CAPA: JULIANO CAZARRÉ – UM HOMEM CONTEMPORÂNEO, FORTE SEM PERDER A DELICADEZA

 

Conversar com o ator Juliano Cazarré é sempre um prazer. Aquele tipo de papo que você não quer que acabe, onde um assunto vai puxando outro e quando você percebe já se foram algumas horas de conversa. Foi assim em 2015 quando ele foi capa da nossa edição de 5 anos, e foi assim agora para essa nova capa. Atualmente interpretando o Magno em “Amor de Mãe”, Cazarré é um belo exemplo de “macho alpha” atualizado, com todos o upgrades atualizados. Onde sabe o papel do homem na família, sociedade e atuando ao lado da mulher para fazer um mundo melhor, ter relações melhores e criar melhor os filhos. Forte sem perder a delicadeza, Cazarré discute com cuidado sobre assuntos como feminismo, machismo, amor entre amigos e a educação dos filhos. Sem papas na língua, ele faz da entrevista um belo ensinamento de como conviver é nossa mais árdua tarefa. O resultado você confere abaixo. Esperamos que não demore muito para uma nova capa, um bom papo tem disso, você sempre quer um pouco mais.

Juliano nosso último papo foi em 2015 onde falamos dentre outras coisas sobre empoderamento feminino e machismo. Cinco anos depois você consegue ver alguma evolução ou mudança? De 2015 pra cá, eu mudei muito. Eu venho estudando sem parar, filosofia, teologia, economia, política e as minhas ideias foram mudando bastante e foram se encaixando. Eu fui descobrindo autores que falavam coisas que eu, inclusive, já pressentia quando eu estava na época universidade. Autores que me foram negados na universidade brasileira, que tem um viés muito claro e que deixa de fora tudo o que não concorda com esse viés. Então, de lá pra cá, meu ponto de vista mudou muito sobre muitas coisas, inclusive sobre esses assuntos, machismo e feminismo. Eu acho que tem gente querendo criar uma divisão que não existe, querendo colocar homens e mulheres em polos opostos. Acho que existe um grupo ideológico que passa o tempo inteiro querendo falar que homens são inimigos de mulheres, que héteros são inimigos de homossexuais, que brancos são inimigos de negros, que os empresários são inimigos dos empregados… E eu acho que isso é uma invenção ideológica. Que, por mais que possam existir conflitos em todos esses casos, via de regra a humanidade tem trabalhado muito mais junta do que contra. Acho que esses grupos cooperam muito mais entre si do que se digladiam. Acho que homens e mulheres cooperaram muito para que a gente tenha a sociedade que a gente tem, principalmente no ocidente, sociedades prósperas, onde tem água, luz, comida, onde as coisas funcionam, as estradas funcionam, etc. Claro que nada está perfeito e, certamente, nunca chegaremos à perfeição. Ao contrário do que uma galera promete “se você votar no meu grupo, um dia vou te entregar a sociedade perfeita, sem classes, aonde todos serão iguais”. Isso é mentira. Essa sociedade nunca vai existir. Sempre teremos conflitos, mas a humanidade vem trabalhando de mãos dadas e vem evoluindo muito, principalmente no ocidente. Então, eu acho que existe um certo exagero aí de uma galera que quer promover a discórdia em vez de continuar no caminho de evolução em que a gente vinha desde a Grécia.

Mesmo com toda essa discussão cada vez mais em voga, masculinidade e machismo estão sendo misturado e muita gente já não sabe o limite de um e do outro. Como você enxerga isso? Eu acho que tem um movimento absurdo que fica falando que toda masculinidade é tóxica. Que a própria masculinidade é toxica, em si. Que todo homem é um estuprador em potencial. Que todo homem é um opressor das mulheres. Que a gravidez é uma forma de opressão, que o orgasmo feminino é uma opressão… E é um completo absurdo. Dá até uma preguiça de explicar porque é absurdo, pois me parece auto-evidente. Mas, é isso, estão querendo promover os homens a vilões e isso tem resultados muito ruins pra todos. Para os homens, para as mulheres, para as crianças, para a sociedade como um todo, porque a gente precisa do masculino e a gente precisa do feminino. A gente precisa que essas forças estejam equilibradas na sociedade. E tem muito homem confuso, sem rumo, sem saber o que fazer, achando que qualquer coisa que ele fizer está errado, pois só o fato dele ser homem já faz dele um ser errado. Então acho que tem uma grande confusão, mas é uma confusão que está sendo construída de uma maneira pensada, arquitetada. Tem gente que quer construir essa confusão, que quer os homens em dúvida, quer os homens fracos, quer os homens pedindo perdão por terem nascido, pois assim fica muito mais fácil de dominá-los, de controlá-los, de dizer o que eles têm que fazer, como devem pensar e em quem eles têm que votar.

Nesse ponto os gorilas são mais bem resolvidos que os homens? (lembrando o fato que gerou polêmica nas redes sociais quando você citou os gorilas que protegem e cuidam da família) Eu não acho que os gorilas são mais bem resolvidos que os homens. Eu postei aquele vídeo do gorila porque esses mesmos grupos ideológicos falam que qualquer masculinidade e qualquer feminilidade são uma construção social. E o que eu mostro ali é que um animal, do qual a gente já se separou há milhões de anos, o gorila, é capaz de comportamentos masculinos. E ele não construiu aquele comportamento masculino, de proteger a família dele ao atravessar a rua, ele não construiu socialmente aquilo. Nasceu com ele. Hoje em dia eu vejo coisas absurdas, do tipo mães dizerem para os filhos que pênis é uma construção social. Mas o menino olha para o pênis e o pênis tá lá, ninguém construiu, ele nasceu daquele jeito. E assim, a gente vai confundindo a cabeça das crianças com coisas que não são muito naturais, sabe? Então, se nós temos impulsos masculinos na gente, os homens têm impulsos masculinos dentro deles, que são impulsos que vêm de nossa ancestralidade, e de nossa genética. Não foram construídos socialmente. Essa era a coisa do gorila. Agora, não tem como um gorila ser mais resolvido do que um ser humano, porque o gorila não tem nada pra resolver. Tudo do gorila já está resolvido. Se ele tiver comida, ele come. Se ele tiver uma fêmea, ele vai reproduzir e vai cuidar da família dele. E aí, pronto, ele já atingiu o máximo do que um gorila pode e deve atingir. O ser humano não. O ser humano, tem comida, tem uma casa, tem uma família, às vezes tem até fama e fortuna, mas ainda falta um sentido, falta uma coisa maior. Então acho que o gorila não tem nada pra resolver e o ser humano, por excelência, é um animal que nunca está plenamente resolvido. Estamos sempre buscando uma coisa e vamos buscar até o dia de nossa morte.

Existe muito exagero hoje em dia e tudo é policiado nas redes sociais. O mundo está mais chato ou as pessoas? Claro que são as pessoas. O mundo não tem culpa de nada. A existência está aí e ela é maravilhosa, é um grande milagre que o mundo exista. E é um milagre maior ainda que a gente exista no mundo. Que a gente tenha, não apenas uma vida como os gorilas ou as plantas, mas uma vida consciente. A gente raciocina sobre as coisas. A gente tenta achar sentindo nelas e constrói sentido, de uma maneira voluntária e livre. A maior liberdade possível é você escolher a pessoa com quem você quer casar e ter filhos. E aí você se integra na realidade, você se ancora na realidade a partir de coisas que você decidiu fazer, a partir de sua liberdade e de seu livre arbítrio. Então, o mundo é isso, está aí, continua sendo o que sempre foi. Quem está mais chato são as pessoas, que estão dizendo qual cabelo que você pode usar, qual roupa você pode usar, qual fantasia que você pode sair no carnaval, o que você pode falar, o que você pode comer. Se tiver uma mulher na sala você não pode falar, porque aí você não tem lugar de fala, você é homem, você não pode falar sobre gravidez ou sobre parto ou sobre aborto, entendeu? Esse tipo de chatice. E eu acho que é difícil pra mim, eu pago um preço alto na minha profissão por ser um cara que me coloco contra essas patrulhas ideológicas. Mas, eu acho que chega. Está na hora da dizer: o rei está nu, chega de ser chato, você não vai mandar na minha fantasia de carnaval, não vai mandar no meu cabelo, na minha trança, não vai mandar na minha barba, não vai mandar no que eu falo, não vai mandar no meu pensamento, sabe? A liberdade de expressão tem que ser plena e total para todos. É só assim que a gente evolui, com todo mundo podendo falar tudo, inclusive as coisas mais absurdas.

Para você, o quanto a presença paterna é importante na família? E quando isso não é possível, qual o melhor caminho? A presença paterna é fundamental, assim como a materna é fundamental. A gente tem diferenças biológicas. As mães carregam no ventre, e pra mim essa é a maior glória, a coisa mais linda que existe, é você poder gerar dentro de você uma nova vida e amamentá-la. Ou seja, você nutre a partir de você, de seu próprio corpo. Pra mim, não tem nada mais bonito do que isso. Mas isso tem que ser feito em parceria. Eu sempre falo que família é a melhor estratégia que a humanidade encontrou para lidar com as adversidades. E esse balanço entre o masculino e feminino é fundamental. Os pais demoram um pouco mais, em geral, para “cair a ficha”, a mulher já está lá durante nove meses sentindo as mudanças e o homem não, então ele se aproxima aos poucos. No começo o bebê quer muito mais a mãe, mas a gente tem que fazer um esforço, de ir entrando na vida de nossos filhos, de ir nos mostrando presentes, porque pra mim é nítido que o abraço do pai e o abraço da mãe transmitem coisas diferentes e ambos são fundamentais. Hoje em dia, infelizmente, mais do que algumas décadas atrás, tem muito homem abandonando a família. Eu acho que isso já é um efeito deletério de todo esse movimento de destruição da masculinidade, destruição da ideia e da imagem do homem. Então, os homens pensam assim “qualquer coisa que eu faça não vai fazer diferença, então não vou fazer nada, sabe?” Tem homens muito infantilizados, que nunca saíram da casa dos pais, homens que nunca assumem compromissos, que abandonam suas famílias.

Acho que a minha luta é justamente contra isso. Para que mais homens construam famílias e fiquem com elas, para que estejam juntos aos seus filhos, que contem uma história na hora de dormir, que levem pra jogar futebol, participem das festinhas da escola, dêem a janta… E quando falta a presença paterna, é muito ruim. Claro que quando falta presença materna, também é muito ruim. Meu pai perdeu a mãe dele aos nove anos. Foi péssimo pra ele e isso tem consequências na vida dele até hoje, mas, ninguém disse pra nós que a vida ia ser perfeita e tudo ia dar certo. Essa é uma das lições que a gente aprende em qualquer religião séria. Coisas ruins acontecem, mas a gente tem que seguir com força e coragem, como quando um pai morre por exemplo. Isso sempre aconteceu na história da humanidade, porque quem vai pra guerra são os homens e muitas vezes o pai morria na guerra. Ou quando um pai sai pra comprar cigarro e não volta nunca mais, e larga toda essa responsabilidade nas costas da mãe, da mulher. As mulheres sempre foram fortíssimas e heroínas e criam seus filhos sozinhas. Mas, a falta de uma figura masculina pode ser ruim, para o menino, principalmente. Então, nesse sentido, o que eu vejo sempre muita gente indicando é procurar colocar o menino em atividades onde ele vai ter contato com outros meninos, para que os meninos possam, juntos, irem se desafiando, competindo entre si, na competição saudável dos esportes, por exemplo. Onde, de preferência, ele possa ter um mestre que seja homem, um professor de judô, um professor de jiu-jitsu, um professor de música, para quem o menino vai olhar e possa ter uma ideia do homem que ele pode vir a ser. Isso não vai diminuir em nada o vínculo que ele tem com a mãe. A mãe vai continuar sendo sempre esse nosso vínculo principal. Mas os meninos precisam também romper o vínculo com a mãe. Isso é parte da tarefa da masculinidade. Isso é uma coisa que um pai precisa ensinar para o filho, que chega uma hora de romper com a mãe e sair pro mundo. Não é romper e parar de falar, romper e parar de amar. As meninas, por exemplo, um dia menstruam, ou até hoje muitas ainda passam por uma festa de debutante. Isso é um rito de passagem. E nós não temos mais ritos de passagem masculinos, sabe? A gente não está mais numa sociedade indígena onde o menino tem que sair e caçar um animal ou tomar picada de uma formiga venenosa para provar que ele agora é parte da comunidade dos homens. Então, como a gente faz esse rito de passagem, que é fundamental e sempre existiu na humanidade, hoje em dia, em tempos modernos? Pode ser pegar uma faixa preta, chegar na faixa marrom, pode ser aprendendo a tocar um instrumento, pode ser sair de casa, entrar na faculdade, morar sozinho, morar com amigos. Acho que a gente tem que voltar a criar homens mais fortes, saudáveis e competitivos. Isso não tem nada a ver com orientação sexual. Não estou falando que todo homem tem que ser hétero, longe de mim. Eu amo meus amigos gays e tá tudo certo. Em nenhum momento estou falando sobre opção sexual. Estou falando sobre você ser um homem capaz, independente e – por que não? – viril.

Independentemente de orientação sexual, educação ou referência, a masculinidade vem de onde? Acho que já respondi um pouco ao longo das outras perguntas. Mas, eu acho que a masculinidade vem de nossa ancestralidade. De coisas e comportamentos arquetípicos, que são comportamentos que se perdem na noite do tempo. Então você vê, está lá na bíblia, nos contos de fadas, nos mitos. E vem também, claro, da convivência porque é lógico que essa masculinidade vem sendo carregada, essa tocha vem sendo passada pelos nossos ancestrais pra nossos bisavós, avós, nossos pais e pra nós. E eu acho que a gente tem que seguir passando essa tocha adiante. Vejo que a masculinidade vem um pouco da família, da ancestralidade e vem também da genética. Porque hoje em dia já está claro pelos estudos que bebês do sexo feminino e bebês do sexo masculinos já nascem com comportamentos diferentes. Isso, devido à carga hormonal que eles recebem já no ventre. Os homens já vem sendo bombardeados por testosterona, pré-natal. E é por isso que bebês do sexo masculinos tem uma maior propensão para olhar mais para objetos e movimentos. E bebês do sexo femininos observam mais rostos, pois elas ancestralmente ficaram mais naquele coletivo de mulheres ao longo do dia, realizando as tarefas. Então elas ficam se olhando, entendendo sentimentos, entendendo o que uma tá querendo dizer, o que está sentindo. E as meninas vem aprendendo isso desde que nascem, de uma maneira muito natural. E os homens, saem pra caçar. Então estão falando sobre motores, sobre carro, sobre lanças, sobre flechas. Então é um olhar mais pra fora. E as mulheres um olhar mais voltado pra dentro. É claro que isso são médias observáveis em pesquisas. Obviamente que vão existir engenheiras mulheres, pilotas mulheres, caçadoras mulheres. E vão existir homens que são mais autocentrados, reflexivos e interiorizados. Mas o fato é que recebemos desde que estamos sendo gerados, a influência dos hormônios de cada gênero. Então, a masculinidade também vem daí.

Você é pai de três filhos, que educação você e Letícia (esposa) procuram dar para eles? Vocês dividem as atividades de quem faz o quê? A gente tentar dar uma boa educação. A gente tenta dar uma educação para que eles sejam honestos, verdadeiros, gentis. A gente se preocupa muito também que eles tenham uma boa educação escolar. Trocamos muitas vezes eles de escola, até achar uma escola em que a gente acreditasse. É um processo difícil hoje em dia. A educação brasileira, até mesmo nas escolas particulares, sofreu muito ao longo de muitas décadas. Então, a nossa educação é muito fraca no Brasil. O número de analfabetos funcionais com diploma universitário é assustador. Então, isso é uma coisa que me preocupa muito. Tento dar uma educação literária para meus filhos, eu sempre leio pra eles, há muitos anos, desde que eles nasceram. Vou lendo e explicando as histórias, e mostrando que nessas histórias antigas existem conhecimentos que a gente não pode perder. Tem conhecimentos fundamentais no Pinóquio, nos contos de fadas, nos mitos gregos, nas histórias da bíblia, e eu me preocupo muito com isso. Eu e a Letícia dividimos muito as tarefas. A gente divide e, assim, é uma divisão que pode variar. Eu agora, por exemplo, estou na novela então eu tento levar eles na escola de manhã, porque dificilmente eu vou ter tempo no final do dia para buscá-los. A Letícia é a pessoa que sabe mais dos materiais escolares deles, da mochila. Eu, já sou o cara que faz mais as compras da casa. Eu gosto de cozinhar. Então, entendo um pouco melhor o que tem que ter na cozinha. A Letícia cuida de todas as burocracias, dos impostos e de mais tanta coisa que eu nem poderia listar aqui. E eu faço sempre questão de agradecer muito a ela por tudo que faz. Sozinho eu não conseguiria.

Quais os limites hoje em dia ao educar um filho? Acho que o limite de educar o filho não é só o limite da violência. Mas acho que os pais é que têm que dar mesmo a educação moral dos filhos. E a escola é que precisa de limites hoje em dia. A escola que está ultrapassando os limites e está querendo entrar na vida familiar. Entrar no modo de pensar, nos paradigmas que cada família tem pro seu filho, sabe? Então, a gente vê escolas querendo ensinar uma visão de mundo, passar educação sexual para crianças de 5 ou 6 anos de idade. Eu não quero que a escola vá falar pro meu filho que idade que ele tem que transar ou o que é transar. O como se masturbar. Isso aí, é comigo. A escola tem que ensinar a ler, escrever, fazer conta. Tem que ensinar conteúdo. Acho que se tem algo que está precisando de limite na educação, são as escolas.

Como orientar sem tolher ou incentivar algo? É o exemplo. Aquela velha frase “o exemplo arrasta”. Então, se você quer que seu filho faça uma certa coisa, faça essa certa coisa. Se você não faz e fica falando pra ele fazer, ele não vai fazer. Ele vai fazer o que você faz, não o que você fala. Então, se você não come legume nenhum e quer que o moleque coma legume, ele não vai comer. Comece comendo legumes, todos os dias, e um dia ele vai falar “meu pai, que é um cara que eu amo, come legume, eu vou comer também”.

Seu atual personagem, o Magno em “Amor de Mãe” é um cara correto, digno e protetor (das mulheres, mãe, irmãos…). É um exemplo de homem? O que tem aprendido com ele? Não sei, essa coisa do exemplo é um pouco difícil. Mas acho que sim. Acho que o Magno é um exemplo de homem correto, como você mesmo coloca aqui, ele é digno, ama e protege sua família. Então, eu acho que sim. Pode se dizer que o Magno é um exemplo. Não sei muito bem responder o que eu tenho aprendido com ele, porque de uma certa maneira eu também empresto muita coisa minha pra ele. Às vezes eu preciso me adaptar. Eu acho que, por exemplo, falta um pouco de atitude talvez. Não estou falando que falta no personagem, o personagem é esse. Mas pra minha visão de mundo, pra minha visão do que é a vida, falta um pouco talvez um pouco de atitude, de decisão, pro Magno, sabe? Acho que a situação da vida dele fez ele ser um pouco grudado e dependente demais da mãe… Então eu acho que falta um pouco de ímpeto no Magno. De olhar pra Leila e falar “não, você não vai fazer isso com a minha filha”. Acho que as vezes falta ele ser um pouco mais ativo e menos reativo. Mas ele é um cara que quando colocado numa situação de ter que tomar uma decisão, ele geralmente decide pelo certo, pelo bom, pelo bem.

Na novela ele é acusado de assassinato por ter defendido uma mulher de um estupro. Faria o mesmo que ele? Como reagir numa situação dessa? É uma situação difícil de pensar. É claro que eu tentaria ajudar se eu me visse na situação do Magno. Mas, ao mesmo tempo, a gente mora num país onde tem muito vagabundo armado por aí, né? Então, se você vê um cara estuprando uma mulher, será que esse cara não está armado? Será que se eu for lá e sair no tapa com ele, ele não vai simplesmente puxar um 38, me dar um tiro e minha família vai ficar sem pai? São coisas que naquela fração de segundos, passariam pela minha cabeça. Mas, eu tentaria ajudar, ia dar um grito, não sei se eu chegaria perto, se eu ia jogar uma pedra… Não é uma situação, onde ligar pra polícia parece que adiantaria. Mas, de repente, você ficar do outro lado da rua, espera a polícia chegar, segue o cara, fotografa ele, não sei. Mas, com certeza, tentaria ajudar. Mas, vivendo no Brasil, vivendo no Rio de Janeiro, tenho muito medo de gente armada por aí. Se o cara está estuprando, de repente ele já é um bandido. Teria que ver na hora. É uma situação muito difícil, que a gente só sabe mesmo se viver.

 

Como é sua relação com amigos e irmão? Em muitos casos os homens reprimem esse amor de amigos com medo de serem taxados de gays. Como demonstra seu carinho e amor sem medo de ser julgado? Eu acho que isso é uma coisa que a comunidade dos homens perdeu muito. Essa coisa, que é fundamental, que é o amigo homem. Aquele cara que é o seu confessor, pra quem você conta verdadeiramente tudo o que você está passando, em quem você confia. Tem uma frase muito boa que diz que “um verdadeiro amigo é aquele pra quem você pode contar até uma boa notícia”, porque a pessoa não vai te prejudicar, não vai sentir inveja. Mas, é também uma pessoa pra quem você pode contar as más notícias. E ao longo da história, os homens foram perdendo isso. Na Espanha, por exemplo, você até hoje vê senhores caminhando de braços dados. Então, acho que sim tem essa coisa de “vão achar que somos gays”. Que a gente tem que estar sempre conversando só de mulher, futebol, contando piadas e perder a oportunidade de realmente conversar sobre coisas profundas, abrir o nosso coração para um amigo. E é fundamental ter amigos de verdade. Uma riqueza que a gente tem, são os amigos.

Você lida bem com seu corpo? Quais os cuidados? Qual vaidade? Tento fazer esportes, tento cuidar da alimentação. Minha alimentação variou bastante nos últimos tempos. Minha vaidade é que eu gosto de estar com o corpo bonito, não quero engordar muito. Eu engordei nos últimos dois anos, estou tentando emagrecer. Não está sendo fácil. Acho que eu tenho essa vaidade de estar com o corpo legal e também saudável, não é só a aparência. Tanto que eu nunca tomei hormônio nenhum, nenhuma bomba. Mas também é estar com o corpo saudável, flexível, ágil. Minha profissão depende do meu corpo, então acho que é por aí.

Você parece ser um cara muito ligado com a natureza. Taí esse ensaio como exemplo. Como isso te completa? Que cuidados tem com a relação meio-ambiente x consumo? Eu tento não ser um cara muito consumista. É claro que eu gosto de uma roupa nova, de comprar alguma coisa. Mas não sou, nem a Letícia é, excessivamente consumista. A gente tenta fazer coisas para cuidar da natureza. Hoje em dia tem aquelas sacolas retornáveis, ou pegamos caixas no mercado pra não levar muitas sacolas plásticas. Inclusive tem umas sacolinhas com uma cordinha que fecha, pra não ter que pegar o tomate, a cebola, a batata no saquinho do supermercado. Tentei diminuir muito o meu consumo de plástico. A gente separa lixo, eu faço compostagem do lixo orgânico da casa pra depois virar adubo e jogo no jardim. A gente vai fazendo esses pequenos cuidados. Acho que é a maneira que a gente tem de cuidar do meio ambiente, principalmente do ambiente a nossa volta. E pra mim, estar em contato com a natureza é fundamental. Eu gosto muito de passear na natureza, fazer esportes ao ar livre, surfar.

Ano passado você participou da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém. Como esse trabalho te tocou? O que aprendeu com esse trabalho? A Paixão de Cristo mudou a minha vida. É um processo muito misterioso, que vinha acontecendo há algum tempo comigo. Eu tinha, espiritualmente, feito as pazes com a minha fé já há alguns anos. Tinha voltado a rezar pra Jesus e pra Maria, que é como eu fui ensinado na infância. Eu estudei em colégio católico, apesar da minha mãe ser kardecista. E aí, eu fui voltando, fazendo as pazes com a minha fé depois de um período de pouca fé e de desconfiança, que foi muito ruim na minha vida pessoal, ruim no nosso casamento. Esse relativismo de que tudo pode ser, tudo é tudo, nada é nada, não tem certo, não tem errado, o mundo é só uma grande coincidência, não tem sentido, não existe Deus. Pra mim, as consequências vieram e foram bastante ruins. Então, eu já vinha fazendo as pazes e, de repente, um dia senti a vontade de fazer essa peça, comecei a dar entrevistas falando que eu queria fazer. Fui convidado, no meio do caminho entre o convite e a peça eu voltei pra a igreja católica, voltei a ir na missa, voltei a me confessar, e isso mudou muita coisa na minha vida. Mas são mudanças internas, um autoaperfeiçoamento.

Sem contar a paz, a delícia de você viver em comunhão com Deus, com Cristo, com o Espirito Santo, pedindo a interseção de Nossa Senhora, pedindo que ela proteja a minha família, que ela rogue por nós. E mudou muito a minha vida, eu estou muito feliz com esse meu momento. E sei que vai comigo agora pro resto da vida, porque eu sei o que eu descobri. É diferente você fazer uma catequese com 12, 13 anos de idade e você redescobrir a fé, mais velho, mais esclarecido, sabendo o que está acontecendo em cada etapa da missa. Se você descobre o que está acontecendo em cada etapa da missa, não tem isso de missa chata. Tem missa chata porque a catequese foi mal feita, a gente não sabe o que está acontecendo ali. Se você souber, não tem missa chata. Mudou muito a minha vida, me trouxe de volta pra igreja católica, e ainda estou aprendendo com esse trabalho, porque tem gente que acha que religião é a maneira de fugir dos problemas, uma maneira de obter um consolo fácil, pelo contrário. Sua vida não fica nada mais fácil se você quer ser um cristão, um bom cristão, um cristão sério. Na verdade, o que você ganha é um conjunto enorme de obrigações, que não são só as obrigações de não fazer isso, dos mandamentos e dos dogmas. Um bom cristão tem obrigação de estudar, de meditar sobre questões, sobre problemas, obrigação de agir corretamente, fora as obrigações de ser honesto, de dizer a verdade, de rezar. Então, são muitas obrigações, mas a vida fica muito melhor, ganha um sentido transcendente maior e que é fundamental. A vida humana sem transcendência, vai caindo nesse niilismo que é a base de todo o desespero, ansiedade, tristeza e depressão de grande parte da humanidade. Essa ansiedade de querer uma coisa que eu não se sabe o que é. A gente esquece que, muitas vezes, o sentido está em coisas que sempre existiram, que a gente está perdendo, que é a família, a religião… assumir responsabilidades.

Seu casamento com Letícia já dura 10 anos e recentemente você fez uma declaração de amor que repercutiu. Qual a base desse relacionamento de sucesso? Como e onde você se completam? A base do relacionamento de sucesso acho que é liberdade pra dialogar – a gente conversa muito sobre as coisas e a gente vai mudando. Eu acho que eu mudei muito e aprendi muita coisa com a Letícia e percebi que ela precisava que eu mudasse certas coisas e eu fui mudando todas essas coisas. Ela também mudou muito pra que a gente pudesse estar junto, pra tentar me entender. Acho que as pessoas têm demandas e não há mal nenhum em você mudar, desde que você não mude a sua essência. Se você muda porque você quer mudar, você entende que precisa evoluir pra ser melhor pro seu parceiro. Então, acho que a gente fez isso muito. A gente é muito parecido, a gente gosta muito de estudar, estamos sempre lendo muito. A gente quase não vê série e filme juntos, de noite quando a gente coloca as crianças pra dormir, cada um abre um livro e a gente fica um do lado do outro lendo e conversando sobre o que está lendo. E a gente sempre gostou de esportes, de esportes ao ar livre, a gente já surfou juntos, já correu juntos, já fez triatlo juntos. A gente gosta de estar em casa, estar com a família… então a gente tem uma sintonia muito bacana entre nós.

Para recarregar as baterias, o que procura? Pra mim é fundamental fazer esporte, porque eu sinto que o esporte, além de fazer bem pro corpo, e eu não estou falando da aparência, estou falando daquela sensação interna gostosa que a gente sente depois de fazer esporte, esporte também é fundamental pra minha mente. Dá uma higienizada na mente. Você vai lá e faz uma tarefa muito simples, levantar pesos durante 40 minutos ou correr ou andar de bicicleta, você esvazia a mente, fica ali naquela tarefa mecânica, gasta uma energia. Então, parece estranho recarregar as baterias cansando o corpo, mas pra mim funciona muito. Estar em contato com a natureza também e ler livros são coisas que recarregam minhas baterias. Às vezes, no final de semana, os mais velhos estão no quarto, o bebê deu uma dormidinha de tarde, pegar um livro é um momento de muito prazer pra mim.

Em 2015 perguntamos se você gostava da pessoa que você era. Você respondeu que sim, mas que gostaria de mudar várias coisas. Mudou algo nesse tempo? Mudou muita coisa nesse tempo, graças a Deus, porque são coisas que me incomodavam e que eu fui mudando. O fato de eu ter voltado pra igreja católica me ajudou a mudar várias dessas coisas que me incomodavam. Acho que, hoje em dia, eu sou melhor marido, melhor pai, melhor pessoa do que eu era em 2015. E espero que, em 2025, eu esteja melhor do que em 2020. Eu vou assim, tentando evoluir. O problema é que muitas dessas mudanças são coisas muito pessoais, que eu acho que nem é do interesse de ninguém e que é difícil de comentar. Mas muita coisa mudou internamente e eu estou muito feliz, porque eu ganhei uma paz, uma calma que eu não tinha. Que eu acho que tem a ver um pouco com a maturidade chegando. A gente demora a amadurecer, mas um dia, se tudo der certo, a gente amadurece.

Fotos Dêssa Pires

Styling Samantha Szczerb

Beleza Ualas Nascimento do Ophicina do Cabelo

Agradecimentos Amil Confeções, Foxton, Osklen, Vert e J’Adore Luxe e Pauapique Design por Thiago Guedes (locação)