Nordestino natural de Aracaju e nascido em uma família de classe baixa, Willyam Santana, de 33 anos, passou por grandes dificuldades para realizar seu sonho de criança que era ser um grande surfista. Sem possibilidades financeiras, morando longe da praia e sem o apoio dos pais, o jovem Willyam tinha certeza que queria viver do surfe, sobrava fé, disciplina e perseverança para alcançar os seus objetivos. Até que com o tempo um por um os percalços que apareceram pelo caminho até pegar sua primeira onda de verdade foram sendo superados. Mudou-se para o Rio de Janeiro com R$ 1.000 no bolso, largou a família para ir morar atrás de uma loja de surf, sem ter certeza do meu futuro. Porém, Will “vendeu seu estilo de vida” e passou a dar aulas de surfe para quem se interessasse, incluindo alguns atores famosos como Juliano Cazaré, Dani Suzuki, Bernardo Velasco, Pérola Farias, Arthur Aguiar e entre outros. O encontro com Dani, que o ajudou a tirar seu primeiro passaporte e o proporcionou a sua primeira surfe trip para a Costa Rica, mudou seu destino e abriu muitas portas.
Mas, Will queria mesmo era desafiar as tão temidas ondas de Nazaré. Até que, um encontro com João Chumbinho, acabou selando de vez seu destino. A amizade cresceu e o levou a conhecer Lucas Chumbo, que é simplesmente um dos melhores surfistas de ondas grandes do mundo, que acabou emprestado uma prancha para Will em uma viagem para o México, onde ele entrou numa ondulação muito grande e acabou conseguindo surfar uma onda gigante em Puerto Escondido, em Zicatela.
Com uma prancha 9.2 do amigo e diante de um mar gigante, Will pegou uma onda de 25 pés, que acabou viralizando. O feito apareceu em vários veículos especializados do mundo inteiro e, o até então desconhecido surfista sergipano, entrou no mapa das ondas grandes. Até que veio o convite para surfar a tão temida onda de Nazaré, a maior onda do mundo. Lucas Chumbo acabou convidando Will e, logo em sua primeira onda no towin em Nazaré, ele fez história. Ali, começou a mudar o seu destino e a sua vida. Hoje em dia, ele é um dos grandes nomes dos atletas selecionados e convidados a dedo para participar do Gigantes de Nazaré, uma das principais competições da modalidade que acontece todo ano nas temidas ondas portuguesas.
Willyam, para começar… O que é mais desafiador, as ondas de Nazaré ou de Mavericks (USA)? E por quê? Cada uma tem suas particularidades – são duas ondas totalmente desafiadoras. Nazaré, sem sombra de dúvidas, não tem comparação em relação ao seu tamanho – realmente é muito grande. Já em Mavericks, além do tubarão branco, o fundo é de pedra, onde você pode bater. As duas ondas são muito desafiadoras.
A vida de um surfista é feita de grandes desafios como esses dois citados acima. Mas e na sua trajetória de vida até aqui, o que foi mais desafiador? Sem dúvidas, foi sair de casa com somente uma passagem de ida para o Rio de Janeiro com R$ 1.000 no bolso, largar minha família para ir morar atrás de uma loja de surf, sem ter certeza do meu futuro. Eu só tinha o meu sonho para me agarrar e mais nada.
Natural de Aracaju, de família simples… o surf entrou na sua vida e como a modificou? Foi através de um primo chamado Breno, como falei. Seus pais tinham uma condição melhor e moravam próximo à praia, em um bairro da zona sul. Em uma visita de família de final de ano, eu acabei entrando no quarto dele e foi a primeira vez que vi fotos de surf e uma prancha. Lembro que na parede do quarto dele havia várias páginas de revistas de surf coladas. Foi ali que tive meu primeiro contato com o esporte. O esporte é uma ferramenta de transformação incrível. Por conta da minha disciplina e foco, me fez ficar longe de drogas e das noitadas o que faz todos os jovens correr perigo.
Hoje aos 33 anos, o que ficou do menino sonhador sem dinheiro para comprar uma prancha? Sempre procuro lembrar de onde eu vim, mantendo meus pés no chão, minha essência, humildade e os ensinamentos do meu avô, além de guardar no coração a bondade da minha avó, Dona Maria.
Você pode nos contar detalhes sobre sua primeira prancha que veio de uma oficina de carro? Eu morava na zona norte de Aracaju, a capital do menor estado do Brasil, Sergipe, em um bairro chamado Marcos Freire 2, que fica bem longe da praia – não existia surfista, o mais próximo era o Skater que andava na praça. Eu vim de uma família humilde, meus pais tinham uma relação bem complicada. Eles não tinham condições e nem sabedoria para me incentivar ao esporte. Lembro que passei por uma oficina de moto, na rua em que morava, e vi aquela prancha de surf velha, pendurada na parede. Não pensei duas vezes e fui perguntar o que aquela prancha estava fazendo ali. Zé Luiz, o dono da oficina, falou que um cliente tinha deixado uma moto para consertar, mas não tinha dinheiro para pagar o trabalho e acabou deixando a prancha. Ele estava vendendo, mas eu não tinha dinheiro para comprar. Então, acabei convencendo-o a trocar comigo por uma bicicleta, que era da minha irmã. Troquei escondido da minha mãe e da minha irmã. Nossa, quando eu cheguei em casa para esconder a prancha, foi difícil. Tentei colocar debaixo da cama, mas não deu para esconder por mais de um dia. Minha mãe ficou brava porque troquei sem falar com ela antes. Eu era criança e não contei com quem eu tinha trocado, e deu certo. Foi a minha primeira prancha, aprendi a surfar nela, mas minhas primeiras ondas foram no colchão da minha cama. Eu colocava a prancha em cima e me imaginava surfando.
Como é sua relação com o mar? Desde criança, eu sempre amei o mar, apesar de ter nascido longe dele. Sempre que via o mar na TV ou em fotos, meus olhos brilhavam e meu coração acelerava. Eu amo cuidar dos oceanos e viver neles. Amo mergulhar, pescar, surfar e navegar. Essa imensidão azul é minha segunda casa! Hoje em dia, uso bastante minha influência como atleta para cuidar dos oceanos, principalmente por conta de tanta poluição e da quantidade de plástico. É muito triste que o mundo ainda não entendeu que o mar é o verdadeiro pulmão do planeta Terra!
Você mudou-se para o Rio de Janeiro onde começou a dar aulas de surf e aos poucos se estabelecer na cidade. Como foi essa mudança e que desafios encontrou? Essa mudança foi bem difícil, principalmente porque não tinha grana. Cheguei no Rio com duas pranchas debaixo do braço, uma mochila nas costas e um sonho para realizar! Quando cheguei, morei atrás de uma loja de surf, dormia em um colchão no chão, mal tinha um banheiro. Nossa, foi muito duro no início. Às vezes, nem gosto de lembrar, mas isso foi importante para me tornar uma pessoa forte. Passei por preconceitos e já fui humilhado, mas nada disso foi capaz de mudar minha essência. Pelo contrário, usei isso como força de vontade para estar onde estou hoje.
Ter encarado as ondas de Nazaré, literalmente, foi um divisor de águas em sua trajetória? Como foi e o que mudou? Existe um Will antes de surfar Nazaré e um Will depois de surfar a Nazaré. Essa onda mudou minha vida. Sei que ainda tenho muitas sementes para plantar e muitos frutos para colher, mas a cada temporada eu fico mais maduro e mais confiante. Nazaré me deu dois patrocinadores, duas grandes empresas da Europa: Refix e Nazaré Water Fun. Além de ser conhecido mundialmente, Nazaré vem mudando muito minha vida financeira.
Hoje, você está entre os melhores surfistas de ondas grandes do mundo. Mas movido por desafios, qual o próximo? Se me perguntassem isso há 5 anos atrás, pareceria impossível estar entre os melhores surfistas de ondas grandes do planeta, mas eu nunca deixei de acreditar nos meus sonhos e, hoje, venho colhendo os frutos! Meu principal desafio é bater o recorde da maior onda do mundo. Se Deus me der esse feito de presente, seria incrível. Sei que estou preparado para isso.
Hoje em dia, você diria que domina Nazaré? Qual o segredo (se é que ele existe)? Nos últimos anos, venho me empenhado muito, especialmente em fazer manobras acrobáticas nas ondas gigantes, habilidade de poucos atletas em situações extremas. Porém, apesar de ser muito grato, estou diante de uma força da natureza brutal, jamais posso prever o que vou enfrentar. Meu segredo é equilibrar meu estado emocional e dominar meu medo – o resto entrego nas mãos de Deus.
Qual sua maior vaidade (como homem e atleta)? Acho que minha maior vaidade é cuidar de mim. Gosto de me vestir bem, além de um bom perfume.
Nas horas livres o que faz sua cabeça? Nas horas livres, eu amo estar com meus amigos, seja em um restaurante ou em casa. Estar com meus amigos é uma das coisas mais valiosas da vida. Eu me sinto muito abençoado por ter amigos de valores e caráter que me fazem sentir parte da família.
Fotos Nanda Araujo
Styling Samantha Szczerb
Agradecimentos Raffer, Cris Martins e Refix