Eli Ferreira encerra essa entrevista com a seguinte frase, “as energias se encontram e se completam”. Ao conhecer melhor a vida e a trajetória de Eli percebemos claramente isso. Desde a época de menina que sonhava com o balé, até os concursos de beleza e sua estreia, de fato na TV, na novela “Tempo de Amar” (Globo). Isso ficou evidente também na história de sua personagem, Tiana, na novela. Uma mulher analfabeta que no final se tornou professora. De personalidade forte, traços delicados e uma vontade de fazer o melhor, seja como cidadã, seja como atriz, Eli vem trilhando o caminho do sucesso colhendo frutos do seu estudo e dedicação. Quem vê essa bela mulher na TV ou acompanha nas redes sociais se encanta, e quando se conhece um pouco mais dessa mulher “arretada” quer tê-la do lado para um bom papo. Foi isso que aconteceu conosco, um belo encontro de energias que se completam.
Sua personagem Tiana em “Tempo de Amar” teve uma bela trajetória durante a trama. Começando como analfabeta e fechando a história como uma professora para crianças. Foi um belo exemplo prático de como a educação faz a diferença no futuro das pessoas. Como você vê essa situação e como foi dar vida a tudo isso na ficção? A educação é a base de tudo. A base do ser humano. É muito cruel saber que algo tão básico e tão rico é negado a milhares de pessoas pelo país afora. Saber que pessoas nasceram, viveram (e ainda vivem) e chegam ao fim da vida sem nunca terem sido alfabetizadas é de uma crueldade sem tamanho. Os índices de analfabetismo caíram sim, mas ainda são muito altos e precisamos de políticas públicas seríssimas para conseguir reverter isso, principalmente nos lugares mais carentes do Nordeste, onde os números são absurdamente altos. Precisamos de providências na saúde, segurança, mas tudo começa pela educação. Poder estar numa obra tão bem feita e poética, e tratar disso com tanto cuidado só me motivou a embarcar cada vez mais na história de Tiana.
Falando na novela, essa foi sua primeira trama onde você participou do começo ao fim. Poderíamos dizer que foi sua estreia de fato nas novelas. Conta pra gente como foi a experiência? Teve um gostinho especial dessa vez? Sim! Podemos dizer que foi minha estreia mesmo, e no fundo, eu sinto que foi assim. Porque só quando se faz parte do elenco fixo é que você participa do início ao fim das preparações, das reuniões, do dia a dia de gravação, ensaio, encontros, blocos de roteiro… Então, vivendo desta forma, teve um gostinho de estreia sim.
Muita gente pode não saber, mas você já participou de dois filmes, fez participações em novelas como “I Love Paraisópolis” e “Império”. Inclusive ao longo de sua carreira, no início de tudo você passou em 1° lugar para a Martins Penna, única escola técnica de teatro gratuita da América Latina. Como foi que isso tudo começou? Eu era modelo, ganhei alguns concursos de beleza, e em um deles uma pessoa me indicou para uma agência de publicidade. Foi daquele momento em diante que comecei a fazer campanhas publicitárias e paralelo a isso, comecei a estudar teatro, interpretação para cinema, oficinas. Tentei me cercar de estudos para conseguir ao máximo extrair o melhor de mim.
Na verdade antes de tudo você pensava em ser bailarina clássica né isso? O que te encanta na dança? Ainda pratica? Eu sonhava em ser bailarina clássica, lembro de muito pequena passar na porta de uma igreja que dava aulas e ver aquelas meninas lindas, com as roupinhas. Mas infelizmente minha família não tinha condições financeiras para eu estudar. Só pude entrar num curso de ballet aos 20 anos, então ficou no sonho mesmo e virou hobbie. Faço um pouquinho de cada e amo!
Em 2010 você foi eleita Miss Belford Roxo. A beleza abriu portas para você? O que esse título te trouxe de positivo? Foi bom durante aquele período para aquele aprendizado. Sempre soube e quis que fosse passageiro mesmo. Eu sempre tive em mente que a beleza poderia sim me abrir portas, mas não as manteria abertas, graça à Deus (risos), então fui estudar, me profissionalizar. Quero (e preciso) estudar até o fim da vida.
Você é uma mulher bonita, culta, com formação profissional e com voz pública graças à visibilidade que a exposição da TV proporciona. Isso te faz sentir mais segurança hoje em dia onde o preconceito e a intolerância existem de todas formas? Não sei se me dá segurança, mas sei que quanto mais exposto e conhecido você vai se tornando, mais responsabilidade vem agregado a isto. Então acho que preciso usar tudo isso com atenção e cuidado, claro, sem deixar de ser eu, sem deixar de colocar minha personalidade, minha “digital” no que falo ou faço. Mas acredito que estamos num momento de muita proximidade do público, cada artista, de alguma forma, representa tantas pessoas.
Então se eu tenho voz, vivência, empatia por algo, e tenho como me comunicar, acho que a responsabilidade é usar pro bem. Mas isso não limita, “anônimos” também tem voz! Sua voz está em casa, no trabalho, na escola, na vizinhança. Pra Lutar contra todos os tipos de preconceito! Racial, social, de gênero; combater a violência, não precisa ser “famoso”, é só exercer a humanidade e usar essa voz com 10 ou 10 milhões de pessoas. O segredo é usar pro bem, independentemente da quantidade de pessoas que você possa alcançar naquele momento.
Se fala muito em empoderamento feminino mas hoje em dia. Porém percebe-se que parte das população feminino no Brasil apela para o vulgar ou se sujeita a tudo para ter um homem que a sustente. A vulgarização feminina vai de uma música, dança até a condição de ter um homem que pague as contas enquanto elas gastam o tempo na academia ou no shopping. É como se uma parte das mulheres lutasse e outra desfizesse tudo que as outras conquistaram. Como você vê isso? Podemos falar de um modo “geral”, das pessoas que se sujeitam a tudo para que paguem as suas contas. Nesse campo tempos homens, mulheres, gays, héteros, jovens, pessoas maduras. Isso jamais será uma particularidade de uma (pequena parte) das mulheres. Eu mesma conheço pouquíssimas. Vivo uma vida completamente oposta a isso, jamais cogitei, nem em sonho, querer que alguém me sustente, mas não estou aqui para apontar o dedo para quem vive dessa forma. Nada disso tira a legitimidade do feminismo. O movimento luta por igualdade de gênero. Se você é um homem que respeita as mulheres e defende que, sim, devemos receber o mesmo salário, por exemplo, quando se exerce a mesma função, você é um homem feminista. O feminismo luta contra desrespeito, abuso, a desigualdade e todas fomos e somos beneficiadas por cada conquista, independentemente da sua escolha em trabalhar, estudar, ser independente ou não.
Sobre as músicas, danças chamadas de vulgares, isso é parte da nossa cultura também. Eu não curto funk, não danço, mas nem por isso tenho o direito de julgar quem dança ou quem vive dele. Quantas pessoas saíram da miséria, ajudam suas comunidades com o que ganham no funk? Se a pessoa vem da favela, não tem auxílio do governo, da sociedade, que bom que esses jovens acharam saídas, viraram cantores, dj’s, dançarinas.
Não serei hipócrita em dizer que não acho pesadas muitas letras de funk, muitas que fazem apologia ao crime, ao estupro, a vulgarização e exposição em excesso do corpo. Acho pesado sim e não apoio! Até porque sabemos que tem outra forma de se cantar funk, de se cantar forró, pagode (sim, temos essas letras ofensivas nesses outros ritmos também), sem ser ofensivo.
E também não vou dizer que não tem uma ou outra música, que mexe comigo. As pessoas apontam, mas grande parte delas dança e no fundo mexe com elas também… Então, no fim das contas, o livre arbítrio prevalece sempre, estamos aqui pra plantar, (somar) e colher, isso não é ótimo!?
Outro dia em sua rede social você desabafou sobre uma cantada machista que recebeu no trânsito. Por que isso ainda acontece? Existe cantada de sucesso? Se sim, qual seria uma? Isso acontece ainda porque ainda existem inúmeros babacas. Essa cultura machista que acha que a mulher além de ser assediada, tem que considerar elogio ser chamada de “deliciosa” e ficar quieta! Não! Não é elogio, não é agradável aonde quer que a mulher esteja. “Delícia”, “Gostosa”, “Cantadas” não são elogios, é assédio. Linda, gata, princesa. Pode parecer, mas ainda não é. E dica para os compulsivos em falar besteira na rua: Quando vir uma mulher e você sentir a mínima vontade de mexer com ela; respira, guarda, e leva pra sua esposa. Pra sua mãe. Pra filha. E elogie a elas quando chegar em casa. Pratique isso, quanto mais você pratica seu elogio em casa, menos você vai exercitar ele na rua. Não posso falar pela maioria, mas pra mim, não existe cantada de sucesso.
Afinal, o que um homem precisa ter ou ser para chamar sua atenção? O que te atrai? Posso dizer sobre como ele não deve ser para nenhuma mulher: machista, egocêntrico, preconceituoso, frio, mal educado. Já é um bom começo pra vida, independentemente da relação (risos).
O que curte para relaxar? O que faz mais a sua cabeça? Passear, ouvir música e ir à praia. Ficar em casa, ir à minha igreja semanalmente. É algo que além de relaxar, é minha necessidade para começar a semana bem, me “recarregar”.
Você parece ter muita personalidade. Como se apresentaria a alguém? Que qualidades exaltaria e que defeitos deixaria de lado? Difícil isso, não gosto de nada que pareça que estou me vendendo, porque a gente não vê ninguém falando dos seus defeitos né?! Mas sobre como sinto que sou e o que pessoas próximas falam sobre mim. Eu sou muito sincera, e se por algum motivo, em alguma ocasião, eu não puder ser sincera, não quero ser diferente disso, então me calo. Eu me acho divertida, sou muito séria, não acho que seja um defeito, mas as vezes acaba sendo porque sobressai mais que minha simpatia. Tenho personalidade muito forte, desde pequena! Eu era a menina das “brigas”, até físicas mesmo, é algo que tenho que estar sempre em processo de “evolução” e buscar o espírito cristão, só Ele mesmo.
Para te conquistar basta… Não existe fórmula, jeito ou o que dizer, existe energia. Energias que se encontram e se completam.
Fotos Márcio Farias
Stylist Marlon Portugal
Beleza Marcio Carvalho
Assist de fotografia Ricardo Nogueira