amoso pela sua força na gastronomia, o chef Henrique Fogaça é daqueles caras que não se acomodam em cima do sucesso. Além de renomado chef e uma referência na alta gastronomia paulista, Fogaça é um dos apresentadores do Masterchef, empresário à frente dos restaurantes Sal, roqueiro e agora inicia uma parceria musical com o DJ Cia. De volta à MENSCH, Fogaça nos conta um pouco do que está rolando nessa sua agitada vida, sem perder o estilo e o humor sarcástico de sempre.
Fogaça, a cozinha ou a música, o que surgiu primeiro em sua vida? A música entrou na minha vida desde cedo. Eu era roqueiro antes de ser cozinheiro. A música e a gastronomia são minhas paixões, elas definem o meu estilo de vida. Tanto o Oitão quanto a gastronomia partem de uma necessidade minha de me expressar, de produzir algo. Então, acredito que estejam, de certa maneira, entrelaçadas.
Você tem participado de praticamente todas as temporadas do MasterChef Brasil. Sente uma evolução no nível dos participantes e das competições? Eu sou jurado do Masterchef desde 2014, já faz 10 anos! Nesse tempo, muitas histórias já passaram pelo programa e, com certeza, houve uma evolução tanto dos participantes quanto das competições. A cada ano que passa nós precisamos evoluir, melhorar e aumentar o nível de exigência, pois muitas pessoas que entram no reality mudam de vida, assim como a minha vida mudou através da gastronomia.
O quanto do Fogaça durão, que às vezes assusta os participantes, existe na vida real? Normalmente, você é um chef muito exigente? Apesar desse meu jeito, tenho coração mole. Sou verdadeiro e sincero. Sempre fui uma pessoa do bem e, aos poucos, isso também foi ficando evidente. No programa é preciso ser mais sério, pois realmente estamos falando do desempenho e desenvolvimento de profissionais. Cada jurado ali tem um papel, sabe, porque é importante para o formato de TV, que pede essa dinâmica. Mas, claro, eu sou um profissional exigente, amo o que faço e quero transmitir o melhor da minha gastronomia para as pessoas.
O que não é admissível numa cozinha, em um chef? Acredito que para ser um chef é preciso ter muita dedicação, acima de tudo. Tem que correr atrás, não pode desistir, não pode abaixar a cabeça para os desafios. Além disso, tem que entender o funcionamento de uma cozinha, saber liderar uma equipe, saber criar pratos. Então, a falta de vontade de estar ali e não ter amor pela profissão, são inadmissíveis em uma cozinha.
Acha que esse formato de reality tipo MasterChef está desgastado depois de tantos anos no ar? Como se reinventar? Eu acho que o Masterchef vem se reinventando ao longo dos anos. E acredito que seja uma combinação de diversos fatores. Primeiramente, um trabalho impulsionado pelo amor compartilhado por todos – jurados, participantes e equipe – pela gastronomia. E claro, a competência da equipe, a seleção dos participantes, a produção dos episódios em si, os participantes que engajam e buscam o seu melhor, e, é claro, os jurados. E a essência e verdade do Masterchef permanecem as mesmas, por isso estamos no ar há tanto tempo.
Recentemente você abriu um novo restaurante SAL (Bela Cintra), muito mais imponente. O que esse novo SAL traz de novo e ousado? A proposta do novo Sal Gastronomia permanece a mesma, o que mudou foi o estilo. Nós misturamos a decoração moderna com um estilo rústico chique. O projeto conta com 180 lugares e uma área externa. O restaurante tem dois andares e se divide em: hall de entrada com uma parede côncava que faz alusão a obra ‘QUESTÃO DE TEMPO’ do renomado artista Richard Serra, além dos aquários de sal; bar e salão no 1º andar; salão principal com uma cozinha aberta pela qual o público pode acompanhar o preparo dos alimentos, adega com cerca de 140 rótulos e varanda, no 2º piso. Ainda usamos materiais como o aço corten, madeira e couro. O balcão do bar foi feito com pedra Onix vinda especialmente do Paquistão. Além das famosas caveiras que dão um toque da minha personalidade e essência hardcore.
Na gastronomia, a novidade que trouxemos para ambas as unidades do Sal está no Menu Vegano, que inclui o medalhão de beterraba com arroz 7 grãos e shimeji, além do Ceviche de caju com leite de castanha. São novos tempos, e sempre procuro adaptar a minha culinária a esses momentos. Então, o Menu Vegano foi muito pensado para atender aos amantes da culinária plant based.
Falando em ousadia gastronômica, o que é mais desafiador para você na criação de um prato? No começo, eu tinha uma criatividade e uma mente muito férteis. Isso foi muito bom, porque eu não tinha medo de errar. Hoje, para criar um prato, sou muito mais cuidadoso. Quando a gente vai amadurecendo e tendo mais conhecimento, você fica mais restrito ao mesmo tempo em que tem mais ferramentas. Então, sempre procuro equilibrar a apresentação do prato com o sabor, tudo para oferecer o melhor para as pessoas.
Quais suas maiores referências e inspirações na gastronomia até hoje? Na gastronomia me inspiro nos chefs Anthony Bourdain dos EUA e o Quentin, da Bélgica que foi um grande incentivador na minha gastronomia.
Desbravando novos mercados – além de músico, você começou a trabalhar com moda ao lançar uma linha de joias masculinas. Como isso surgiu? Ficou satisfeito com o resultado? Eu tenho aprendido a gostar mais de moda. Sempre tive um estilo diferenciado, com uma pegada mais rocker e street, e com esse universo da TV, o gosto pela moda foi ficando cada vez mais evidente. Gosto de brincar, usar acessórios, boinas, botas. Então, a ideia dessa linha de joias masculinas em parceria com a marca Convex Joias veio da vontade de transmitir o meu estilo mais robusto e hardcore para esses acessórios. A Coleção Cápsula traz anéis, pulseiras, correntes, pingentes e colares forjados em prata escurecida artesanalmente, design orgânico e autêntico. Ou seja, são peças que traduzem bem o meu estilo.
Quando o caminho de vocês se cruzou? De onde vem as afinidades?
FOGAÇA: Nós nos cruzamos, primeiramente pela RZO, a banda da qual o DJ Cia faz parte e que gosto muito. Nesses caminhos da música, tenho muito contato com o pessoal do rap também, conheci o DJ Cia em um estúdio de música. Depois o Sandrão, vocalista da RZO, me convidou para fazer uma música juntos que chama Da Grade à Liberdade, inclusive gravamos um clipe. Desde então temos essa boa relação, unidos pela música.
DJ Cia: Eu já acompanhava o Fogaça. Mas, quem me aproximou dele foi um amigo – o Skatista (O LOBAO) que me disse que tinha um som com o Fogaça e quando vi que ele tem uma luta gigante e que também gosta de HiP HOP. Ai, ferro! Não teve jeito – foi sintonia comprovada. Então, fizemos um som juntos chamado Entre a Grade e a LIBERDADE.
E como veio a ideia de ter um projeto juntos?
FOGAÇA: A ideia surgiu através do Lobão, um amigo meu e que temos um projeto chamado Problema. Ele tem uma conexão com o Sandrão e me contou do interesse de fazer um som juntos. Aí, nós fizemos a música Da Grade à Liberdade e foi aí que conheci o DJ Cia.
DJ Cia: A ideia veio naturalmente, NE? Fizemos um som junto – chama-se Liberdade, com Sandrao RZO, FOGAÇA e DJCIA. Estou, também, participando de uma música no álbum do Fogaça.
Quais afinidades musicais entre vocês?
FOGAÇA: A música Punk, Hardcore e o Rap são manifestações culturais, sociais e políticas que transmitem mensagens. São estilos diferentes de batida e ritmo, mas a ideologia é, basicamente, bem semelhante. Inclusive, existem várias bandas que unem o Rap com o Hardcore – nos anos 1990, foi lançado um material nos EUA com várias bandas de peso no cenário que fez isso. Um exemplo é a música Judgement Night que juntou o Onyx, um grupo de Hip Hop do Queens, com o Biohazard, uma banda de Metal.
DJ Cia: Acredito muito que essa afinidade vem da preocupação com a saúde, com a política, das mensagens que são cobradas e cantadas através dos nossos sons.
O que o público pode esperar dessa dupla? Quando será a estreia?
FOGAÇA: Nós temos o projeto de fazer mais músicas. Mas, por enquanto, ainda está no papel. Assim que conseguirmos conciliar nossas agendas, vamos lançá-las. Então, esperem um bom som groovado, pesado e com letras potentes.
DJ Cia: Pode esperar uma música com um sabor diferenciado… A música vem com muita soma de ideias e instrumentos.
O DJ CIA é um dos nomes mais importantes do país quando o assunto é Hip Hop e Rap nacional. Coleciona inúmeros prêmios nas batalhas de DJs, e agora é figura carimbada como jurado de tais eventos. CIA é DJ e produtor musical, tendo produzido todos os grandes nomes do Rap Nacional tendo em destaque o último disco do grupo Racionais Racionais MCs – “Cores e Valores”. Na música brasileira, já trabalhou e trabalha com nomes como Daniela Mercury, Caetano Veloso, Elza Soares, Seu Jorge, Ana Carolina, entre outros. Atualmente se dedica à produção musical de diversos artistas nacionais e internacionais dentro da sua gravadora BEATLOKO. E hoje DJ CIA, além de DJ, produtor musical, ele também é ator, com papel na série musical, IRMANDADE, e acabou de estrear na série DNA DO CRIME, ambas as séries estão no catálogo da Netflix. E um de seus mais novos projetos é ao lado do Chef Fogaça.
Cia, você se tornou uma referência na cena musical paulista do hip hop e rap nacional. Como você se vê nisso tudo? Foi difícil chegar até esse reconhecimento? Eu tenho uma visão muito clara, sobre me ver nesse momento, como em outros também, que é me ver como um produto na prateleira, entende? Todo produto novo, como tudo que é novidade, chama a atenção. Então, eu tento fazer sempre coisas novas, que chamem a atenção e me coloquem nessa prateleira da novidade por exemplo, uma musica nova, um vídeo clipe, uma publicidade, um espaço como esse aqui na revista – tudo é uma ação para que o produto DJ cria, seja visto de diversas formas em diferentes momentos. Tento ser atual ao máximo e, se for falar de reconhecimento no Brasil dentro do hiphop, é um pouco difícil dizer se existe o reconhecimento porque vivemos ainda muito preconceito. Não existe reconhecimento, temos muitos exemplos que eu poderia citar – eu usaria na troca da palavra, reconhecimento seria a palavra resistência. Existe muita resistência em estar de pé até hoje.
Ainda existe algum tipo de preconceito com o hip hop e o rap? Como reverter isso? Sim EXISTE PRECONCEITO por ser uma musica vinda da periferia – músicas que relatam a realidade dentro das comunidades. Histórias vividas ou assistidas de perto, que são colocadas na ponta da caneta muitas vezes até pra alertar outras pessoas sobre como sobrevir ou de histórias que deram errado. São mensagens muitas vezes pesadas pra quem não vive dentro de uma comunidade. Então, fica a estranheza de entender porque as músicas são pesadas, mas quando vem de uma novela, uma historia ou um filme com drama, ninguém reclama – é visto com bons olhos. Acredito que esse preconceito ainda demore pra acabar quando forem letras nesse perfil. O que ameniza um pouco, é a forca da cultura e todo o tamanho a que chegamos – muitos artistas, hoje, têm equipes de 30 pessoas, no mínimo. Gera emprego fomenta o mercado, compram carros que antes só se via na mão de playboys. Estão milionários e algumas marcas estão patrocinando alguns artistas. Quando tivermos muito mais marcas grandes patrocinando, isso pode mudar mais ainda. Esse preconceito com o RAP é o mesmo que aconteceu com o samba no passado também. Quase tudo que vem das comunidades, sofre preconceito.
Na música brasileira, você já participou de trabalhos com Os Racionais MCs, Caetano Veloso e Elza Soares. Como essas parcerias lhe completam como artista e como você contribui para outros estilos? Ter participado com esses nomes, foi muito bom pra mim. São poucos artistas, DJs e produtores como eu que vieram da periferia, que tiveram essa oportunidade de crescimento, conhecimento e respeito com esse tipo de música e outros estilos musicais Os Racionais têm tudo a ver comigo – é da rua, é da periferia. Temos o mesmo olhar, enxergamos as mesmas casas de tijolos vermelhos.
No Caetano Veloso, a convite de Ale Siqueira, pude levar um pouco da minha técnica como DJ, trazendo efeitos de percussão pra dentro da música que fizemos e pude me apresentar como DJ e músico o que era muito mal visto ainda como um DJ em uma banda. Os músicos enxergavam com outros olhos um DJ fazendo scratch (risos) … mas as músicas, que cresci ouvindo com meu pai me, ajudaram a ter a sensibilidade de respeitar os instrumentos, harmonia e tempo de cada som. Na Elza Soares a Experiência, foi sensacional. Além de produzir 5 faixas do álbum, do cóccix ao pescoço, fui convidado por ela pra acompanhá-la nas turnê. Então, mais aulas e me entender como músico DJ dentro de uma banda gigante que era a dela … Em um desses shows, apareceu no camarim um negrão desenrolado que veio até mim e disse “um dia você vai trabalhar comigo”. Eu não sabia quem ele era. Depois, fui convidado sim por essa cara que hoje posso chamar de irmão. Era Seu Jorge me fazendo o convite e ai fui fazer shows com ele. Também pude participar de algumas músicas com ele e o Conjuntão Pesadão.
Minha contribuição para eles foi levar a essência do hip hop para a música que eles faziam. Porque, além de ser um representante da cultura hip hop, pude, sim, apresentar o que era uma colagem, o que era um scratch dentro da música que eles fazem. Foi uma troca importante porque também ganhei muitos fãs deles que, começaram a me seguir e admirar.
Além de DJ e produtor musical, você também atua como ator e já participou de séries como Irmandade e DNA do Crime (ambas Netflix). Como surgiu isso e como tem sido pra você? Legal. Um pouco antes, eu ja havia participado de uma cena de uma produção da Globo, chamada Terra dos Homens. Mas, isso foi lá atrás. No Irmandade, foi meu batismo nas telas internacionais, hahaha. Digamos assim. Rolou um convite. Primeiro, pra ser um policial e eu não aceitei, no primeiro momento. Depois, me chamaram de novo pra fazer uma cena tranqüila. Eu não tinha nem voz, mas na hora que ouvi gravando, eu falei uma parada lá no set de filmagem e o diretor gostou. Assim, fui ganhando espaço. O Milan Cartaz me batizou porque eu só tinha texto. Mas, por conta dele, soltei a voz e fui microfonado e dali pra frente, foi só alegria. No DNA do crime, o caldo engrossou. Ganhei um papel muito legal – várias folhas pra decorar e cai pra dentro do set na humildade, pra aprender e deu tudo certo. Pude perceber a força das grandes telas. Fui fazer show na Europa na sequência que a série tinha sido lançada, e pessoas me reconheciam na rua. Então, vi, sim, as coisas. O resultado, é muito rápido.
Você já tocou em grandes festivais como Lollapalooza e PercPan, assim como já abriu show para grandes nomes internacionais como Snoop Dogg, Chris Brown, Black Eyed Peas e 50 Cent. Como isso lhe toca? Qual a importância de abrir show para esses grandes nomes? Uma das primeiras sensações, acredito, é poder dividir o palco com artistas de quem sou fã, poder ter acesso de igual com o artista que vai tocar junto com você, é muito diferente. Até porque o próprio artista já te vê de outra forma. Cria-se um respeito maior. É um momento também em que você pode concretizar a carreira ou acabar com ela. Então, o maior cuidado e profissionalismo que puder ser é sempre bom. Isso é muito legal. Você pode mostrar que é capaz e tem condições de segurar um público eufórico, antes de grandes artistas subirem ao palco. E também se aprende sobre organização, sincronia com toda uma equipe.
Direção de produção e estilo Ju Hirschmann (@juhirschmann)
Fotos Vanessa Diskin (@vanessadiskin)
Assistente de foto Cleiton Silva (@lucianobortolotti) / Leandro Bernardes (@leandrobernardesr)
Beauty Drika Lopes (@drika_llopes)
Produtora Executiva Anna Guirro (@annaguirro)
Agradecimento Sal Bela Cintra (@salgastronomia)
Assista o making of: