Leonardo Franco é antes de tudo um amante da independência, da liberdade. E talvez por isso, busque, experimente, mude sem medo. Ator, produtor, dono de teatro, pai, marido, Leonardo trafega muito bem em todos os papeis que lhe cabe, seja na vida, seja na arte. Acredita na busca dos sonhos e o Centro Solar do Botafogo é uma prova disso. Acreditou e realizou. Não é muito dado a grandes eventos, leva uma vida mais regrada como parte da responsabilidade de ser ator. Já caiu, levantou e hoje colhe os frutos de uma carreira honesta e bem construída. Conheça um pouco mais do ator e do homem que tem muita história pra contar.Da psicologia para as artes. Como se deu essa descoberta artística na sua vida? Não sei exatamente quando tudo começou. A maioria dos atores diz que a vocação vem do berço. Não acredito nisto. Na verdade, todas as crianças, umas mais, outras menos, têm este dom – representar. Vivem de ilusões, criam personagens, experimentando na fantasia a vida real que está por vir. Minha primeira experiência teatral foi durante as aulas de história do curso científico, no Colégio Andrews, onde debatíamos no palco, como num julgamento de verdade, as reais motivações de vários personagens históricos. Lembro-me deste professor com carinho. Brilhante, provocador, polêmico, nos instigava, nos fazia pensar. Adam Grzybowski era o seu nome. Quando decidiu abandonar a carreira de professor, tornou-se um dos melhores produtores culturais do Rio de Janeiro. Coincidência? Tenho certeza que não.
Naquele tempo, eu me preparava para a Faculdade de Medicina. Seguiria meus pais na escolha de uma carreira. Cheguei a cursar um período na UFRJ, mas acabei optando pela Psicologia. Acreditava nesta opção. No último ano do curso, no entanto, tudo mudou. Descobri que queria ser ator e fui arrebatado pelo teatro. Tinha 21 anos de idade. Como explicar a mudança? Não sei. Não me recordo do “momento de decisão”. Só sei que as coisas foram mudando, se encaixando, amadurecendo, ficando claras.
Você estreou no teatro com a peça “O Vôo dos Pássaros Selvagens”. O ator é antes de tudo um pássaro sempre em busca de novos céus para voar? O “Vôo” é um lindo texto de Aldomar Conrado, que já tinha sido montado por Camila Amado e Marcus Caruso (grandes intérpretes) e que tive o prazer de representar ao lado de Tamara Taxman, com direção de Rogério Fróes. Neste caso, acho que a escolha do texto e o título da peça refletiam mais a minha ânsia de alçar vôos artísticos consistentes, de criar asas (e coragem) para me atirar, de peito aberto, nos abismos que o teatro cria no coração dos atores. Eu tinha acabado de sair da faculdade de psicologia, com apenas 21 anos de idade, era praticamente minha estreia profissional e já estava me aventurando em duas importantes funções; ator e produtor. Uma experiência que selou definitivamente minha escolha pelo ofício de ator e foi feita de uma forma extremamente romântica e apaixonada.
Você atua e produz. Essa versatilidade é uma necessidade para o ator, até mesmo para proporcionar uma independência? Sim, em minha vida o que sempre busquei foi “independência”, acima de qualquer outra coisa. E é atrás dela que venho correndo durante todos estes anos. Não fui programado para ser ator, não era o que esperavam de mim. Tive de descobrir sozinho, observando, ouvindo e tendo fé, muita fé. Sempre desejei ter domínio sobre minha carreira, ser responsável pelo produto cultural. Acredito no ator-empresário, acredito nas pesquisas de grupo, acredito no teatro como força transformadora, com uma finalidade social e educacional. E acredito que, com as pessoas certas nos lugares certos, podemos ter uma política cultural consistente e responsável.
Dentre as suas várias peças de sucesso, destacamos “A Loba de Rayban”, ao lado da atriz Christiane Torloni. Como foi atuar ao lado de uma mulher que é uma eterna musa nacional? Foi uma imensa satisfação poder caminhar ao lado de Christiane Torloni. Desde o primeiro momento em que a conheci, não parei de receber lições de vida e de arte. Forte, talentosa, corajosa, vibrante, é uma das poucas mulheres brasileiras, que atua com desenvoltura em qualquer esfera da vida nacional. Dentre várias paixões comuns, descobrimos a necessidade soberana de montar A LOBA de RAY-BAN, versão feminina de O LOBO DE RAY-BAN de Renato Borghi, que fizemos ao lado do grande Raul Cortez, e que tanto marcou nossas carreiras. Nas duas montagens fomos dirigidos pelo mais que talentoso José Possi Neto.
O Centro Cultural Solar do Botafogo é um sonho realizado? Quais os planos para este ano ainda? Sonhar é uma prerrogativa do ser humano. A capacidade de perseguir o seu sonho e transformá-lo em realidade, no entanto, é privilégio de poucos. O Solar de Botafogo é a materialização de um sonho acalentado por anos a fio e que, até para os amigos mais íntimos, soava como uma utopia: o desejo de ter o meu próprio teatro. Em 4 de julho de 2001 consegui arrematar o casarão da Rua General Polidoro, 180 e dei o pontapé inicial para esta grande aventura. O primeiro projeto teatral, lançado em 31 de janeiro de 2007 e que inaugurou o Teatro Solar, foi o espetáculo “CAMPO DE PROVAS” de Aimar Labaki, dirigido por Gilberto Gawronski e com Leonardo Franco, Guilhermina Guinle e Marcos Winter no elenco. O projeto foi patrocinado pela ELETROBRÁS e pela HALLIBURTON e indicado ao Prêmio SHELL na categoria melhor autor.Considera-se um privilegiado por viver de arte, ter seu próprio teatro e participar de grandes e boas produções? “A gente é, o que a gente quer ser”. Quando finalmente vislumbrei o meu caminho, entendi que deveria me apossar de minhas escolhas e a maior delas era TER O PRÓPRIO TEATRO. Não posso me queixar. Sou um privilegiado. Passei por dificuldades tremendas nestes 25 anos de carreira, mas descobri uma fórmula para realizar meu maior desejo profissional e estou tendo sucesso. A questão primordial, no meu caso como falei anteriormente, é que sempre desejei ter domínio sobre minha carreira. Não depositei em ninguém a responsabilidade por minha realização pessoal, pois isto é a maior desculpa para a imobilidade. É a velha máxima (ampliada): “Apoio, patrocínio, sucesso e reconhecimento só vem antes de trabalho no dicionário”.
Estrear uma séria (Preamar)na HBO é de grande importância na sua carreira? Fazer parte do primeiro projeto longo de ficção da Pindorama dá uma adrenalina de responsabilidade? Um dia ouvi uma palestra do Hugo Carvana em que ele dizia: “faça teatro sempre, com toda dedicação e tenha um pouco de paciência, pois se você for realmente bom, a televisão e o cinema vão te achar”. Pois foi isto que ocorreu. Desde que inaugurei o Solar de Botafogo, tive tranquilidade para realizar ininterruptamente uma série de bons trabalhos em teatro e foi por causa de um destes trabalhos (ou da junção de todos os bons resultados) que me chamaram para protagonizar PREAMAR. Sim, posso dizer que PREAMAR foi o trabalho mais importante de minha carreira. Para qualquer ator é uma honra ser escolhido e contar com a confiança de uma empresa como a HBO, que é mundialmente respeitada pela qualidade de suas produções e pela consistência de sua programação. É claro que o talento do diretor Estevão Ciavatta, com uma direção segura e sensível, foi fundamental para atingirmos este belíssimo resultado. E vale ressaltar, que o trabalho que ele, e seus parceiros, vêm fazendo na Pindorama é exemplar e já pode ser considerado um patrimônio audiovisual brasileiro.
Seu escritório é na pra praia? (risos). A história do seu personagem na série (HBO) Preamar o fez refletir sobre algo da sua vida? Sempre que falo e lembro-me de Velasco, penso numa famosa frase de Saramago: “Para conhecer as coisas há de dar-lhes a volta.” A vida não é uma coisa só e não devemos vivê-la apenas sob um ponto de vista e com um único propósito. Velasco se transformou num escravo de sua imagem e seu ideal era ganhar dinheiro. Viver assim, nunca dá certo. Leonardo quer que sua imagem seja de um homem feliz e múltiplo, com tempo para o lazer, o trabalho, cuidando da saúde e passando o máximo de tempo possível com a família.
O Rio de Janeiro é uma cidade de contrastes que coexistem ou não? Com certeza é uma cidade de contrastes e a nossa belíssima geografia é o maior motivo para esta incrível babel de sotaques e raças. Durante a preparação para a série visitei todo tipo de locação e me convenci, definitivamente, que os cariocas da gema ou os de coração querem interagir e conviver pacificamente.
A história de Velasco, seu personagem em Preamar, é a história de muitos cariocas por conta da crise financeira de 2008? Para os leigos, que não tem costume de aplicar as economias em grandes fundos de investimento, é difícil ter a percepção exata do que a crise significou, mas basta fazer uma simples comparação; diariamente somos atraídos por armadilhas semelhantes e nem sempre menos catastróficas. Aquele carro financiado em inúmeras vezes que terá de ser devolvido ou as compras exageradas que colocam muitos brasileiros diante da necessidade de usar o cheque especial ou crédito rotativo do cartão de crédito nada têm de fraude, mas são situações igualmente apresentadas como ótimas e fantásticas para os bolsos de nossos cidadãos. Todo cuidado é pouco.
Já passou por alguma situação em que perdeu e precisou reunir forças para reconquistar? Com certeza. Já tive problema com cartões de crédito e já perdi dois carros para pagar dividas de produções teatrais que não foram lucrativas. O jeito foi continuar persistindo até recuperar o investimento.
E como é a vida fora das telas e palcos? O que o diverte, emociona e o deixa indignado? Levo uma vida muito regrada, pois o meu trabalho requer sempre que se esteja preparado fisicamente. Tenho aulas de ginástica e canto, estou permanentemente preocupado com a alimentação e duas vezes por ano faço um check-up completo. A administração do Solar de Botafogo também me toma muito tempo, pois para que a máquina funcione, é necessária uma manutenção permanente de toda estrutura física e técnica da casa. Um trabalhão, mas que me dá imenso prazer! O que me diverte é o convívio com a família. Adoro sair com minha Mulher e as crianças, filhos e sobrinhos, para almoços na casa de meu Pai e minha Mãe. O que mais me emociona é ver o crescimento e o desenvolvimento emocional de Valentina. Ela está cheia de questionamentos e tem-me dito tantas coisas maravilhosas que às vezes sinto que meu coração vai explodir. Como podem crescer tão rápido e nos manter apaixonados pelo resto de nossas vidas??! Como podem fazer tantas perguntas e como conseguiremos dar tantas respostas? Diante desta experiência de paternidade feliz, só posso ressaltar minha indignação pelo abandono e descuido com tantas crianças. É estarrecedor o que se vê nos jornais e TVs. Não podemos permitir.
O que uma mulher faz que te deixa desconcertado? O que te encanta nelas? Desde o primeiro instante, os olhos de minha mulher me encantaram e me deixaram hipnotizado, mas em seguida descobri a sua profunda generosidade e aí sim, fiquei totalmente desconcertado. A vida só é bela com generosidade e gentileza.
O que os homens ainda não sabem sobre as mulheres? Você já descobriu algo? E o que aprendeu com elas? Os homens (e mulheres) sabem pouco sobre quase tudo. As descobertas estão sendo sempre revistas e reformuladas. Hoje cedo baixei mais de 200 novas atualizações para o meu moderno iPhone 4, que em breve já vai estar obsoleto. Vivemos neste mundo que muda o tempo todo. O que ainda não sei sobre as mulheres?? Não sei quase nada!! (risos) É claro que imagino ter descoberto algo, mas no segundo seguinte parece que já não é mais aquilo! Com certeza aprendo a cada instante com todas elas; Mãe, mulher, filha, companheira de trabalho, funcionária, etc. Mas tentando resumir, pois a questão simples (e não é novidade); quando achamos que sabemos as respostas; as perguntas mudam!! E em se tratando das mulheres; perguntas e respostas mudam com uma velocidade espantosa!! (risos)
Ser pai novamente e em uma fase mais madura da vida, te provoca o que? A primeira palavra que vêm a minha cabeça é ESPERANÇA! Todos os meus compromissos de felicidade comigo mesmo e com o mundo estão sendo renovados! Agora, um pouco mais velho e experiente vivo uma nova e inesperada felicidade. Estou recebendo a dádiva de ser Pai de outra menina, que já chega perfumando os meus sonhos. Maria Flor é filha de um grande amor e, tal qual sua Mãe, chega inundando meu coração de paz e azul. Se alguma coisa ainda me faltava, agora não falta mais. Estou tranquilo e certo de minhas escolhas. Eu não tenho a menor duvida; os homens engravidam também! Principalmente os de primeira viagem! Eu vivi intensamente a minha primeira gravidez. Estive presente em todos os momentos. Fiz diversos cursos para pais, fui aos exames, às ultras, participei de todo pré-natal e quando minha primeira filha nasceu, percebi que toda a preparação e empenho valeram à pena. Sentia-me seguro para entender e atender a todas as necessidades de Valentina e naquele momento isto foi primordial.
Quais seus planos daqui para frente? Continuar apostando em minhas idéias e tentar colaborar para o desenvolvimento sócio-cultural de minha cidade e de meu país. Estou me envolvendo em uma série de projetos sociais que visão o bem estar da comunidade. Quero abrir as portas de meu centro cultural para realizadores de todas as idades e utilizar minha força empreendedora para ajudar no desenvolvimento da nossa política cultural. Os artistas estão sempre à beira do abismo. Não basta ter as pessoas certas nos lugares certos, sem uma política cultural criteriosa e responsável. Temos bons dirigentes, mas não temos planejamento básico, estratégico, que é claro que está vinculado a um orçamento mais generoso, mas que depende principalmente de vontade política. Só que a vontade política não deve apenas aumentar o orçamento (principalmente em tempos de eleição), mas planejar o que fazer com este orçamento. Estou pronto a ajudar e “
estar preparado é tudo” (W. Shakespeare em HAMLET).
Fotos: Sérgio Santoian
Assis. fotografia: David Zoega
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