CAPA: ÉRICO BRÁS – NOSSO SHOWMAN

Podemos dizer que o ator e apresentador Érico Brás é um vencedor. Nascido em Salvador, ele conheceu a arte desde muito cedo, aos 7 anos. Fez teatro de rua, participou do teatro do Olodum o que o levou até cinema para participar do filme “Ó Paí, Ó”, que depois virou seriado na TV. Daí em diante foram novelas, humorísticos, seriados e hoje em dia encara seu maior desafio, ser o primeiro apresentador negro no Brasil com um programa ao vivo e diário na televisão brasileira. Apresentado por ele, Fernanda Gentil e Fabiana Karla, o “Se Joga” estreou com índices mornos de audiência. Hoje, o vespertino se mantém na grade de programação como um dos produtos de sucesso da emissora. E foi toda essa vivência que deu a ele ferramentas para ser uma voz ativa nas causas negras. Em 2018, o artista foi condecorado um dos “100 Negros Mais Influentes do Mundo” – lista feita pelo Mipad (Most Influential People of African Descent). Érico Brás, que completa 22 anos de TV em 2020, atualmente está no canal Viva e GNT de volta com o querido Jurandir, na série de humor “Tapas & Beijos”, para o público matar a saudade.

Érico, como foi posar para essas fotos que tem até um clima anos 60/70? Eu gostei muito de fazer estas fotos e tenho uma atenção especial pela década de 70, quando o movimento Black Power ficou forte, enfatizando o orgulho racial.

Você é um cara muito caseiro? Ou esse período de quarentena está fazendo você descobrir um novo Érico caseiro? Fique em casa! Isto é o mais importante agora e é o que estou fazendo. Aproveito este período para ler mais e também limpar a minha lista de filmes do Oscar. Antes do COVID-19, eu já era muito caseiro porque faço um programa diário e passo o dia todo na TV. Quando não estou no trabalho, eu gosto de ficar em casa ou no máximo saio pra jantar com Kenia, que é minha querida companhia há anos. Ah! Eu geralmente, antes de ir para à TV, costumo fazer alguma atividade artística.

Você parece ser um cara hiperativo. Verdade? Se sim, como é isso? O que te move? Já fui até mais ativamente inquieto. Sou movido pelas novidades, pela vida e pela necessidade de criar. O desafio da vida, hoje, é continuar vivo no meio de tudo isso que somos obrigados a respirar, ver e ouvir. Muitas vezes, minha inquietação maior é saber como ajudar a melhorar esse país, já que quem pode não o faz há séculos.

Quando criança já era assim? Dava muito trabalho? Que lembrança mais forte tem dessa época? Nunca dei trabalho aos meus pais. Sempre fui inquieto com o que eu achava que deveria avançar, mudar e até mesmo com as minhas conquistas pessoais, que de alguma forma estavam ligadas ao coletivo. As minhas lembranças mais fortes de infância são de ter participado de várias passeatas no centro de Salvador, no grito dos excluídos, manifestações de estudantes, artísticas, congressos, fóruns, etc… Me recordo que comecei no teatro aos 7 anos e foi o que me deu complemento educacional. Logo depois, me tornei professor de artes na mesma escola que estudei no primário. Isso foi lindo! Tenho orgulho do homem que sou hoje. Sou fruto de um movimento muito precoce, mas que é necessário para a sociedade brasileira de construir novos líderes e conscientes do seu papel na sociedade.

Pela nossa 1a entrevista (2017) já descobrimos que você é um paizão e super parceiro da sua esposa Kenia. Como é isso no dia-a-dia? O que vocês tem mais em comum que dá certo? Sou pai de Érica, filha do meu primeiro casamento e sou pai coruja mesmo. Fico atento a tudo! Kenia tem dois filhos do seu primeiro casamento, que já são adultos. Eu e Kenia entendemos educação como caminho para a formação de um cidadão independente. E esse é um princípio básico na construção de um cidadão capaz de fazer suas escolhas e se responsabilizar por elas.

Com mais tempo em casa como manter a harmonia? Inventando arte! Estou lendo algumas obras que não consegui antes, vendo filmes, tentando terminar quadros que comecei a pintar, fazendo música, enfim, criando. E quando bate a saudade da família, eu estou fazendo o que muita gente faz, que é falar com os familiares pelas redes com chamadas de vídeo. Uma coisa que me bate sempre neste período de isolamento social é que merecemos ser um Brasil melhor neste momento.

Hoje em dia você é um dos poucos negros na apresentação de um programa. Como você vê isso? Não sou o único negro apresentando. Temos outros que estão cumprindo muito bem com esta representatividade e seus ofícios. A diferença é que estou na casa das pessoas de segunda á sexta, ao vivo, num horário que as pessoas precisam relaxar para continuar a labuta diária. Sinto que existe uma necessidade de representatividade maior no entretenimento, que tem sido observado há tempos pela TV brasileira e que está sendo atendida aos poucos, ainda que tardiamente. Eu vejo como positivo isso tudo que está acontecendo, mas acredito que ainda temos alguns campos que precisam ser reparados como, por exemplo, a produção de conteúdo no audiovisual. Eu acredito que o mercado tem provocado às emissoras, agências de publicidade, empresas e produtoras que a maioria da população negra quer se ver nesses espaços. A prova disso é o lucro financeiro que vem através da audiência e do consumo – afinal 54% da população brasileira é negra.

Como surgiu o convite e quais os maiores desafios nessa nova empreitada? Ser apresentador é algo que já estava no meu plano há alguns anos e comecei a buscar com mais afinco isso; me oferecendo dentro da empresa para alguns produtos. Topei fazer várias matérias no estúdio do antigo Vídeo Show e fui sentindo o ‘perfume’ do que eu queria. O convite chegou no ano passado, quando eu estava na Nigéria e tive que voltar correndo para fazer o teste. Fiquei feliz quando ouvi, definitivamente, que seria o apresentador do Se Joga, junto com Fernanda Gentil e Fabiana Karla, que chegou depois. Eu costumo me desafiar, gosto de ser desafiado e o “Se Joga” faz isso comigo todos os dias.

Sentiu alguma resistência por parte do público? Alguma resistência por ser um ator à frente de um programa diário de auditório? No início, li algumas coisas sobre o programa que não eram estimulantes e pareceu que algumas pessoas torciam contra. Quanto a ser um ator e apresentador, pouquíssimas pessoas reprovaram. Até porque, o telespectador também gosta do novo e o frescor que o trio leva com a nossa diversidade. O que a gente estava buscando era atender o telespectador, que já estava sem uma atração há alguns meses. Nós continuamos tentando entender o gosto desse público que vem se mostrando cada vez mais fiel. Haja visto a audiência no Brasil.

Com essa pausa nas gravações como você avalia esses meses de “Se Joga”, a interação entre você, Fabiana Karla e Fernanda Gentil? A nossa energia conduz a atração, que é muito bem dirigida e produzida. Isso nos deixa com um sentimento de que vamos acertar ainda mais a cada dia. A pausa, agora por conta da pandemia, deixa a gente com saudade da rotina e só comprova o que o querido Pedro Bial me disse quando encontrei ele no seu programa, Conversa com Bial: “…apresentar é uma cachaça. Chega uma hora que você não consegue viver sem…” E tem sido assim. Eu estou sentindo falta demais dos colegas e do programa, que já faz parte da minha vida e das tardes dos telespectadores brasileiros.

Ser apresentador era algo que você desejava ou a oportunidade apareceu e você agarrou? Sente falta de atuar? Sim! Já pensava em ser apresentador e estou muito feliz fazendo isso. O ator, por enquanto, está aqui do lado. Sou um Apresentador Ator ou Ator Apresentador!

É um cara muito vaidoso? Como? Sou vaidoso, mas sem exagero. Cuido da aparência, brigo com a balança… Mas gosto de comer bem, beber ótimos vinhos e whiskies e usar roupas legais. A minha vaidade, como homem negro, é também um ato político e se vestir bem é uma das formas de afirmação. Nós sempre tivemos muito estilo!

O que te tira do sério? E o que coloca um sorriso no rosto? Me tira do sério o racismo, o preconceito, a injustiça e a cegueira. Às vezes, me parece que nós brasileiros não temos noção do quanto somos grandes e fortes. O nosso povo é forte, mas precisa tomar a rédea dessa nação. Fico feliz e o sorriso me toma o rosto quando vejo a vitória de pessoas, grupos e movimentos.

Para relaxar um bom… Ai, ai…é tanta coisa que não cabe aqui (risos)!