Ele produtor e diretor, ela terapeuta consciencial. Em comum a paixão pela arte que uniu Oscar Zinelli e Noélli Sántiago em projetos que vão muito além de apenas a vida a dois. Porém o que foi primordial nisso tudo foi o autoconhecimento que os transformou tanto individualmente quanto como casal. Trabalhar num meio onde fatores como ansiedade, julgamento ou medo do fracasso, se tornam um campo altamente fértil para trabalho tanto de Oscar quanto de Noélli. Para entender como funciona tudo isso, e conhecer um pouco mais da relação dos dois, batemos um papo sobre um pouco de tudo. O resultado não poderia ser melhor e você confere abaixo.
Oscar, você diretor de cinema e produtor cultural, Noélli você terapeuta consciencial. Dois mundos bem diferentes que se juntaram. Onde vocês se completam? Perspectiva talvez seja a chave de todo o nosso trabalho. Vivemos crenças estabelecidas por medo, angústia, ansiedade, apatia. Energias desequilibradas que paralisam. Ter um lugar, um teatro no Barra Point, que é a representação do Rio, ponto de referência no Brasil e fora dele, faz com que tenhamos a possibilidade de construir uma nova consciência coletiva de fé, esperança, vida. Temos o mesmo desejo, poder de alguma maneira contribuir para a transformação pessoal e coletiva. Em algum momento essas sementes de autoconhecimento, autoconfiança e autocuidado germinarão, isso transforma, nos torna seres humanos melhores. Melhores para nós mesmos, nos tornamos melhores para o mundo. Somos seres individuais e únicos, integrados ao todo. Nos transformamos e transformamos o mundo, assim nos completamos.
Temas como ansiedade, depressão e síndrome do pânico, têm afetado o meio artístico? E como perceberam que através do teatro isso poderia ser um caminho positivo para todos? De modo geral essas condições afetam as pessoas, no meio artístico tem sido cada vez mais compartilhado. Ultrapassando as barreiras do julgamento, vergonha, medo e solidão, estamos aprendendo a enxergar a essência, seres humanos, não só personagens ou celebridades. Abrir espaços coletivos para falar, sem tabus, sobre saúde mental/emocional, sobre crenças pré estabelecidas, sobre tudo aquilo que está em nossas mãos mas não nos damos conta é sem dúvida um divisor de águas. Ainda que muitos acreditem estarmos remando contra maré, estarmos comprando uma briga perdida por não conseguirem enxergar uma perspectiva diferente sobre a vida, estamos sim plantando sementes de amor próprio, autovalor, confiança em si e na vida. Se começarmos por nós mesmos, pelo que depende exclusivamente de nós, individualmente, podemos transformar o mundo.
Como vocês têm percebido o resultado desse trabalho terapêutico no público? Recebemos depoimentos, mensagens que dão sentido a toda essa construção. Poder contribuir para que as pessoas reencontrem força para seguir adiante em paz, lidando com os desafios de forma mais amena e serena, com consciência e esperança também nos transforma. É um trabalho de construção pessoal, individual que depende do quanto cada um tomou como verdade essas crenças e do quanto estamos dispostos a olhar para dentro, abrindo espaço para o novo. É uma desconstrução de como nos percebemos para nos tornarmos quem realmente somos.
E como foi que vocês se encontraram e descobriram que juntos daria um bom negócio? A vida se reorganiza quando nos organizamos por dentro. Lei da atração, cocriação é um fato, quer você acredite ou não. O tempo todo estamos construindo nossa vida a partir dos nossos pensamentos e sentimentos. Pensamentos se transformam em sentimentos que se traduzem em hábitos e comportamentos, gerando uma frequência e vibração, a energia que molda a nossa vida. Eu idealizei, escrevi, construi esse encontro, esse trabalho que esta só no início. Nos conhecemos em produção audiovisual. A empresa que gerencia minhas contas/redes sociais contratou a equipe do Oscar, que não por acaso estava presente. Como um quebra cabeças as peças se encaixaram, de lá para cá construímos passo a passo esses projetos transformadores.
Quais os próximos projetos juntos? Estamos desenvolvendo um curso de teatro terapêutico, temos um escopo para um programa de televisão, workshops e rodas de cura com participação ativa dos integrantes.
PARA OSCAR
Como começou seu envolvimento com o cinema? Meu envolvimento com o cinema vem desde criança, como minha família é circense (na era de ouro do circo), meus pais participavam de programas de televisão, comerciais e de algumas produções (inclusive com Os Trapalhões e Beto Carrero), também tinham hábitos noturnos e a televisão era minha companhia. Sempre fui fascinado pela sétima arte e quando me tornei adulto logo busquei por maneiras que me colocassem presente nas produções.
Vindo de uma família circense, que referências e influências teve ao longo da sua vida? Minhas referências profissionais foram sempre de pessoas que cumpriam suas tarefas com muita maestria, pois convivi com excelentes artistas de circo no auge de suas carreiras, artistas de famílias também circenses que até hoje são referência na arte. O que trouxe forte influência foi o trabalho coletivo, pessoas se ajudando sem medir esforços mostrando que quando se trabalha em cooperativa e com amor pelo que se faz, conseguimos com mais ênfase concluir o trabalho.
Diretor ou produtor, como se divide e se realiza entre essas duas funções? O ato de dirigir, para mim tem o significado de poder extrair o melhor de cada ator em suas performances utilizando mais da minha sensibilidade e deixando a criação fluída, já como produtor, não meço esforços para realização das produções e “ponho a mão na massa”. Gosto de participar sempre ativamente de cada processo. Como amo produzir e dirigir, sempre me organizo para ter tempo para ambos.
Qual seu foco e qual a maior dificuldade na hora de descobrir novos talentos? Meu foco sempre foi poder contribuir na mudança de realidade das famílias através da arte, a maior dificuldade em descobrir novos talentos é justamente geográfico e financeiro, o Brasil é muito grande, e gigantesco em talentos, no entanto, nem todas as famílias têm condições para arcar com todas as despesas das quais fazem parte trazer seus filhos até os grandes centros como Rio de Janeiro e São Paulo para que participem de cursos, workshops, seleções e testes.
Na oficina de atores é fácil perceber quem tem talento e disponibilidade real para ser ator? Na oficina de atores isso acontece diariamente, pois os alunos são estimulados e durante o processo de criação da personagem, em uma determinada cena, é nítida a mudança de comportamento, entonação vocal e expressões, nesse momento revelam-se novos talentos. Quanto a disponibilidade, todos são orientados sobre as reais oportunidades e da necessidade de residirem em grandes centros.
PARA NOÉLLI
Já pensou em se aventurar por algumas dessas oficinas de atores? Ou seja, já pensou em atuar? Algumas vezes. Fiz figuração, elenco de apoio por um tempo, sem nenhuma preparação fiz teste para um curso de atores no Rio, mas não passei. Era uma vontade mas não uma prioridade, então nunca levei a diante. Pode ser que a vida esteja me levando de volta para um lugar que meu inconsciente sempre almejou, estou me permitindo.
Para uma terapeuta consciencial a arte é um caminho fácil para um autoconhecimento? Nenhum caminho para o autoconhecimento é fácil, mas é libertador. Poder transformar dor em amor por nós mesmos é o que faz cada dia valer a pena. A arte potencializa esse desprendimento de quem pensamos ser para dar espaço a novas perspectivas. Podemos e deveríamos aprender como contar a história da nossa própria história. Devíamos respeitar o protagonista da nossa história: nós mesmos.
Como foi seu início como terapeuta? Foi algo também pensando num autoconhecimento? Sou paciente da minha própria terapia. Não há nada, nenhum método ou técnica que eu não tenha vivido na minha própria trajetória. Meus desafios me trouxeram até aqui, essa forma de enxergar a vida fez com que me tornasse quem eu sou, com dores, anseios e crenças também vou me lapidando. Conhecermos-nos é um processo constante. Enquanto estivermos por aqui, vivos, humanos, vamos precisar trabalhar nossa evolução pessoal, isso significa cuidar tanto da matéria quanto da espiritualidade. É necessário manter o corpo, a mente e o espírito em equilíbrio.
O que as pessoas mais procuram quando optam por esse tipo de estudo / ajuda? Acolhimento e sentido de vida. Fazemos escolhas pautadas nos papéis que “devemos” cumprir a partir de crenças familiares, sociais e religiosas que determinam nosso padrão de pensamento, sentimento e regem nosso comportamento. Nos perdemos de nós mesmos para nos encaixarmos em mundo que por vezes não faz sentido. Não sabemos por onde começar, por onde seguir, não sabemos do que gostamos, não entendemos o que nos preenche e num ciclo que parece sem fim, desistimos de nós mesmos dia após dia. O autoconhecimento, a consciência de si mesmo é o recomeço, a auto permissão para pensar e sentir. A liberdade de ser você.
Quais os métodos mais aplicados hoje em dia e qual o perfil mais comum de pacientes? Estamos quebrando alguns paradigmas e preconceitos sobre terapia de forma geral. Terapia clínica, holística, integrativa são métodos comuns, necessárias não por estarmos doentes, com um diagnóstico específico, mas por entendermos a necessidade de olharmos para nós mesmos. Chega um momento na vida que precisamos de mais. Construímos família, carreira e bens materiais. Temos tudo e não temos nada, o vazio permanece lá e sequer nos damos conta. Angústia, ansiedade, medo ou apatia são uma sombra diária. Falta sentido de vida. Ecoa dentro de nós: e agora?! Estamos presos em nós mesmos, sem tempo para olharmos para dentro, a autoconfiança se desfaz. Precisamos nos tornar responsáveis por nós mesmos, entendendo quem somos e quem queremos ser. Só assim, com uma nova perspectiva de nós mesmos encontraremos sentido.
Fotos Priscila Nicheli
Styling Samantha Szczerb
Beleza Titto Vidal
Agradecimentos Portinho RJ, powerlook, Aline Vervan, Foxton, Eduardo Guinle