Quando a música toca fundo na alma de quem tem talento musical não tem escapatória. Nasce uma estrela (ou astro) como é o caso da cantora Roberta Campos que no auge dos seus cinco aninhos foi tocada pela música. Daí em diante foram pesquisas, estudos, apresentações… Inspirada em ícones da MPB como Maria Bethânia, Elis Regina, Roberto Carlos e Milton Nascimento, Roberta foi aos poucos moldando seu estilo e refinando seu repertório, que é bem eclético. Ela vai do indie ao jazz, da MPB ao blues e bossa nova. “Sou um pouco de tudo isso sim! Minha música é tudo que escuto e não me prendo no momento da composição, a música vem como ela tem de ser e confesso que acho isso fantástico!”, declarou Roberta ao longo desse bate-papo. Aumenta o som (no fim da matéria você encontra uns vídeos dela). É música da alma para o coração.
Roberta, como a música entrou na sua vida? Como despertou pra ela? Eu tinha uns 5 anos de idade e vi meu tio tocar violão e cantar. Naquele momento me invadiu uma sensação muito forte, muito boa, que me recordo como se fosse hoje. Foi um episódio muito marcante e acredito que ali a minha arte foi despertada. Ele cantava uma canção de Gilson e Joran, “Casinha Branca”, um sucesso de 1978, que tive o prazer de fazer uma releitura no meu disco “Todo Caminho É Sorte” de 2015. Essa música, por muito tempo, foi a minha preferida. Com 11 anos de idade comecei a tocar violão e foi uma das primeiras canções que eu aprendi a tocar.
Quais foram e são suas influências? Esse meu tio, o Zé Pereira, foi uma grande influência pra mim. Ele morava em Belo Horizonte/MG e sempre que ia pra casa de minha Vó, ele deixava algumas coisas lá como vinis, revistas de cifras e fitas K7. Tinha Maria Bethânia, Elis Regina, Roberto Carlos, Milton Nascimento e tinha um disco que eu era apaixonada, “Simplesmente”, de Paulinho Nogueira, um grande violonista que me inspirou muito a tocar violão. Essas foram minhas primeiras influências. Depois, fui conhecendo mais coisas e o rádio me apresentou muito do que passei a gostar: Guilherme Arantes, Djavan, Marisa Monte, Beto Guedes, The Beatles, Kid Abelha – que foi a banda que mais ouvi na minha pré-adolescência – Legião Urbana, dentre outros.
Como morava no interior de Minas Gerais, numa cidade precária chamada Paraopeba; e como eu vim de uma família pobre também, não tinha muito acesso à cultura, à discos, livros, nada. E, naquela época, não existia internet. Então, eu me virava pra conhecer as coisas! Sempre fui muito curiosa e sempre fui muito criativa também. Foi aí que, certa vez, eu comprei uma revista, a antiga Show BIZZ, e nela tinha alguns anúncios de pessoas que trocavam coisas. Recortes de revistas, cópias de fitas K7, coisas assim… e eu saí escrevendo pro pessoal e acabei conseguindo muitas cópias de K7 e também de VHs com shows incríveis. Conheci bastante coisas nessa troca, como Joan Baez, Joni Mitchell, Bob Dylan, Sheryl Crow, Nick Drake, abrindo, assim, meu leque de conhecimento. Com certeza, tudo isso influenciou a minha música.
E como surgiu essa parceria com o espanhol, Diego Ojeda, para ‘Garibaldi’? Em abril de 2020, logo no início da pandemia, eu decidi estudar espanhol. Sempre fui apaixonada pelo idioma e já estava a um tempo querendo abrir esse portal maravilhoso e tão rico que é a América Latina! Eu queria conhecer a cultura, as pessoas e compor na língua. Logo no segundo mês de aula eu fiz uma música, parte em espanhol, parte em português. Me senti segura e com coragem para começar a me conectar com cantores e compositores que falam e compõe em espanhol. Ouvi muita coisa, conheci muitos cantores e bandas. Na medida em que ia conhecendo e gostando, pesquisava mais sobre o artista. Com aqueles que me identifiquei mais, eu fui até o Instagram e mandei mensagens para convidá-los a compor comigo.
Foi numa dessas abordagens que Diego me respondeu, começamos a nos falar e trocamos ideias de composição. Ainda estamos para terminar nossa parceria, mas esse ano ele me convidou para cantar com ele sua linda canção “Garibaldi” e eu aceitei o convite. O resultado ficou formidável: os arranjos com instrumentos típicos do México, a junção das nossas vozes, tudo combinou muito bem e deixou a música ainda mais bela. Antes de gravar com Diego, gravei com um cantor da República Dominicana chamado Sergio Echenique. O Sergio é um amigo que fiz da mesma maneira que relatei acima. Com ele já tenho mais de 10 canções e essa gravação que fizemos é uma composição nossa. Se chama “Me Enredé Con Tu Piel”, saiu em dezembro de 2021. Essa foi a minha primeira música cantada em espanhol.
Cantar em espanhol é algo que te deixa confortável por conta da musicalidade latina? Me sinto muito confortável! A língua é muito sonora, estou cada dia mais familiarizada, em casa. Além disso, me dedico bastante. Estou sempre estudando e vivenciando o idioma. Acredito que é um processo. A cada passo que dei nesse aprendizado, foi me deixando mais íntima com a língua espanhola. De mais a mais, hoje já conheço muitos trabalhos, sei mais sobre a cultura latino-americana, estou sempre assistindo e lendo entrevistas no idioma, lendo livros, ouvindo músicas, assistindo a filmes. Tudo isso ajuda com que eu me sinta inserida no idioma e isso me dá cada dia mais vontade de compor e cantar em espanhol.
Pretende se dedicar mais à música em espanhol e quem sabe carreira por países latinos? Pretendo sim! Tenho mais de 20 músicas prontas e no momento certo, pretendo lançar um disco. Mas, enquanto isso, continuo minhas conexões, que têm me dado uma bagagem muito grande e intensa. Isso é extremamente importante para que eu dê os próximos passos com bastante consistência e conhecimento.
De Diego Ojeda para Humberto Gessinger e Luiz Caldas. Viajar por estilos e cantores diversos é o seu grande barato musical? É engrandecedor! Como dizem, a música é universal, e eu sempre incorporei isso. Eu adoro me juntar, independente do estilo. Eu quero é usar tudo que a música me dá de possibilidade. Ela me permite que eu cresça junto com o outro, que eu vá para caminhos diferentes que originalmente eu iria, porque eu desperdiçaria essa oportunidade imensa?
No meu disco “O Amor Liberta”, que lancei em Julho de 2021, tem 11 músicas minhas, inéditas e autorais, sendo que 4 delas foram criadas em parcerias. Tem “Começa Tudo Outra Vez” que fiz com Humberto Gessinger; “É Natural” com Luiz Caldas; “Chegou o Meu Verão” com De Maria; e “Se A Saudade Apertar” com Hyldon. Quatro estilos diferentes, de gerações diferentes; quatro lindas canções que nasceram com essa liberdade que me dou de me juntar e de criar com o outro. Eu tenho vários outros parceiros, cujas músicas ainda não mostrei. Tenho música com Carlinhos Brown, Zélia Duncan, Danilo Caymmi, Erasmo Carlos, Dadi Carvalho, Fagner, Juliano Holanda e vários outros! Apesar de ainda hoje 95% de minhas composições serem de forma mais solitária, onde assino sozinha, eu adoro quando tenho a oportunidade de me misturar.
Quem são seus grandes ídolos e inspirações na música? Djavan, Marisa Monte, Kid Abelha, Joni Mitchell, Nick Drake, Paulinho Nogueira…na verdade todos que me influenciaram são meus ídolos. Eu sou autodidata, aprendi a tocar violão sozinha, aprendi a cantar sozinha, mas minhas influências me ensinaram muito. Aprendi com eles e sou grata a isso!
O que você curte ouvir? E o que toca na sua playlist? Ainda estou no momento de ouvir muita música em espanhol: Leonel Garcia, Alex Cuba, Alex Ferreira, Natalia Lafourcade… Tenho conhecido uns artistas novos, como Emily Bear, Celeste, Nick Mulvey, Victory, TÂCHES, Eloise; e sempre revisito os cantores que gosto, inclusive cantores brasileiros, como Elis Regina, Tom Jobim, Los Hermanos, o próprio Djavan e Marisa Monte, que sempre estou ouvindo! Eu escuto muita coisa. Ouço música o dia todo.
O que te inspira hoje, a compor e a cantar? Minha inspiração sempre será a vida! Viver inspira! Eu descrevo minha vida nas minhas canções; então, quanto mais viajo, leio, assisto filmes, séries, ando pelas ruas, conheço pessoas e, principalmente, me conheço, mais criatividade eu vou ter, mais inspirada vou ficar e mais músicas vão nascer dessas experiências. Eu amo compor, porque é uma forma de falar comigo, o que me faz muito bem; e amo cantar, porque me faz tão bem quanto. Parece que moro na canção e essa sensação é maravilhosa, indescritível. E o mais incrível é que quando faço bem a mim, posso fazer bem ao outro. Quando a minha música faz bem a mim, ela toca o outro, emociona, atravessa. Essa é a mágica da criação.
Quando procura relaxar e recarregar as baterias, o que procura? Paz! Gosto também de silêncio, da natureza, do mar, ficar comigo, deixar o mundo um pouco do lado de fora! Tocar meu violão me equilibra muito. Não consigo ficar muito tempo parada e adoro a cidade também. Gosto de viajar, de conhecer lugares novos, restaurantes, experimentar comidas, sensações, isso também me relaxa! Preciso do equilíbrio dos dois mundos: o barulhento e o silêncio.
O amor realmente liberta? Liberta. Partindo do momento em que você consegue se amar. O amor de dentro pra fora! Quando a gente se ama, tudo se torna possível, especialmente amar o outro. O amor equilibra tudo na nossa vida e você entende o quanto é importante ter amor em tudo que você faz. Tudo! O amor é o sentimento mais nobre que existe; e ele ensina e liberta. Te mostra todas as ferramentas que você precisa para viver com equilíbrio e paz, com união, com harmonia. O amor é paciente, é conselheiro e é a arma mais poderosa que temos pra viver bem.
E como é viver de música hoje em dia com as redes sociais ditando tendências? Como surfar nessa onda cantando ritmos mais específicos? Acho que em tudo que você faz, sua essência deve estar à frente! Eu sou muito autêntica e não me sinto pressionada, porque eu não me preocupo em seguir tendências ou modismos. A minha música parte de dentro pra fora e não ao contrário. Então, sinceramente, não acuso essa pressão. Assim como não me sinto pressionada também a fazer postagens sobre assuntos do momento. Eu só posto e falo sobre aquilo que acredito, sei e gosto de abordar. Adoro falar sobre música, sobre minhas descobertas, auto conhecimento, me dá prazer! Gosto da troca que tenho com meu público, falar sobre momentos da minha vida, da minha carreira e essa troca é muito positiva porque traz muita reflexão pra mim e pra quem me acompanha. A rede social te dá a possibilidade da identificação, então as pessoas que se identificam comigo e minha música, vão se juntando a mim, pela pessoa que sou, pela escuta e pela música que faço. Acho que essa é a verdadeira tônica necessária na rede social, a verdadeira, a que cria raízes e a que não se abala com as tendências que vêm e vão em velocidade cada vez maior e de forma cada vez mais superficial.
MPB, violão com indie, jazz, bossa nova e blues. Podemos dizer que Roberta é um pouco disso tudo? Sou um pouco de tudo isso sim! Minha música é tudo que escuto e não me prendo no momento da composição, a música vem como ela tem de ser e confesso que acho isso fantástico! Leva o trabalho sempre pra um lugar maior. Nesse disco “O Amor Liberta” eu flerto com o Jazz, com o Folk, com a bossa nova, com o Blues e sabe-se lá o que mais podemos colocar de influências nele! Eu escuto muita coisa e sou curiosa, eu gosto de tirar as músicas, entender os caminhos que levam a pessoa a compor daquela forma e ter aquele resultado, e sei que no inconsciente, as coisas ficam ali e na hora que vem a inspiração, você derrama toda essa mistura indo pro seu caminho! Isso é mágico!
Como se definiria como cantora? O meu canto é único! Aprendi a cantar sozinha, achando um jeito que eu gostava de me ouvir e um jeito de aplicar minhas técnicas, que naquela época em que fui aprendendo, não sabia muito que teria um nome pra isso. Sempre escuto as pessoas dizerem que meu canto é reconhecível de cara! Além de ter criado minha forma de cantar, tenho uma voz peculiar, acho que a junção de tudo faz muita diferença para o resultado final.
Após seis anos você volta à cena musical com todo gás e ótimas parcerias. O que vem por aí que pode nos adiantar? Na verdade, eu sempre estive na cena e ativa! Fiquei seis anos sem lançar um disco, depois de lançado meu disco “Todo Caminho É Sorte”, em 2015, eu tive cinco músicas dele em trilha sonora de novelas, uma indicação ao Grammy Latino e viajei bastante fazendo shows com essa turnê. Nesse tempo, fui compondo! Lancei DVD em comemoração aos meus 10 anos de carreira discográfica e vários singles. Teve música com OLODUM, com Vitor Kley, recebi um lindo convite da banda SKANK para lançar com eles o último single, antes da pausa deles. Fiz show na África, num festival de jazz chamado Kriol Jazz, em Portugal, nas cidades de Lisboa, Coimbra e Porto. Tive a canção “Todo Dia”, música inédita, na trilha sonora da novela “Orfãos da Terra”, sendo minha vigésima canção em trilha sonora de novelas… Fiz muita coisa! E o disco “O Amor Liberta” é o reflexo de todas as coisas que fiz nesses seis anos intensos de trabalho. Agora estou preparando um novo single, pensando num próximo álbum, junto a isso, fazendo muitos shows pelo Brasil, com a turnê de “O amor liberta”, inclusive em Setembro encaro uma maratona de 20 shows. Continuo com meu projeto em espanhol, no momento certo lançarei mais coisas e também tenho novidades vindas de Portugal, que conto muito em breve.
Fotos Lucas Seixas
Quer mais Roberta? Acesse: https://robertacamposoficial.com.br/
E para ouvir Roberta: