Escolhido pela fotografia este mestre das lentes recifense de olhar atento e aguçado ao mundo à sua volta, despertou em si o desejo de traduzir e poetizar o cotidiano através de imagens ainda muito cedo. Com apenas 16 anos começou a desenvolver a linguagem da fotografia e em meados dos anos 90 esse se tornou de fato seu universo, sua profissão. “Sempre fui um apaixonado pelo cinema e pela vontade de contar histórias e de reinventar a realidade, daí a fotografia foi o caminho e a linguagem em que apostei para viver tudo isso.”
Em entrevista exclusiva à MENSCH, Renato Filho contou que tem como grande inspiração a figura humana, que busca retratar pessoas de forma única, com uma leitura diferenciada, que unida à possibilidade de reinventar a realidade, tornaram-se suas maiores paixões. “A fotografia se tornou cúmplice da minha angústia existencial.” Em seu processo de criação, bem ao seu estilo de vida, tudo flui de forma natural, livre e criativa, e afirma “Não costumo buscar referências, as ideias pulam da minha cabeça (risos).” Ressaltou ainda que é muito democrático no desenvolvimento dos projetos, busca sempre estar atento às ideias e colocações de sua equipe, exigindo o máximo da capacidade profissional de cada um, “Quero sempre o melhor que eles tenham para dar.” Apaixonado pelas possibilidades que a fotografia proporciona, construiu uma carreira de sucesso criando personagens e universos singulares, com uma assinatura autoral reconhecida e respeitada no mercado, principalmente o da publicidade e o da moda.
Como todo artista, Renato Filho sente na pele os desafios de se produzir cultura no Brasil, ainda mais quando as publicações primam pela excelência, mas ele usa esses desafios como combustível empreendedor em seu processo criativo. “Produzir cultura no Brasil é um ato de coragem, mas adoro desafios e o calendário está em sua décima segunda edição.” O calendário a que ele se refere nasceu do desejo de vivenciar temas e estéticas que a moda e a publicidade não permitem. O idealizador do projeto foi o publicitário e apresentador Arlindo Grund, quando perguntado se havia aceitado o desafio de primeira, respondeu “Abracei a ideia e percebi logo que tinha um grande projeto nas mãos, mas confesso que me surpreende em vê o caminho lindo e premiado que essa peça trilhou.” Ele afirma que a produção dos calendários é sempre um parto, não só pelos custos, mais também pelo processo de construção das imagens, que demanda tempo e um investimento alto. Os temas, segundo ele, são escolhidos a partir do que lhe instiga, do que é interessante no cenário da vida naquele momento ou a partir de uma estética que esteja desejando vivenciar. Em 2013, para celebrar os 10 anos do calendário, foi lançado um livro comemorativo com produção executiva de Keila Vieira. “Tenho tido muita sorte de ter pessoas disponíveis para realizar meus sonhos.”
O calendário de 2015, a 12ª edição chama-se EROTIC, mal saiu do forno e já esta “causando” no mercado. Projeto autoral forte, polêmico, transgressor e muito sexy, aborda em suas 12 imagens, em forma de arte, a temática do erotismo, do sadomasoquismo, do fetiche, com um glamour, requinte e bom gosto que “da gosto de ver”! Destacou que o equilíbrio entre ousadia e elegância nas imagens de nudez foi um dos maiores desafios, por ser um tema muito falado e registrado, “Problema resolvido com doses de bom gosto, senso estético e desejo de não ser gratuito e de não buscar a polêmica pela polêmica. Quero falar e registrar esse assunto com responsabilidade, coerência e com um profundo senso estético.” A equipe composta por nomes consagrados do mercado como o styling Nestor Mádenes, a produtora Ivonalda Gaião, o estilista Pietro Tales, beleza Laercio AZ e Raphael Ramos, a musa Karina Silva e os modelos da Amazing Models, foram os responsáveis por tornar os sonhos do fotógrafo em realidade. “Acho que esse reboliço vem das escolhas estéticas que eu e minha equipe fizemos, acho que mercado está muito careta e ao mesmo tempo carente de uma estética mais descolada do convencional, do estabelecido.”
Sobre o processo criativo do EROTIC, ele contou que as ideias surgiram de todos os lados, da vivência pessoal, dos desejos e de uma vasta pesquisa comportamental da sociedade, Ele cita que durante o processo de criação da peça conheceu seu erotismo um pouco mais, “Tinha fetiches que nem conhecia.” afirmou. Ao ser questionado sobre musas inspiradoras para o EROTIC ele declarou “Madonna sempre será uma grande inspiração e estará presente nos meus trabalhos, porque bebemos das mesmas fontes estéticas, tudo que ela faz visualmente me instiga e me diz muito. Fiz várias imagens para esse calendário ouvindo a rainha! Acho que só no futuro o mundo vai perceber de uma forma mais ampla a artista Madonna, a ativista política e a cidadã.”
Renato trabalhou o erotismo explorando toda as suas possibilidades dentro de uma estética sonhada, do seu, em francês, érotisme. Segundo o dicionário Aurélio erotismo pode ser: qualidade do que é erótico, manifestação explícita da sexualidade, grau de excitação ou de prazer sexual. O erotismo é o que estímula de forma sexual sem apresentar o sexo em forma explícita. Erotismo é mais que um estado de excitação sexual, é também uma exaltação ao sexo que pode ser através das artes como cinema, fotografia, literatura, entre outras. O erotismo vem sendo registrado na história há muito tempo. As primeiras representações artísticas de clara intenção erótica foram realizadas pelos Gregos e Romanos. Dentro das linhas estéticas possíveis a serem trabalhadas no erotismo, a escolhida por Renato no EROTIC foi o universo do sadomasoquismo, este pode ser entendido como a junção de duas tendências sexuais diferentes – o sadismo e o masoquismo, termos criados pelo psiquiatra austríaco Richard Freiherr von Krafft-Ebing no livro Psychopathia Sexualis, de 1886. O sadomasoquismo é caracterizado pelo uso de uma série de objetos como algemas, coleiras, mordaças, cintos de castidade, pircens, entre outros e técnicas de se obter prazer sexual através da dor, as mais utilizadas são bondage, técnica em que o submisso é amarrado ou imobilizado e spanking onde o dominador bate no submisso.
Ao trabalhar sob temática tão polêmica e carregada de tabu, perguntado se ainda há muito pré-conceito com esse tipo de arte fotográfica, o por que da escolha do tema e se a produção desse calendário tinha sido mais problemática que os temas anteriores, Renato Filho afirmou que “o preconceito está presente culturalmente na sociedade.” Citou ainda que através de projetos como esse é que se consegue falar, mexer e alterar comportamentos e preconceitos, buscando uma atitude positiva no que se refere ao tema. Segundo ele, esse calendário foi o mais complicado de se produzir, não só em relação ao financiamento, ou à construção das imagens, mas também em relação ao casting, “nenhuma modelo aceitou fazer as fotos a não ser minha musa Karina Silva, que com profissionalismo, beleza e talento me ajudou a realizar as imagens.” Já os modelos masculinos só toparam fazer o trabalho se não aparecesse o rosto e usando nomes fictícios nos créditos. “O desejo de tocar em um assunto tabu, foi o impulso inicial. Fiz uma pesquisa grande em torno do assunto e vi o quanto o erotismo é um assunto pessoal, que traduz a cultura de um povo, que traz à tona o que você acredita e como você vê a vida. O que é erotismo para um, é repulsa para outros.”
O calendário é a primeira ação da exposição que Renato Filho fará sobre a temática, prevista para julho deste ano na Galeria Janete Costa, localizada no Parque D. Lindu, Boa Viagem. Renato explica que ainda haverá outros conceitos que serão trabalhados até lá, tendo como grande desafio falar da complexa sexualidade humana, “acho que o tema é muito vasto para trabalhar um único conceito. Por isso, vamos lançar mão de várias ideias. No caso específico desse calendário, buscamos falar do universo Sado.” Então, fiquem espertos que ainda vem muita provocação aos sentidos em forma de arte por aí!