BEM-ESTAR: MENTE SÃ – A IMPORTÂNCIA DA TERAPIA

Por Nadezhda Bezerra

A pandemia do Covid sem dúvidas gerou um impacto psicológico de ordem individual e coletiva. Isolamento, solidão, tristeza, medo e o luto em si, foram sentimentos experimentados de várias maneiras, seja na própria pele, com perdas pessoais, na proximidade de gente conhecida ou até mesmo pelos noticiários.

Com as vidas totalmente transformadas quase que do dia para a noite, muitas pessoas recorreram aos profissionais da psicologia para lidar com angústias, medos e um novo jeito de viver a vida que se impunha, principalmente no uso de telas e das trocas e relações à distância.

Para além da pandemia, no quase retorno à quase normalidade, a terapia vem ganhando mais espaço entre homens e mulheres na convicção da importância do cuidar da mente, do reconhecimento e entendimento de si. E no encarar e lidar com a vida e suas variadas nuances.

Mesmo ganhando mais espaço, ainda falta muito para a terapia ocupar um lugar de prioridade na vida das pessoas. Para conhecer um pouco mais da Gestalt, linha da psicologia que trabalha principalmente o enfrentamento de traumas, conversamos com o terapeuta Carlos Machado. A conversa foi tão boa que deu até vontade de agendar uma sessão!

OS TRAUMAS QUE MUITAS VEZES NÃO RECONHECEMOS

É muito comum ouvir alguém falar “mas eu não preciso de terapia”. Ainda há um entendimento equivocado que terapia é “só para quem tem problema”. A terapia é antes de mais nada um processo de autoconhecimento importante e necessário para todos nós. Em segundo lugar, todos nós temos problemas e principalmente traumas que sequer reconhecemos. Daí não sabermos lidar com determinadas situações ou nos vermos mergulhados em angústias, receios e atitudes repetitivas sem entender como e por quê.

Segundo nos explica Carlos Machado, o trauma na psicologia é uma resposta emocional a um evento ou experiência que é percebido como ameaçador à vida, à integridade física ou psicológica de uma pessoa que manteve feridas na memória e no conceito de identidade. Os traumas normalmente deixam um impacto significativo na saúde mental, e podem levar a uma série de sintomas psicológicos, incluindo flashbacks, ansiedade, depressão, evitação, distúrbios do sono, alterações no humor e aumento da irritabilidade.

CARA A CARA COM O TRAUMA

Para Carlos, enfrentar os traumas é extremamente importante para a saúde mental e física de uma pessoa já que ele pode afetar negativamente a capacidade de alguém em lidar com as demandas cotidianas, de relacionar-se com outras pessoas e de aproveitar a vida em geral.

Além do mais, o trauma interfere no processo de autorregulação e, por consequência, no início do ciclo de contato ou interação, pois, contamina as sensações e as percepções. Consequentemente, a fronteira de contato também sofre com as memórias traumáticas, já que se torna rígida. O contato com outra pessoa, afetado pela experiência traumática, fica sujeito a uma hiper vigilância ambiental, com ajustamentos criativos disfuncionais, voltados para o gesto de fuga, luta ou paralisia. Daí a importância do enfrentamento para tornar o indivíduo mais funcional, autorregulado, liberto e pronto para os relacionamentos.

Enfrentar um trauma pode ser um processo desafiador e doloroso, mas, como enfatiza Carlos, é um passo importante na busca pela saúde e harmonia consigo e com o mundo. A ajuda de um profissional de saúde mental qualificado é fundamental processo, afinal, ele é quem mais pode oferecer suporte e orientação adequados durante a caminhada em busca da recuperação.

O PAPEL DA GESTALT PARA VENCER OS TRAUMAS

Carlos nos explica que a “Gestalt-terapia — GT é uma proposta humanístico-existencial de ver o ser humano em toda a sua plenitude, em pleno desenvolvimento de suas potencialidades”. Ou seja, o humano é uma configuração que precisa fazer sentido, principalmente, para ele mesmo. O mundo é um campo em ação, cada indivíduo é um subcampo que é afetado pelo mundo e o afeta igualmente.

Ainda segundo ele “o enfoque clínico da GT está no conceito de aqui e agora, levando-se em consideração aquilo que é apresentado como fenômeno no momento atual — sem negar o histórico do paciente. Esse conceito ajuda o indivíduo a ficar mais consciente de suas reações e ao que está acontecendo naquele exato momento. Com isso, a busca pelo enfrentamento e conscientização dos sentimentos, reforça seu saber lidar com as demandas diárias.”

Em resumo, a Gestalt-terapia compreende o trauma como percepções fixas, uma situação inacabada do passado.

HOMENS, MULHERES E A FUGA DA TERAPIA

Evitar a terapia é muito comum e as desculpas são várias. Há quem comece e já na primeira sessão desista. Para Carlos, geralmente fugimos de algo que nos causa medo ou desconforto. Se alguém está fugindo de terapia, pode ser útil abordar a questão com empatia e compreensão. Fazer terapia deve ser uma escolha e não uma imposição.

Em relação a homens e mulheres essa fuga fica mais acentuada no universo masculino. De acordo com Carlos as mulheres são mais propensas a expressar emoções e sentimentos abertamente, enquanto os homens podem ser mais reservados em relação a suas emoções e sentir mais estigma em relação à saúde mental fazendo entender que a ajuda terapêutica é um sinal de fraqueza ou inadequação.

APRENDIZADOS DOS TRAUMAS

O trauma coletivo deixado pela pandemia, assim como outros, também apresentam alguns aspectos não necessariamente negativos. Para Carlos, assim como a humanidade relembra a pandemia de gripe espanhola de 1918, o mesmo acontecerá com a Covid 19, não apenas pelo aspecto negativo pelas perdas significativas e do isolamento social, mas, também, pelos ajustamentos e aprendizados sociais que foram necessários como a solidariedade, a mudança na forma de trabalho, relacionamento e prevenção de contágio. Até mesmo a psicologia deu um salto, principalmente na consolidação do atendimento on-line, o que permite mais acesso à psicoterapia.

OS DESEJOS DE UM TERAPEUTA

Carlos nos contou que como terapeuta ele tem o propósito de facilitar o processo de autoconhecimento, desenvolvimento, ajustamento social, deixar a vida das pessoas mais leve e compreensível, chegando às aceitações e mudanças quando necessárias. “Ver o paciente livre de amarras que o impedem de viver em plenitude é a minha maior realização”, diz Carlos.

Para ampliar a realização desse propósito, além das consultas convencionais, Carlos presta serviço voluntário em uma ONG (Movimento comunitário) onde atende a população mais carente, coordena a equipe de estagiários e agora faz parte de um projeto grandioso com a terapia em grupo, focada nos pais de crianças com (TEA) transtorno do espectro autista, uma ação onde dá voz aos que só são observados como cuidadores, mas que têm muito o que dizer. Não fuja da terapia, ao contrário, corra ao encontro dela. A mente sã há de te agradecer por isso.