ENTREVISTA: GUTHIERRY SOTERO MOSTRANDO A QUE VEIO

Muita gente está vendo Guthierry Sotero, pela primeira vez agora na TV com seu personagem Vini na novela “Vai Na Fé”, mas esse carioca/angolano de 21 anos já tem uma bela caminhada com trabalhos na TV e na música, e em batalhas de poesias. Em 2019 se descobriu ator no teatro e daí em diante tomou gosto pela profissão. “Hoje esse universo é a minha vida, é o que me move todos os dias”, comentou Guthierry ao longo dessa entrevista para a MENSCH. Ao longo do papo encontramos um cara bem família, caseiro e que adora resenhar com seus amigos.

Você começou na cultura hip hop, como? Comecei em 2016 após o boom das “batalhas de sangue” no Brasil, fiquei fascinado em como os MC’s pensavam muito rápido para “atacar e responder uns aos outros”. Nesse ano comecei a escrever as minhas primeiras poesias e musicas, é como uma forma de treinamento para expandir o vocabulário. Eu escrevia umas 30/40 palavras por dia em um caderno. Um dia eu estava passando as estações de radio de forma aleatória e tocou “Favela Vive”, fiquei maluco com a construção de rimas do rapper Froid e aquilo me aproximou ainda mais da cultura! Comecei a ir em varias batalhas, mas sem participar porque sempre fui muito tímido e isso me dava nervosismo para improvisar. Foi quando conheci o Slam, uma espécie de batalha de poesias, e comecei a me apresentar nas rodas culturais do RJ. 

De que maneira se descobriu ator? Na minha primeira batalha de Slam, no Grito Filmes, eu perdi na final. Ali eu vi o quanto a perfomance era fundamental para a modalidade e que se eu quisesse me destacar, o primeiro passo seria me soltar mais nos palcos. Foi quando eu fui para o teatro, em 2019, no início foi para perder a timidez… Até que eu me encantei por esse universo e fiquei completamente apaixonado por essa arte. Hoje esse universo é a minha vida, é o que me move todos os dias. 

O que a carreira de cantor e ator tem em comum? Acredito que a vontade de vencer e melhorar sempre! Todo dia é dia de aprender mais, ver algo que não tinha visto antes e estar nessa busca constante da evolução. Às vezes chegar num lugar de reconhecimento é mais fácil do que o próprio esquecimento, quem não se atualiza a tendência é essa. Então se tem uma coisa que, pra mim, essas carreiras se interligam é nessa busca da evolução, eu quero e preciso estar sempre aprendendo. 

Quais foram seus primeiros trabalhos? A peça com o grupo teatral do Centro de Artes da Maré chamada “Enquanto respirar”, em 2019. Depois fiz participações em “Amor de Mãe”, novela da Rede Globo, gravei 2 temporadas para a série “Tudo Igual… sqn” do Disney Plus, uma temporada já no ar e a outra prevista para estrear no segundo semestre, fiz a peça “Lua da Maré, 10 anos” com o coletivo Entre Lugares e simultaneamente terminei/apresentei a peça do curso “Processo de encenação” com direção da Miwa Yanagizawa, concluí recentemente as gravações de “Veronika”, nova série do Globoplay e atualmente estou em “Vai na fé”, novela da Rede Globo. Antes de ir pro mundo artístico, trabalhei por quase dois anos como estagiário no Ministério Publico, eu queria ser desembargador. Hoje eu não consigo me imaginar nesse universo. 

Qual sua formação? Não sou ator formado ainda. Penso muito em fazer cursos técnicos e workshops para aprimorar mais em métodos de atuação. Nessa profissão você precisa estar sempre se atualizando. E eu também sempre gostei de estudar, então junto o útil ao agradável! 

Fale sobre Vini, seu personagem em “Vai na Fé”. O Vini é um cara muito visceral, me encanto com a sensibilidade dele, a forma como ele vê o mundo e apoia todos em suas decisões. Uma empatia sem igual, creio que todo mundo precisa de um “Vini” em suas vidas! Ele é um cara querido pela galera, acredito que é pela identificação que ele causa nas pessoas. Um cara do bem, articulado, que sabe os seus direitos, fala de forma aberta e direta sobre a autoestima de pessoas pretas, líder do movimento negro na universidade e alem de tudo isso, talvez o que mais me chame a atenção é a sua doçura.

Como se preparou para o papel? Tive pouco tempo de preparação, o intervalo entre o dia que recebi a noticia até entrar no set foram duas semanas e, paralelo a isso, eu estava gravando “Veronika” com um personagem dos anos 2000, totalmente diferente do Vini. Esse até hoje foi o meu personagem mais difícil por esses fatores externos. Fiz o meu estudo de campo como costumo fazer, crio um universo para esse personagem, decupo suas nuances e também gosto muito de montar uma playlist pro personagem, isso me ajuda muito a ficar no mundo dele antes de entrar no set, por exemplo. O que mais ouvi foi o Rico Dalasam, a arte dele foi fundamental pra essa vivência do Vini, desfrutei muito de DDGA (Álbum) e Fim das tentativas (EP). Troquei com alguns amigos que cursam comunicação e o Vini se parece muito comigo também! Sinto que a cada dia eu tenho uma nova descoberta com esse cara e isso me alimenta demais.

Como tem sido a receptividade do público com seu personagem? Tá sendo um deleite colher os frutos de um trabalho que eu queria muito fazer. A recepção das pessoas tem sido a melhor possível! Sempre recebo muitas mensagens de identificação, pessoas felizes em se sentirem representadas, sabe?! De conseguir ver o seu corpo numa novela em rede nacional falando de amor, sendo suscetível ao erro, arrependimento, afeto e todos os sentimentos que temos na vida real! Recentemente foi ao ar a cena em que Vini e Yuri dão um selinho, essa cena se expandiu de uma forma que eu não imaginava e recebi muitos elogios em relação a atuação e algo que me pegou muito foi a forma que foi comemorado pelas pessoas, elas realmente estavam ansiosas para ver dois homens negros demonstrando afeto um com o outro, sendo empáticos e sendo felizes naquele momento! Esse acolhimento é o que me faz acreditar na profissão, a representatividade está sendo preenchida em todas as camadas pelo Vini e isso me deixa muito feliz. 

Em “Veronika”, nova série do Globoplay, você é um dos protagonistas, como surgiu essa oportunidade? Surgiu no início do ano após uma sequência de testes presenciais e selftapes para a série. Foi um personagem que eu fiquei encantado pela sinopse que recebi e disse desde o início pra mim mesmo que seria meu, pois tinha chances de eu ser outro personagem na trama! Estava sedento para dar vida a esse cara e graças a Deus deu tudo certo.

Conta um pouco sobre seu personagem Rodriguinho… O Rodriguinho de cara é um moleque muito explosivo, vai de 0 a 100 em poucos segundos. Ele é apaixonado pela Veronika e tem um bom relacionamento com ela e com o seu irmão, o Vinicius, seu melhor amigo. Ele pratica muito bullying e desconta todas as coisas no Gordo, seu amigo, e juntos eles são um quarteto inseparável. Ele é um cara engraçado, carismático e somente a Veronika conhece o seu lado mais frágil, amoroso, carinho, etc… Para os outros como uma forma de blindagem ele tá sempre de prontidão, é um cara viril e que não leve desaforo pra casa de jeito nenhum! Por não saber o que ser no futuro e outras diversas circunstâncias, acaba se envolvendo no caminho errado.

Acha que a representatividade de negros melhorou no audiovisual? Em comparação às gerações anteriores, sem dúvida, mas ainda não é o ideal! Não faz sentido em um país em que mais de 55% da população se considere preta, ainda sermos uma minoria significativa nesse espaço. Hoje temos mais negros na frente das câmeras, mas ainda disputo papel com os meus amigos, não costumamos ter um “banquete” de personagens pretos na mesma trama… Vai na fé e Veronika infelizmente ainda são exceções. E saindo da ala dos atores, precisamos também de mais diretores negros, assistentes de direção, produtores de elenco, na fotografia, no som, no foco, na base e em todos os lugares possíveis!

De que maneira a presença negra no audiovisual pode ganhar mais espaço? Com oportunidades! Me usando como exemplo pra chegar em “Vai na fé”, eu já tinha sido aprovado em outros 3 trabalhos na casa, ou seja, a oportunidade veio e por um acaso do destino me foi tirada. Temos milhares de pessoas capacitadas para ocupar qualquer cargo no mercado e digo isso com tranquilidade! Pessoas que só precisam de uma oportunidade para mostrar o seu trabalho e se manter da sua arte. 

Acha que o streaming abriu mais oportunidades para atores e diretores negros? Sim, quanto mais lugar tiver, melhor! O streaming veio para ampliar as possibilidades e equalizar os trabalhos. Antes tínhamos o pensamento de que audiovisual se resumia apenas às telenovelas e agora temos opções de séries, filmes, documentários, etc… O mercado fica a todo vapor gerando oportunidades para todos nós! 

Tem algum ritual de beleza? Costumo passar alguns produtos no rosto antes de dormir, digamos que eu tenha uma rotina de skin care. Nunca fui de usar esses produtos, mas fui numa dermato depois de aparecer umas acnes no meu rosto e ela me receitou. Agora passo todos os dias quando acordo, durmo e durante o dia tô sempre com um protetor solar na bolsa!

E como cuida do corpo? Estou me alimentando melhor agora, não tenho restrição em alimentos, mas tento me alimentar da forma mais saudável possível e treino 5/6 dias na semana, isso me ajuda a manter um corpo ativo e atlético. Comecei a treinar para crescer um pouco e perder o rosto de “criança”, talvez não tenha adiantado muito (risos), mas tô feliz com o resultado.

Fotos Lukas Alencar

Beleza Luan Milhoranse

Stylist Victor Mazzei

Filmaker Luís Carlos Lobo