Quem assistiu a 1ª fase de Pantanal sem dúvida foi impactado pela personagem Irma, de gestos delicados, mas com intenções que iam muito além do seu rosto angelical. Mérito da nossa estrela de capa Malu Rodrigues que emprestou seu corpo e talento para dar vida a uma personagem cheia de nuances. Quem acompanha a carreira de Malu não se surpreende pela desenvoltura dela em se moldar às mais diversas personagens. Foi assim com Bia na série Tapas & Beijosou dando vida a Wanderléa no cinema, onde também mostrou seu talento para a música. Entre as muitas vidas dadas à suas diversas personagens, “eu jamais apago ou me desfaço delas, pelo contrário, sempre as levo num lugar especial dentro de mim”, declarou Malu ao longo da nossa entrevista exclusiva que você confere abaixo.
Malu, pelo que vimos a Irma de Pantanal foi breve, mas foi bem intensa. Como foi para você? Intensa!!! Foi meu primeiro trabalho após dois anos de pandemia. E todos sabíamos da grandiosidade que seria participar de Pantanal. Estar de fato no Pantanal, naquele lugar místico, tão poderoso, trouxe uma intensidade ainda maior e uma sensação de completude.
A sua Irma foi o início de tudo (comparando com a de Camila Morgado na fase madura). Como foi construir essa personagem? Chegou a assistir como foi a trajetória dessa personagem na primeira versão ou preferiu ficar livre de referências? A Irma foi construída em conjunto. Eu e Camila nos encontramos pela primeira vez no salão, com a nossa caracterizadora Valéria Toth e a cor ruiva foi escolhida em comum acordo para trazer um certo mistério, o que acabou trazendo também uma dubiedade interessante para a personagem. Assisti à primeira versão mais para saber do que se tratava e conversei muito com a Camila, pra entender até onde a personagem iria. Acredito que tudo serve como inspiração e sempre soma. Tivemos alguns encontros presenciais, com os diretores e a nossa maravilhosa preparadora de elenco Andrea Cavalcanti, que esteve presente durante todas as gravações. Eu e Camila trocamos um milhão de mensagens, áudios e telefonemas intermináveis. Após todas as cenas que eu gravava, ligava ou gravava áudio para contar como havia feito e vice-versa. Maneira de sentar, intenções, figurinos, cenários. Assim, nasceu nossa Irma, feita com muito amor e muita parceria.
Irma é o tipo de personagem que vai pegando o expectador com calma. Com voz mansa e cara de anjo, ela mostrou a que veio. Como você Malu, definiria Irma? Como foi a troca “entre vocês”? Eu e Camila definimos a Irma como uma felina. Uma personagem que fala muito com o olhar. Sempre observadora, mas com um caldeirão de sentimentos borbulhantes dentro dela, que são expostos quando lhe convém ou quando fica insuportável mantê-los presos. Ficamos imensamente felizes com o resultado, tanto na minha fase como na da Camila. Nos divertimos muito com os memes como o “Talairma” (risos), mas ficamos ainda mais extasiadas quando vimos que tudo que pensamos estava funcionando, da Irma ser uma incógnita e, principalmente, das pessoas estarem enxergando o tamanho da complexidade da personagem, complexidade daquela família totalmente disfuncional. Duas filhas criadas na futilidade. No caso da Irma, ela sempre sendo o plano B, a segunda opção. Imagina como isso não interfere no desenvolvimento emocional de uma criança. Alguns valores, sentimentos, princípios ficam distorcidos, confusos. Isso serve para a relação das irmãs – amor e ódio se misturam.
Em entrevistas você comentou que o Pantanal tomou conta de sua vida. Como foi o primeiro contato, o que mais te impressionou e o que ficou marcado em você? Certamente o que mais me marcou nesse trabalho foram os amigos que fiz. Acredito que a vida é feita de encontros e o Pantanal me trouxe vários encontros lindos, que guardarei para sempre num pedaço enorme do meu coração. Quanto ao local, não tem como não se encantar. A natureza e a diversidade animal são um desbunde. Mergulhar naquele rio não tem preço, o Pantanal transforma a gente. Fiquei lá apenas uma semana, mas o suficiente para entender a magnitude que aquele lugar possui. Um dos dias mais especiais da minha vida foi num domingo de folga em que fomos para a Fazenda do Almir. Fomos recebidos com muito amor pelo pessoal da fazenda, pelo próprio Almir, sua esposa Paula e o Gabriel Sater. Passamos a tarde comendo feijoada, mergulhados no rio até o pôr do sol e cantando. Ouvir aquela família, incluindo o Chico Teixeira, que também estava presente, foi como passar uma tarde em estado de poesia e eu pretendo voltar assim que der.
Você passou alguns anos interpretando a Bia na série Tapas & Beijos, que era uma adolescente. Irma já era uma personagem mais madura e talvez algumas pessoas ainda guardassem aquela imagem de Bia. Como é pra você se desfazer de uma personagem? Qual o maior desafio nisso tudo? Muita gente só foi saber que era a mesma pessoa um tempo depois. Uma das coisas mais incríveis da minha profissão é poder viver várias vidas numa só. Essa possibilidade de experimentar, de ser alguém diferente em cada trabalho. Isso traz também um crescimento pessoal absurdo. Eu aprendo muito com cada uma delas e quando a próxima personagem é completamente diferente da anterior, isso torna meu trabalho ainda mais desafiador e prazeroso. É um aprendizado constante. E eu nunca me desfaço totalmente das personagens, acredito que elas são como as nossas cicatrizes da vida, são importantes para o crescimento e amadurecimento. Então, eu jamais apago ou me desfaço delas, pelo contrário, sempre as levo num lugar especial dentro de mim.
Já no cinema você interpretou Wanderléia. Que traz um desafio maior por ser uma pessoa real. Como foi a preparação? Deu um frio na barriga quando topou esse projeto? Foi maravilhoso! De verdade eu só fiquei tranquila, quando ouvi da própria Wanderléa, na estreia em São Paulo, que ela AMOU! Aí eu relaxei! Sempre quis trabalhar com o Lui Farias, que conheço desde criança. O Lui já tinha o Chay e o Gabriel Leone que cantavam e queriam uma Ternurinha que também cantasse. Junto com a Marcela Altberg (produtora de elenco do filme) chegaram no meu nome. Optamos por cantar de verdade, para que tudo ficasse ainda mais real e natural. Foi uma decisão dos três, em conjunto com a direção para não imitarmos e sim, fazermos uma homenagem. Pegamos os trejeitos deles e trouxemos para o nosso corpo, nossa voz. Representar a Wandeca foi uma honra, uma mulher completamente à frente de seu tempo, que revolucionou a moda, a posição da mulher na sociedade. Ela é de uma força descomunal, sou muito grata pelo convite do Lui. Assisti um zilhão de vídeos, ouvi muita Jovem Guarda, coisas que estão no filme e coisas que não estão, mais como inspiração mesmo. E tem uma curiosidade fofa, Devolva-me só está no filme por minha causa. Falo com muito orgulho disso e o próprio Lui sempre faz questão de comentar nas entrevistas. Sou muito estudiosa e na primeira reunião eu mostrei um vídeo antigo da Jovem Guarda, que achei na Internet, um dos poucos onde não temos a participação do Roberto. Estão em cena apenas Erasmo e Wanderléa, na hora em que mostrei isso para o Lui, ele deu um jeito de colocar no filme e acabou sendo a última cena, o desfecho da Jovem Guarda. E eu particularmente acho essa cena linda, tem um valor sentimental grande pra mim.
Musicalmente acreditamos que não tenha pesado tanto por você já cantar. Mas como foi atuar e cantar? A música me acompanha desde sempre. Esse trabalho foi um pouco mais desafiador, por se tratar de alguém que existe, em tentar trazer características da Wanderléa não só na voz falada, mas na cantada também. Mas eu me diverti bastante. Eu amei participar desse projeto!
Você estreou muito novinha na TV, com 10 anos. Já tinha noção de que era isso que queria para você? Quando percebeu que estava no caminho certo? Eu comecei no teatro, fazendo algumas participações na TV, mas não tinha muita noção da importância e muito menos da proporção que isso teria na minha vida. Foi no teatro que me entendi como atriz. E o mais louco é que isso aconteceu fora de cena, no primeiro musical que assisti ao vivo! Só tinha visto na TV. Eu ia audicionar para A Noviça Rebelde, tinha 13 anos e fui assistir à montagem de Sete – O Musical, que era da Möeller&Botelho. Eu lembro de só chorar no intervalo e de dizer para o meu pai: “É isso que eu quero fazer para o resto da minha vida!”. Eu tinha 13 anos e tive a certeza que estava no caminho que eu deveria estar. Na minha primeira audição, para a Noviça, foi apoteótico para mim e minha conexão com a dupla foi um encontro de almas. Foi a primeira vez em que me senti completa e esse sentimento raro não pode passar despercebido, nem mesmo por uma adolescente, quando estamos despertando para a vida.
O que surgiu primeiro na sua vida, a música ou o trabalho de atriz? Que importância cada um tem na sua vida? Eu comecei atuando, mas foi quando a música entrou na minha vida, que tudo fez sentido. Cantar é como respirar para mim. A música tem o poder de teletransportar. As duas coisas sempre estiveram ligadas para mim. A atriz e a cantora se completam. Não sei dividir, não consigo.
Falando em música… Você fez uma marcante passagem pelo programa Popstar. Como foi a experiência? O que acrescentou para você como artista? Participar desse reality foi a maluquice mais deliciosa que fiz na vida! Eu saí completamente da minha zona de conforto e isso é assustador, mas de um enriquecimento absurdo. Agradeço muito ao Boninho pelo convite. Foi nesse programa que eu conheci o meu produtor musical e amor da vida, Ricardo Leão, que foi quem me apresentou ao Alexandre Ktenas, meu empresário musical. Eu acredito que nada na vida é por acaso. A partir daí, surgiu a ideia de gravar meu primeiro single Alvoroço, uma composição da Clara Valverde e do Josefe, pela Selim e que já tem quase 70 mil ouvintes e entrou na playlist pop leve do Spotify. Já estamos preparando o próximo!
Como o teatro te moldou para a artista que você é hoje? A artista que sou hoje, só existe por causa do teatro. Fui completamente moldada por ele. Tudo que eu conquistei, foi graças ao teatro e também aos meus mestres/pais/amigos, a dupla do meu coração, Charles Möeller e Claudio Botelho, que foram os primeiros que acreditaram e confiaram em mim e que me deram oportunidades maravilhosas. O teatro foi a minha faculdade, não só no sentido acadêmico, mas na minha formação como ser humano. Nessa disponibilidade do ser de viver em estado presente, de se doar para o outro, com o outro. Atuar/Cantar é minha vocação, e como diria Fernanda Montenegro, “Se você exerce a sua vocação, metade da sua vida está resolvida”.
A beleza em algum momento já te colocou numa caixinha que te limitava como artista? Aliás, não a beleza, mas as pessoas a julgarem pela beleza, pelo exterior? Como você vê isso? Bom, primeiramente muito obrigada! Então, eu nunca pensei muito sobre isso. Sempre conquistei meu espaço com muito estudo e dedicação. Essa é uma das vantagens de se começar mais nova, ainda criança. Você vai conquistando seu espaço degrau por degrau, mas sem pensar muito em fatores externos e que no fundo não tem a menor importância, tudo sem pressa. Mas sem dúvidas, devo isso ao teatro. No teatro você aprende desde cedo que a essência é o mais importante, a inteireza, o resto é resto.
Como lida com o espelho, vaidade e cuidados com o externo? Acho que todos temos esses momentos. Existem coisas que eu mudaria em mim, dias melhores e piores, mas tento sempre enxergar que somos diferentes uns dos outros e que o que é belo pra mim, pode não ser para o outro. Em primeiro lugar, eu sempre procuro pensar na saúde, cuido da alimentação e faço exercício para que eu possa viver muitos anos e desfrutar de muitas coisas lindas ainda. Mas tem uma parte minha que se preocupa com o trabalho. Principalmente, no caso dos musicais. A gente passa três horas em cena, dançando, correndo, pulando e cantando, se não tivermos um preparo físico para isso, não existe musical. Eu tenho um personal que me acompanha desde sempre – Paulo Nascimento.
E fora isso, eu sou muito branquinha, o cuidado com o sol é extremo. E eu tomei anticoncepcional a minha vida toda, nunca tive nenhum problema grande na pele, mas tem dois anos que não uso nenhum método contraceptivo, então é normal a pele dar uma desregulada, pra isso eu tenho minha dermato do coração, que cuida de mim desde criança, Aline Vieira. Mas procuro sempre levar tudo com leveza.
Nas horas vagas o que faz sua cabeça na hora de ler, ver e ouvir algo? Eu assisto, leio e escuto de tudo. Sou muito aberta para coisas novas. Mas partindo de mim, eu sempre procuro por coisas que me toquem a alma. Que me façam refletir, mas também tragam acalento, a gente tá vivendo num mundo bem estranho. Então, eu tenho procurado por coisas e pessoas que me ajudem a conectar comigo mesma, que tragam uma certa plenitude. Para conquistar Malu basta… Ser honesto. A honestidade traz uma integridade que me fascina. Gosto de pessoas que não tem medo da vulnerabilidade, que vivem em sua inteireza, sem medo do ser. Está cada vez mais raro encontrar pessoas assim, então quando as encontro, gosto de mantê-las bem pertinho.
Fotos Vinícius Mochizuki
Assessoria Dany Tavares