por quais cidades vocês irão com a turnê? Então, nosso próximo destino é o Rio, e depois planejamos retornar para uma nova temporada em São Paulo, onde a peça tem sido extremamente bem recebida. Estamos nos preparando para iniciar uma turnê, algo que pessoalmente adoro. É uma ótima oportunidade para levar nossa peça a diversas cidades, explorar novos lugares e voltar a cidades que já conheço. O Brasil é lindo!
E “esse negócio de ser macho” hoje em dia. Como funciona? Tem dado muito trabalho, heim? Como os homens podem se livrar dos rótulos de “ser macho”? A noção tradicional de “ser macho” hoje em dia é exaustiva e ultrapassada. Precisamos revisitar e questionar a masculinidade para contribuir para a evolução social. A verdade é que existem várias formas de masculinidade, cada uma performada de maneira diferente. Precisamos confrontar o modelo tradicional de um homem que apenas provê, mas não participa ativamente dos cuidados com a família ou reconhece a igualdade de todos, independentemente de gênero. A masculinidade em nosso país está em crise, e é urgente que busquemos referências mais saudáveis e inclusivas. Estou consternado com o fato de estupradores condenados saindo impunes, outros tratando suas parceiras com violência. Isso não é masculinidade, mas crime. É fundamental repensarmos o comportamento masculino para uma sociedade mais justa e equitativa.
Quem é Rainer hoje em dia e para onde ele caminha? Sou um artista inquieto, um homem que procura ser a melhor versão de si mesmo. Rainer é alguém que ama a vida e está em constante busca por autoconhecimento. Eu me enxergo como um eterno aprendiz, alguém que busca encarar as coisas da melhor forma possível. Vivo o momento presente. Quero seguir em frente com novas e intensas experiências artísticas. Seja nas artes cênicas, na música ou onde a vida me levar.
Fotos @priscilanicheli_ph
Styling @samantha_szczerb
Beleza @zuhribeirobeauty_
Locacao @casavista.joatinga
Agradecimentos @rafferoficial, @crismartinsstylist, @amilconfeccoes, @ott.oficial