ENTREVISTA: MATHEUS VAZ – UM NOVO OLHAR SOBRE A PSICOLOGIA

Com formação em Psicanálise Clínica e Psicologia, Matheus Vaz se viu desafiado durante a pandemia a olhar para saúde mental fora dos estereótipos. E foi com humor e mais identificação com seu público que ele começou a atuar de forma diferenciada. Ele sabia que algumas pessoas não iriam se identificar com seu jeito de ser, trabalhar e a maneira como se comunicava nas redes, mas dentro da sua cartela de pacientes hoje, e pelas pessoas que o seguem, entendeu que a maioria aceita essa liberdade de ser. “Minha identidade é inegociável”, Matheus costuma dizer. Batemos um papo com ele para entender todo esse processo e conhecer um pouco mais da sua trajetória até aqui.

Nas suas redes sociais vê-se que você criou um conteúdo falando de terapia com humor. Como começou esse processo? Durante o período da pandemia eu tive que fechar o consultório e migrar os atendimentos para o meio remoto. Ali foi o início das ideias. Pesquisando na época, vi que ainda tratávamos saúde mental com muito estereótipo e uma seriedade quase que “robótica”, o que por vezes afastava alguns públicos de consumirem e contratarem o acompanhamento, justamente por não verem uma volatilidade na entrega desse conteúdo. Decidi colocar mais de mim mesmo e da maneira que eu entendia que os temas seriam bem absorvidos. O humor conecta pessoas. Adicionar esse humor, linguagem acessível e textos terapêuticos, me pareceu ser uma junção interessante… e foi.

Como psicólogo e psicanalista, você detecta em um paciente um certo “medo” em começar um tratamento? Quase sempre. Mas nem sempre esse medo é exposto. Às vezes, chegam até mim pessoas que já passaram por diversos outros psicólogos, ou até mesmo outros meios terapêuticos e tiveram dificuldade em dar continuidade ao tratamento. Claro que existe a questão da identificação com o profissional, que é extremamente necessária, mas o que acontece é que pode existir uma fuga inconsciente da pessoa quando começamos adentrar em questões mais profundas, com camadas desconhecidas que podem gerar aflição, sentimento de invasão, raiva, tristeza e demais sensações não tão boas. Por isso é comum no “Setting“ terapêutico, paciente que chega com uma demanda específica e depois descobre no decorrer do processo que existem outras coisas que também precisam de tratamento. 

Na sua opinião, a pandemia causou maior ansiedade e depressão principalmente entre os jovens? Muito mais. Além do sentimento de desespero coletivo que assolou as pessoas na época, veio como consequência posterior, a cobrança por produtividade. Pessoas que se comparam com outras que conseguiram se “desenvolver melhor” durante o período de quarentena aumentou consideravelmente. As redes sociais também contribuíram para isso. O que fez com que a frustração passasse a fazer ainda mais parte do cotidiano de algumas pessoas, fazendo com que doenças de cunho mental se expandissem também.

Como avalia a interferência dos pais no uso das redes sociais dos filhos? É importante que esse acompanhamento dos pais estejam em paralelo não somente às redes sociais, mas também com todo tipo de conteúdo que aquela criança ou adolescente consome, seja em filmes, novelas, séries, podcast, etc. Verificar a classificação indicativa é de responsabilidade da família. A rede social pode ser uma ótima aliada, mas é preciso ter cautela.

Você acha que deveria ter uma maior educação voltada para o uso saudável da internet de um modo geral? Eu acho que deveríamos todos questionarmos o conteúdo que estamos recebendo. É muito comum ver pessoas reclamando com uma certa constância em perfis de entretenimento, famosos, criadores de conteúdo… mas a grande questão é: porque seguimos consumindo ou proporcionando engajamento as coisas das quais não compactuamos? Será que temos a mesma frequência de ação nos conteúdos que achamos bons? Porque é mais fácil manusear uma crítica que um elogio? Acredito que todos esses questionamentos são válidos para que possamos lembrar que no fim das contas, somos nós que limitamos e controlamos o que tem sido saudável ou não na internet.

Qual a sua opinião sobre essa “onda de terror” que invadiu as escolas brasileiras? Existem muitas camadas. É complexo falar de um assunto tão delicado de maneira geral, porque cada situação precisa de uma análise crítica aprofundada, mas é interessante justamente levantarmos a questão: investir em educação em nosso país, tem que ser muito além de separar uma verba para estrutura física da escola. É preciso investir na saúde mental das crianças, professores e responsáveis. É importante que a gente comece a debater e exigir psicólogos em toda rede de ensino. Cada aluno/criança/adolescente passa por um processo pessoal em casa, por conta de bullying ou demandas e limitações individuais. Precisamos de profissionais capacitados chegando até essas pessoas que estão em sua formação de ensino e caráter. Esse investimento a curto, médio e longo prazo, com certeza fará bem ao aluno e a todo coletivo.

O modo de atendimento on-line ajuda o paciente a iniciar um tratamento? Com certeza. O atendimento on-line permite que pessoas se conectem de qualquer parte do mundo. Atualmente, 70% dos meus pacientes são brasileiros e brasileiras que moram em outros países. Esse alcance é bem satisfatório.

Como você vê o futuro da psicanálise? Gostaria que cada vez mais o acompanhamento psicanalítico fosse de fácil acesso e sem estereótipos que nos limitam. Existe espaço para todo profissional que é capacitado.

Qual conselho você daria para quem ainda tem alguma dificuldade em começar a fazer terapia? Faça as pazes com seu eu interior. Iniciar o processo terapêutico é complexo sim, precisa de continuidade para ser efetivo e às vezes será muito incômodo ter que lidar com as próprias questões internalizadas, mas se aprofundar no autoconhecimento é libertador em todos os aspectos. O melhor investimento que você pode fazer por você mesmo é ter uma mente saudável. Às vezes vai precisar doer como nunca para não doer nunca mais.

Quais seus próximos projetos? Projetos pra mim são sempre uma caixinha de surpresas. Sempre me surpreendo nesse quesito de reinventar a comunicação, exemplo disso foi a música “já pensou em terapia”, um brega funk que lancei nas plataformas para debatermos sobre comunicação não violenta. É um single divertido que já serviu até para vídeos de pessoas nos reels e no tiktok. Uma amiga comentou: “Qual psicólogo já lançou um brega funk”? Acredito que fui o primeiro. E espero poder continuar entregando muito mais informações para todos, de vários meios e formas e para qualquer lugar do mundo.

Fotos Vinícius Mochizuki

Edição de moda Alê Duprat

Styling Kadu Nunnes

Direção de estúdio Rodrigo Rodrigues

Assessoria de Imprensa Equipe d Comunicação