É dito que cada livro tem a idade certa para ser lido. Também existe uma certa crença que certos gêneros, ao contrario, são dirigidos para públicos de determinada idade. Especificamente, esse filho bastardo da literatura chamado de Fantasia Heróica, que geralmente fica socado nas prateleiras da livraria na seção de “literatura juvenil”. Porém, nem toda a fantasia heroica se resume a Conam, o Bárbaro de Robert E. Howard ou O Senhor dos Anéis, de J.R.R. Tolkien. Existem grandes surpresas no gênero que acabam ficando esquecidas.
Uma destas séries esquecidas que acabou de ser revivida é “Uma Canção de Fogo e Gelo”, cujo primeiro livro, “Um Jogo de Tronos” foi recentemente transformada em série pela HBO, com boa recepção pelas audiências televisivas. Embora o primeiro livro já tenha 20 anos. É coisa de gente grande, em vários níveis, e um livro que nenhum adulto em sã consciência permitiria que seu filho em início de adolescência tivesse na estante.
E depois ele chuta nossos joelhos por trás. Com força. Um dos truques para isto é a forma como escreve. Ao invés de usar o narrador onipresente geralmente usado na literatura, onde podemos ver sentir, e saber tudo que se passa pela cabeça de todos os personagens relevantes da cena, Martin na verdade escreve pelos pontos de vista de personagens específicos, muitas vezes trocando de visão no meio dos acontecimentos. Isto nos sonega informações, algo que Alfred Hitchcock citou a Trouffaut como sendo a alma do suspense. O medo nasce daquilo que não sabemos, ou não conseguimos compreender. Esta sensação de “Que diabo…?” nos segue por boa parte da trama. É como Martin escrevesse os textos em primeira pessoa, e depois refizesse cada capítulo em terceira pessoa mantendo a estrutura básica. “Eu fiz isto” se torna “fulano fez isso” com pensamentos em itálico. Gera-nos a intimidade do romance de primeira pessoa com a ilusão de onipresença do romance de terceira.