
Ícone de beleza nacional, mulher forte e consciente do seu papel como celebridade e cidadã. Luiza Brunet dispensa mais apresentações. Ao longo de décadas ela esteve presente e atuante em diversas frentes, fosse como modelo, atriz, defensora dos direitos femininos ou como a majestosa rainha de bateria das escola de samba Beija-Flor, sua estreia foi em 1981, passando por Portela e posteriormente da Imperatriz Leopoldinense. Luiza é nossa rainha de todos os carnavais. Dos bailes do Copa nos ano 1990 até os diversos desfiles na Sapucaí, ao todo foram mais de 40 anos cruzando o sambódromo. Nos últimos anos, ela tem se dedicado com empenho contra a violência às mulheres.
Luiza, primeiramente é um prazer finalmente tê-la aqui na MENSCH. E para começar essa entrevista, gostaríamos de lhe provocar perguntando quem foi, é e será Luiza Brunet daqui a uns anos? Eu fui uma menina livre que nasci na roça de um pai lavrador e de uma mãe dona de casa. Infância permeada por correr livre pelos campos de café e assistir violência extrema. A Luíza menina, amadureceu rápido e se tornou uma mulher forte e consciente e da qual me orgulho muito.



Ícone de beleza nacional por muitos anos, em algum momento já se sentiu aprisionada neste rótulo? Isso já lhe impediu de algo? A verdade é que, nos anos 80, a mulher era classificada com objeto. Porém, não havia uma coincidência global sobre violação contra mulher e menina. Esses eram procedimentos naturalizados a exemplos de mulheres que eram mortas e o crime era caracterizado como legítima defesa da honra e assim não eram criminalizados. Hoje, já há um processo ou procedimento que reconhece esse crime. Porém, fazer parte dessa mudança, é um crescimento pessoal. Mesmo sem entender isso na época, já me posicionava e agia exigindo meus direitos.
Você é de uma época em que as modelos eram consideradas bonitas da forma natural que eram. Sem intervenções. Os critérios eram outros para a beleza. Como você enxerga isso hoje em dia? A beleza natural era valorizada e nós mulheres gostávamos disso. Na globalização, houve um movimento corporal que as mulheres começaram a mudar – do implante de silicone às intervenções no corpo. De lá pra cá, só foi crescendo até nos tornarmos o país que mais faz procedimentos estéticos e que, infelizmente, tem levado algumas mulheres a óbito. Hoje, há um exagero nos procedimentos, mas há também mulheres mais conscientes que preservam suas características. A busca da beleza perfeita é almejada por todos e, muitas vezes, esquecem que o conjunto da beleza é para sermos independentes, seguras e atuantes. Ai está a verdadeira beleza da mulher.


Hoje em dia, se fala muito da objetificação do corpo feminino. Você já foi capa de inúmeras revistas, explorando sua sensualidade e corpo. Em algum momento se sentiu assim? Tinha noção disso ou era/é algo natural para uma modelo? Quando fui modelo, comecei com o corpo exuberante à mostra e a sensualidade exposta. Dos 17 até os 26 anos. Quando me tornei mãe, decidi então valorizar meu corpo de outras formas – me tornei empresária, atriz, mãe e ativista. E sempre estive disponível para várias campanhas na área da desigualdade e saúde da mulher, levando mensagem sobre o empoderamento e autonomia financeira. Quebrando paradigmas.
Para o grande público, você surgiu com as campanhas publicitárias da Dijon. Daí em diante, você não parou mais e ganhou o mundo. Ao longo dessa trajetória que situações lhe marcaram mais? E quais descartaria hoje em dia? Aos 19 anos, fui a primeira modelo brasileira a ter um contrato de exclusividade com uma marca e da qual as campanhas se tornaram um ícone. Minha carreira de modelo foi pensada e direcionada. Sempre entendi que devemos usar nossa voz e corpo como ferramenta política. Tive uma carreira bem sucedida – autônoma, eu mesma cuidei dela. E até hoje faço as minhas escolhas, muito bem pensadas. Valeu a pena pelo aprendizado. Não descartaria nada, pois soube conduzir.
A cobrança em cima do corpo feminino é muito mais forte hoje do que anos atrás, principalmente para ícones de beleza como você e tantas outras modelos e atrizes. Como isso já chegou até você e como lida com isso? Infelizmente, as redes sociais trouxeram essa nova mídia. Falsa e irreal. Então, há artifícios que deixam muita pessoas frustradas e como se todos fossem lindos e bem sucedidos que se tornam muito pesados e irreais. Mulheres são revitimizadas, agredidas virtualmente e que acabam caindo em propostas terríveis. Me deparo com essas situações o tempo todo, já que trabalho com isso agora. Ver essas mulheres fragilizadas pelo corpo ou assédio, é terrível.



Um processo natural na sua carreira como sex symbol foi chegar ao posto de Rainha de Bateria. Você foi a rainha que ficou mais tempo à frente da bateria da escola. Você representou a Portela entre 1986 e 1994. O que lhe fez ficar por tantos anos nesse posto? O carnaval é um caso à parte. Fui menina que morou no subúrbio berço da Portela. Quando me tornei modelo, fui convidada para ser madrinha da bateria. Algo difícil de descrever – uma emoção gigante. Acredito que 30 anos de vida requer amor, comprometimento, viver essa realidade, pois tudo que envolve o carnaval são pessoas apaixonadas pelo carnaval. Vivi isso. Vi como funciona. Então, sempre valorizei. Jamais exigi além. Sei a importância para cada componente da comunidade e seu carnavalesco. Minhas fantasias eram a réplica do desenho que recebia. Respeitar é ato de amor.
Com tantos anos de Sapucaí, que momento especial você guarda na memória até hoje? A última vez em que desfilei, foi emocionante. Decidi dar lugar a outras mulheres. Mas, o convite da Portela me fez voltar à avenida com o discurso sobre feminicídio com um vermelho na mão, clamei por justiça para as mulheres. Alí é um lugar de engajamento e foi maravilhoso o retorno lindo que a mídia deu. Foi o maior presente para mim.
Onde está a real beleza? A beleza real, na minha visão, vem de atitudes que devemos ter. Não haverá mudança consistente se não mostrarmos o que queremos – mudança de comportamento, respeito e liberdade. Mas quando uma mulher é bonita na sua estética e tem esse propósito, ela se torna ainda mais bonita e forte. Ela adquire poder.


Onde costuma recarregar suas energias? As minhas energias veem da motivação do que faço hoje. Me doar para as mulheres e à sociedade, a respeito do enfrentamento e das violações. Contra violência sexual infantil, adolescente,feminina. Vivemos em um dos piores países por conta da violência seja LGBTQIA+, racismo, fome, violência doméstica, violência religiosa, direitos reprodutivos, violência política, saúde da mulher, etc.
Qual sua maior vaidade? Minha maior vaidade hoje é dormir bem. Estou sempre em alerta. Atendo mulheres do Brasil e do exterior – as mulheres sofridas imigrantes. Como posso ter vaidade?!
Para encantar Luiza basta… Um sorriso e respeito.
Para finalizar, deixa aqui uma mensagem para os leitores da MENSCH… Muito obrigada pelo convite, para sair na revista. Sei que pode parecer estranho pousar assim um pouco sexy, mas a minha autoestima é boa. Me acho uma mulher maravilhosa em todos os aspectos. Nunca estive tão consciente do que quero. E saio em busca disso. Beijos.


Fotos Guilherme Lima
Produção executiva Samantha Szczerb
Styling Samantha Szczerb e Tina Kugelmas
Beleza Elcides Freitas
Locação Hotel Nacional Rio
Agradecimentos Nayane, Boss, Nk Store