Por Noélli Santiago
Existe uma dor silenciosa no coração de muitas mães.
Uma dor que não grita, mas adoece. Que não sangra, mas exaure.
A dor de não poder apenas… ser.
Ser humana antes de tudo. Antes do leite, das decisões, das expectativas que não pediram licença para entrar. Antes do papel de mãe, existe uma mulher. E antes da mulher, existe uma pessoa — com limites, desejos, memórias e cansaços. Uma pessoa que a sociedade ensinou a esconder em nome do amor.
Mas que amor é esse que exige o apagamento de quem ama?
Na semana em que flores e homenagens se multiplicam nas vitrines, talvez o maior presente que possamos oferecer a uma mãe seja algo mais raro: a permissão de existir inteira, imperfeita, vulnerável.
“Antes de ser mãe, eu sou só uma pessoa”, terapeuta e mentora especializada em neuroplasticidade e espiritualidade aplicada, em uma fala que já reverbera como semente no coração de milhares de mulheres que se reconhecem cansadas de se perder no papel.
A neurociência confirma: a maternidade muda o cérebro. Mas não deveria roubar a alma.
Estudos recentes da Universidade de Leiden, na Holanda, mostram que o cérebro de uma mulher literalmente se reorganiza após a maternidade: áreas ligadas à empatia e à vigilância emocional se intensificam, como se o corpo dissesse “estou pronto para proteger”. Mas o mesmo estudo aponta que esse processo, se não for acolhido com suporte emocional e social, pode gerar sobrecarga, ansiedade e sensação de perda de identidade.
E é aqui que mora o perigo: quando a sociedade romantiza o instinto materno como se fosse suficiente para lidar com tudo, ela invisibiliza a mulher real por trás da entrega.
“Ser mãe é, muitas vezes, se tornar maior do que você acredita que pode. Mas ninguém fala sobre o preço disso. Sobre a solidão. Sobre a culpa. Sobre as noites em que você chora e ainda assim se levanta para acolher.”
Filhos não nascem para serem perfeitos. E mães também não.
Na lógica de Bert Hellinger, um dos nomes mais respeitados no campo das Constelações Familiares, “a pior coisa acerca do nosso tratamento com as mães é lhes negarmos o direito de serem apenas mulheres comuns.”
Essa frase, aparentemente simples, é revolucionária.
Ela nos convida a desfazer a ilusão de que o amor materno precisa ser sinônimo de sacrifício absoluto. Nos convida a lembrar que mães não estão aqui para corresponder às idealizações dos filhos, nem para carregar sozinhas o peso do mundo.
“Maternidade não é sobre perfeição. É sobre presença. Sobre recomeços diários. Sobre pedir perdão. Sobre reconhecer que amar um filho não exige ser invencível — exige ser verdadeira.”
E se o maior presente que você pudesse dar à sua mãe fosse a sua escuta?
A escuta real. A que não exige que ela seja forte o tempo todo. A que permite que ela chore sem culpa, descanse sem se justificar, erre sem ser julgada.
A escuta que reconhece: por trás da mãe, há uma mulher que ainda está aprendendo a ser.
Uma mulher que talvez nunca tenha tido espaço para existir fora dos papéis.

Uma mulher que precisa ser olhada não só como mãe, mas como alma.
“Quando você vê sua mãe como pessoa, algo se cura em você também. Você deixa de exigir dela o que nem você sabe dar. Você cresce. Você ama com maturidade.”
No fim das contas, talvez seja isso que a maternidade nos ensine — que o amor não nasce da idealização, mas da coragem de continuar tentando. Que o mais sublime da experiência de ser mãe está justamente na imperfeição compartilhada entre quem cuida e quem é cuidado. Que não precisamos ser tudo para todos. Precisamos apenas ser.