“Omã não é como os Emirados Árabes Unidos, de forma alguma. Nosso progresso é vagaroso, mas o que você verá aqui é algo que não se encontra em qualquer outro país do Golfo”, escreve-me a omani Ameera Mahrooqui, uma amiga dos tempos de estudante na Europa. Mascate, a capital, e onde Ameera vive, é um contraste em relação a Dubai, Abu Dhabi, Doha – cidades da Península Arábica, nas quais prédios modernos e altos se multiplicam. Na capital omani, eles não passam de dez andares. Trata-se de um decreto para assegurar que nenhuma estrutura feita pelo homem esconda o cenário montanhoso ao redor de Mascate. O decreto foi emitido pelo sultão Qaboos bin Saud Al Said, que comanda o país desde 1970, após um golpe de Estado que tirou o pai do poder. Omã, até então, tinha aspecto feudal, isolado, e o novo sultão, educado no exterior, propôs – e colocou em prática – a modernização do país. Isso, sem prejudicar a autenticidade e a identidade árabe local.
Visitar o sultanato é também revisitar o passado abundante em história. Omã foi um centro comercial importante devido à localização (atualmente, ele faz fronteira com o Iêmen, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e o Mar Arábico, que separa a Península Arábica da Índia). Assírios e babilônicos estabeleceram-se no país, pois queriam controlar a rota comercial entre a Ásia e o Mediterrâneo. Mais para frente na história, o império português esteve presente e a herança do período, a construção de fortes, pode ser vista nos arredores de Mascate.
A capital é – geralmente – o ponto inicial para explorar esta nação com cerca de 3,3 milhões de habitantes, sendo 600 mil estrangeiros, que constituem uma parte da força de trabalho do sultanato, segundo informações do Ministério do Turismo de Omã. Como previamente descrito, Mascate é mais modesta na comparação com outras capitais do Golfo, mas nem por isso ela deixa de ser vibrante. Logicamente, menos cosmopolita e nada faraônica como Dubai. Mascate é onde se caminha por ruas limpas, jardins e parques impecáveis, e com frequência, onde os encontros com a simpatia e gentileza dos omanis tomam forma. Eles cumprimentam, sorriem. O ritmo pode ser outro, mais lento, menos metrópole, porém mais comunidade.
Cercada por montanhas, Mascate é uma mistura de distritos mais modernos e outros mais antigos. Para quem aprecia gastronomia, os cafés são inúmeros. Assim como os restaurantes de comida local, indiana, iraniana, libanesa, e as fatídicas cadeias internacionais de fast food. Ainda existem praias quietas a serem percorridas, mas a atenção à vestimenta nesses casos é necessária. A ordem é não exagerar ao mostrar o corpo.
Em qualquer programa para conhecer a capital, a Sultan Qaboos Grand Mosque, aberta pela manhã para não muçulmanos, com exceção das sextas-feiras, é a mais importante mesquita no país. Ela pode acomodar até 20 mil fiéis em ambientes cobertos por mármore branco e cinza escuro. Sabe o carpete, aquele que antes de pisar em cima, você deve tirar os calçados e deixá-los do lado de fora? Pois é, na Sultan Qaboos Grand Mosque, ele é persa e com cerca de 1,7 bilhão de nós, processo que durou 27 meses para ficar pronto. Ao entrar, olhe para cima, pois a iluminação da mesquita é composta por 35 lustres de cristal Swarovski. O maior, suspenso no domo, pesa oito toneladas. Os jardins da mesquita são outro extra da visita. Um cuidado básico: Para evitar reação negativa, não sensualize (muito) nas poses para fotografias. Pode parecer conselho desnecessário, mas é uma situação que acontece e se repete!
A Royal Opera House Muscat – prédio majestoso e que mescla elementos modernos com referências à arquitetura tradicional omani – é o centro cultural mais relevante em Omã. Ele foi inaugurado em 2011, também estabelecido por decreto real. É um exemplo dos investimentos que o sultão destina ao setor cultural nacional ao incentivar e receber artistas do sultanato, da região, e do mundo. Do arabesco ao ballet, contemplando a música clássica, recitais, ópera, jazz, apresentações familiares, a Royal Opera House Muscat já acolheu Plácido Domingo, e a soprano Renée Fleming, entre outros. Verificar a programação da casa antes da chegada é recomendado para assegurar ingressos, que geralmente são mais baratos na comparação com eventos semelhantes em outros países.
Cidade histórica A Mascate antiga é protegida por um muro nas partes sul e oeste. A construção data de 1625, assim como as torres arredondadas que fazem parte do conjunto. Já os flancos norte e leste, eles são resguardados – naturalmente – por montanhas e pelo Golfo de Omã. A Mascate de outrora é composta por casas antigas, conhecidas pelas portas de madeira esculpidas, ruas estreitas, becos, e por sediar os fortes Al Mirani e Al Jalali. Ainda, na cidade velha, está a residência oficial do sultão, o Al Alam Palace, uma propriedade razoavelmente modesta, sem a intenção de ser sarcástico, e localizado próximo do Museu Nacional de Mascate e do Museu Franco-Omani.
Do Palácio do sultão Qaboos ao Mutrah Souq – o mercado público de Mascate, e um dos mais antigos em Omã –, são cerca de 4,5 quilômetros. Para quem aprecia caminhar, é um trajeto agradável, costeando o Golfo de Omã, e há dois parques no caminho. Caso uma parada para descansar seja necessária, ou simplesmente para desfrutar a vista, são eles: o Parque Kalbuh, e o maior, o Riyam, com um monumento que imita um queimador de incenso, elemento que faz parte da história de Omã.
Comprar incenso, e de carona ouvir um pouco sobre a narrativa dele, sobre os tipos, as diferenças na qualidade, pode ser feito no Mutrah Souq, o ponto final da caminhada pelo distrito de Mutrah. O mercado tem aproximados duzentos anos, e a entrada é pelo Mutrah Corniche, na beira do Mar de Omã. Até o portão final – que conduz a quarteirões mais velhos do distrito –, o Mutrah Souq é caracterizado por ruelas cobertas, e para venda estão os típicos produtos que despertam os sentidos: incenso, perfumes árabes, doces omanis, temperos, além de itens de prata, roupas modernas e tradicionais. Lembre-se: barganhe! Sem exageros insanos, mas barganhe!
Nizwa
Mascate pode servir como base para viagens próximas. E Nizwa, a uma distância de 165 quilômetros da capital, é um desses destinos. Ponto importante comercial e religioso na história de Omã, e ao pé da cadeia montanhosa Al Jabal Al Akhdar, Nizwa é repleta de pomares, riachos e palmeiras: é um oásis que se estende por oito quilômetros. Por trás da paisagem verde do vale entre as montanhas, está em atividade um sistema de irrigação antigo, conhecido como Falai, em uso por todo o país, e que faz parte do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural da Unesco. Em Nizwa, ele pode ser visto quando se passeia pelas ruas da cidade.
O Forte de Nizwa, concluído em 1650, é outra atração local. A torre circular, e imensa, a maior do tipo no sultanato, oferece vistas belas e em todas as direções. Adjacente ao forte, está o Souq de Nizwa, o mercado. É onde são vendidos os produtos das indústrias locais, como punhais, itens em cobre, além de artesanato, frutas, legumes – e o conhecido mercado de cabras. O mercado abre pela manhã e após a meia tarde. Acompanhe também o burburinho do mercado de peixes, e mais uma vez, a simpatia dos omanis durante o processo.
De Mascate para Nizwa, pode-se pegar o ônibus do serviço nacional de transporte. Mesma coisa para o retorno. Táxis também estão disponíveis do lado de fora do Souq, e o preço para Mascate pode ser discutido. Às vezes, fecha-se um bom negócio.
Sur e região
Próxima na lista, a portuária Sur – é uma das cidades mais antigas de Omã, assim como o porto é um dos mais velhos do país –, e no passado, ela teve papel relevante na atividade comercial marítima entre a Península Arábica, a Índia, o sudeste asiático e o continente africano. As produções de embarcações do tipo dhow e sambuk deram destaque a Sur no passado. Curiosidade: é a cidade mais oriental da Arábia, e a primeira a presenciar o nascer do sol na região.
O Castelo Sunaysilah oferece um panorama sobre as casas – predominantemente – em tons pastéis de Sur, no contraste com o azul do Mar de Omã. Sur é tranquila, em algumas partes, suja, e os finais de tarde na praia são dominados pelo futebol. As partidas, amadoras, usualmente terminam quando as mesquitas, quase em uníssono, entoam o chamado para reza, e em direção a elas, os devotos vão.
De Sur, é possível explorar os arredores da cidade, e há muito para ver. Alugar um 4×4 – ou ser levado por amigos omanis em um 4×4, mais um ensaio da gentileza omani – é a melhor maneira para observar os vales. Wadi Shab e Wadi Tiwi são os mais conhecidos. Eles são áreas com vegetação exuberante, leitos de rios, e piscinas naturais. O Wadi Shab reúne água fresca, originada no topo das montanhas, os penhascos rosados, e um encontro com o mar. Calçados confortáveis são essenciais, já que se caminha sobre rochas, por trilhas, e até pela água. Refrescar-se nela, ou tomar um banho também é praticável. É passeio para quem gosta de um pouco de aventura, porém nada fora do normal.
O Parque Hawiyat Najm é outra possibilidade na vizinhança de Sur. Nele, há uma depressão natural profunda, coberta por água. O omani Omar Al Manari, de 23 anos, natural de Sur e o (nosso) anfitrião, assim como outros locais, diz que o Sink Hole é resultado da queda de um meteoro num passado longínquo. Seguindo caminho, em Ras Al Had, precisamente em Ras Al Jinz, há um santuário de tartarugas, e a cada ano, milhares delas retornam à costa para pôr os ovos. A melhor época para acompanhar o processo é de outubro até dezembro.
Salalah
Na extremidade sudoeste do país, distante cerca de 1000 quilômetros de Mascate, e próxima da fronteira com o Iêmen, Salalah é a capital da região Dhofar. Para chegar até ela, pode-se usar a linha Mascate-Salalah da ONTC, a companhia nacional de ônibus, por meros R$ 50,00. Porém, lembre-se, são 1000 quilômetros e a viagem não é das mais aconchegantes. Dirigir e atravessar o deserto até Dhofar é outra opção, não muito recomendada. O trânsito em Omã é complicado – usando a diplomacia para descrevê-lo. Se o orçamento permitir, há voos diários de Mascate para Salalah, e de outras cidades do Golfo (a companhia aérea low cost flyDubai liga o Emirado a Salalah).
Ao viajar por Omã, percebe-se como a paisagem muda constantemente, entretanto Salalah é um caso à parte. Plantações de bananeiras e de coqueirais a perder de vista, praias de areia branca, algumas que de tão quietas, parecem ser privadas. As principais estão localizas nos distritos de Dahariz, Al Baleed e Haffa. Em Haffa, está ainda o palácio Al Hisn, vizinho do Al Haffa Souq, o mercado. O último é especializado em incenso, supostamente, os melhores do sultanato. Uma variedade de produtos também pode ser encontrada lá. Se estiver pelas ruas da cidade, e a fome ou sede bater, há várias bancas que vendem frutas frescas e uma saborosa água de coco. Detalhe: paga-se, no máximo, R$ 2,00 por uma.
Salalah, onde o sultão Qaboos nasceu, goza de outra característica específica. Durante o verão na Península Arábica, a temperaturas é sufocante – ela facilmente ultrapassa os 45°C. Contudo, em Salalah, no mesmo período, ela dificilmente excede os 30°C. É o tempo da monção, ou também conhecido como “khareef”, quando as montanhas nos arredores da capital de Dhofar perdem o tom árido marrom, e se cobrem de um verde viçoso. As nascentes jorram e formam cachoeiras sazonais e oásis, cobertos por um nevoeiro. A monção é de julho até o início de setembro, período do Salalah Tourism Festival.
Não importando a época do ano, alugar um carro para descobrir a região é interessante. Há empresas do ramo no aeroporto, e algumas espalhadas por Salalah. À oeste da cidade, a praia de Mughsayl tem montanhas como pano de fundo. A leste, em direção ao município de Taqah, praias intocadas podem ser reveladas. Perto dali, o Wadi Darbat é um vale com um cordão de pequenos lagos, rodeado por colinas. Durante o ano, os locais para piqueniques dividem espaço com camelos, cabras, e burros que ali pastoreiam.
De volta a Salalah, o ponto final da viagem a Omã, torna-se claro que Ameera Mahrooqui, a amiga e ex-colega dos tempos de estudante da Europa, estava certa. O progresso no país é mais lento, mas Omã realmente oferece o que outros países da região não proporcionam. A simpatia genuína, gentileza, e a simplicidade do omani são de outro tempo, outra era. E em uma caminhada pelas praias de areia branca de Salalah, cercado por simultâneas partidas de futebol, o sol para se pôr no Oceano Índico, um pai com três filhos comprova a teoria acima. Ele cumprimenta, conversa, sorri e lapida ainda mais a memória que leva-se do sultanato.