
Ícone de paixão nacional, mulher forte e consciente do seu papel como celebridade e cidadã. Luiza Brunet dispensa mais apresentações. Ao longo de décadas ela esteve presente e atuante em diversas frentes, fosse como modelo, atriz, defensora dos direitos femininos ou simplesmente a personificação da beleza da mulher brasileira. Não foi à toa que posou para os maiores fotógrafos nacionais e internacionais. Estampou inúmeras capas de revista, faltava a MENSCH, e participou de diversas campanhas publicitárias. Luiza sempre foi uma mulher à frente do seu tempo e por isso permanece no consciente coletivo de tanta gente. Aqui nessa entrevista exclusiva para a MENSCH, Luiza é puro encanto e nos faz ser ainda mais apaixonados por ela.
Por Nadezhda Bezerra


O mítico Nelson Rodrigues que me perdoe, mas nem toda unanimidade é burra. Luiza Brunet prova isso para nós mortais. Luiza, há décadas é considerada a mulher mais bonita do Brasil. Ela tem o cheiro das trincheiras de um país com dimensões estratosféricas, mas se a beleza brasileira tem uma cara, essa cara é de Luiza Brunet.
Nascida no Mato Grosso do Sul, de pai lavrador e mãe costureira, aos 9 anos era babá e, logo, empregada doméstica. Sua trajetória poderia ser a trajetória da mocinha dos folhetins onde a vida difícil machuca e machuca, e tem redenção no final da trama.
Mas o final deste enredo está longe de terminar, pois Luiza é puro movimento.
Ela se tornou uma supermodelo brasileira, onipresente em todos os tipos de mídias de moda, nos áureos tempos das grandes publicações. Era capa e recheio das revistas, e figurava diversas campanhas publicitárias.
No final dos 90, eu era editor de moda da revista Desfile na Bloch, onde Luiza construiu boa parte da sua imagem como top model. Meu editor, chefe Roberto Barreira, dizia “se a revista não vende em banca coloca a Luiza na capa que não sobra uma sequer”. Na minha era como editor, não cheguei a trabalhar com Luiza. Faltou Luiza (por enquanto) na minha biografia.
Pouca gente sabe, mas a morena fotografou um dos livros mais importantes do universo fashion, Rio de Janeiro, fotografado pelo celebre Bruce Weber. Luiza está em páginas com pouquíssima maquiagem e corpo desnudo. É a protagonista da cena. Trabalhou em Paris com o estilista franco-tunisiano Azzedine Alaïa e com o francês Guy Laroche. Fora as campanhas da Calvin Klein de underwear e perfumes. Carreira estelar.
Na TV, papéis, e participações em filmes, novelas e documentários. Ativista pelos direitos da mulher. Defensora de leis e projetos que as possam proteger de feminicídios, crime em ascensão no mundo todo. A fim de proteger todas as suas iguais dos relacionamentos tóxicos, faz palestras por todo mundo falando da sua experiência como mulher, suas vivências.
Luiza foi agredida pelo ex-companheiro por 5 anos e todo o país acompanhou suas mazelas pelos machucados, divulgados pela própria nas redes sociais. Um sofrimento que culminou em processos e sofrimento desmedido.

Luiza é brasileira, é mulher de sucesso, dona de sua história e exemplo de luta por sua fibra para todas as mulheres do país que passam pelas mesmas experiências.
A heroína venceu, antes do final da fábula. E a MENSCH ama Luiza Brunet.
Por Marco Antonio Ferraz


Você viveu o auge da carreira de modelo quando havia um padrão estético muito rígido e definido. Atualmente, se busca quebrar esses padrões. A publicidade tem usado cada vez mais corpos diversos, discutindo os conceitos de bonito e feio, ideal e real. Como você vê tudo isso? Na minha época, não havia o reconhecimento do valor da mulher. Modelos e manequins, com eram referidas as mulheres da moda, também eram chamadas de cabides. Considero que quebramos paradigmas vindo com a Rose de Primo musa dos anos 70, quando a capa da Manchete trouxe seu nome como chamada importante. Quando cheguei quase junto com a Xuxa, também éramos exuberantes e nossos nomes estavam nas capas de revistas. Hoje, não há lugar para opressão ou padrão definido. Mulheres diversas ocupam capas e publicidades, como referência de possibilidades. Todas são consumidoras e merecem ser representadas em todos os lugares.
De modelo sex symbol nos anos 80 e 90 à ativista na luta contra a violência doméstica. Já enfrentou algum preconceito nessa batalha em prol das mulheres em seu tempo como modelo e manequim? A vida nos dá possibilidades de mudanças constantes, e não precisamos ter medo. Eu mesma fui de supermodelo e atriz à empresária. Hoje, me encontro no lugar que desejei estar. Amo o que faço. Sou responsável e respeitada, através do trabalho em prol de uma pauta extremamente importante no Brasil e no mundo. Ser vítima de violência doméstica e violência na infância, assistindo em casa – assim como a violência sexual aos 11 anos, me trouxeram experiências dolorosas. Posso falar sobre isso com propriedade, como vítima. O preconceito existe sim e, infelizmente, vem de mulheres, seja no mundo da moda ou como ativista pelo enfrentamento da violência contra mulheres ou pelos direitos das mulheres e meninas.
Você considera que uma das principais dificuldades para erradicar a violência, em todo nível, contra a mulher é que a palavra da mulher é sempre desacreditada mesmo com evidências e provas em favor delas? Infelizmente, nós mulheres, quando sofremos violência e vamos denunciar seja uma delegacia comum ou em uma delegacia da mulher, somos questionadas sobre a violência sofrida. Querendo uma justificativa para a violência vinda de homens agressores. Exatamente por esta razão, muitas vítimas desistiram de fazer a denúncia e se tornaram vítimas do feminicídio – não tiveram chance de sobreviver, por conta da falta de capacitação dos atendentes no momento crucial, quando a vítima teve coragem de denunciar seu agressor. Muitas são revitimizadas – o que hoje é crime. O problema é tão grave que, ao matar sua companheira ele será preso e se houver filhos, estes serão, muitas vezes, destinados ao conselho tutelar, destruindo uma família. A única forma para erradicar a violência de gênero será através da educação, informação e punições severas.

O que aprendeu com os seus casamentos e com a maternidade? O que essas experiências trouxeram para sua vida como mulher e por quais transformações passou? O casamento pode ser uma surpresa. Não há como dimensionar o que pode vir com o passar do tempo. Precisamos ficar atentas, pois a violência doméstica começa sutilmente, com palavras que ferem e constrangem, proibições, cerceamento de direitos e liberdade e segue para empurrão, tapa, soco, etc… Hoje, me considero uma mulher forte, atenta e criteriosa. Todo relacionamento nos ensina algo, mas não devemos desistir de tentar um novo recomeço.

Você assistiu à série Adolescência? Quais as dificuldades, medos e ansiedades que enfrentou na criação de seus dois filhos e onde acha que mais acertou? O que diria para as mães com filhos entre 12 e 17 anos? Embora seja um tema que me interessa muito, não assisti ainda. É de extrema importância para pais e mães assistirem. Meus filhos são adultos, já. Os jovens entre 10 e 17 estão usando redes sociais sem filtro, tendo acesso livre e isso pode ser muito danoso. Todos nós pais temos questões sobre a criação de nossos filhos. Não é fácil educar filhos com tanta interferência de fora, mas nosso papel e dever é, além de educar e criar para o mundo, dar autonomia a eles o que é fundamental e claro ser o porto seguro. Filhos, são para sempre. Na minha casa, sempre houve espaço para se falar de qualquer assunto, sem distinção. Com clareza, respeito e educação.
Como enxerga a exposição nas redes sociais e para você, qual o limite entre o uso das redes (próprias e de terceiros) para promoção profissional e por puro narcisismo? É irreversível o uso das redes sociais. Eu adoro folhear uma revista e um livro em papel, mas o jovem de hoje só quer o digital. E a gente se adapta para com o online. O celular se tornou banco, lojas, diversão, companhias de viagem, etc. Mas, ainda fico impressionada com coisas sem relevância para ter tantos seguidores. É muita exposição desnecessária de pessoas sem noção. A Internet deve ser para compartilhamento de conteúdo relevante, que possa ter impacto positivo na vida de quem está ali, muitas vezes solitário, passando por dificuldades emocionais e psicológicas, e o que se vê é banalidade. Inverdades, pessoas recortadas e maquiadas por aplicativos, falsa felicidade, falso rico, falso coach que dá receita para ser rico, ser magro, bem sucedido etc. Quanto a fazer uma página séria, mostrando seu trabalho com CNPJ com responsabilidade, acho válido.

Empresária, palestrante, atriz, ativista… Quantas Luizas cabem em você e como equilibrar todas essas facetas e atuações? Cabem muitas Luizas, justamente pela vasta experiência de uma mulher com história para contar desde os seis anos de idade. Hoje, aos sessenta e dois, me sinto segura para falar e agir se for preciso. Não tenho mais medo de nada. Sou clara, direta e sincera. Posso não agradar a todos e não sou unanimidade, mas sou franca e verdadeira. Assumo minhas responsabilidades.
Você foi a primeira modelo brasileira a realizar o sonho de ter contrato fixo com uma marca, na época a Dijon (marca de roupas especializada em jeans). Conte-nos como foi receber essa proposta e como isso repercutiu em sua carreira e em seu patrimônio financeiro. Foi um sonho na época. Passei três anos como modelo exclusiva. Porém, ao mesmo tempo em que me alavancou como modelo, me destruiu por dentro. Fui glamourizada. Houve investimento na minha imagem que foi bom para os dois lados, mas infelizmente, hoje, posso dizer que sofri uma série de abusos, assistido por quem estava muito próximo de mim. Assim é a vida. Só reconhecemos a violência com o passar do tempo. E posso assegurar que sei exatamente como foi, e porque pedi demissão. Então, nada parece o que e, inclusive financeiramente, posso afirmar que foi péssimo. O que sobrou foi um título: “A primeira modelo brasileira a ter um contrato de exclusividade no Brasil”. Tive meu nome patenteado pela marca Dijon e lutei nos tribunais para recuperar meu próprio nome aos 22 anos. Foi patenteado no INPI, na época, amplamente divulgado pelo Jornal do Brasil. Tenho, inclusive, os jornais da época intactos.

Para além do contrato com a Dijon, você também foi uma das primeiras a ser fotografada por badalados fotógrafos internacionais, indo de Bruce Webber a Mario Testino, uma coisa super incomum naquele tempo. Como foi essa experiência. A saída da Dijon me colocou em outro patamar, embora tenha sofrido retaliação severa por parte de alguns jornalistas da época. Fui além. Bruce Weber estava fazendo o livro Rio de Janeiro, participou com uma série de fotos que, posteriormente, foram leiloadas na Sotheby’s e na Christie’s. Além disso, fiz as campanhas da Calvin Klein que, na época, era referência de belas fotos. Fui fotografada por Bruce Weber, Mario Testino, Patrick Demarchelier e tantos outros excelentes profissionais. Na verdade, a Dijon copiava a Calvin Klein. E eu passei a ser, na época, uma das modelos da Calvin Klein. É sempre bom ter registros. Um orgulho ter feito parte desse grupo seleto. Bob Wolferson, Tripoli, Fernando Louza, Indalelecio Vanderly, JR Duran, Jairo Goldflus, Danilo Borges, Antonio Guerreiro e tantos outros maravilhosos.

Linda, charmosa e elegante, como lida com a vaidade e usa a dermatologia estética a seu favor? O que é cuidado e o que considera uma tentativa, “em vão” de frear o tempo? O tempo foi generoso comigo. Em contrapartida, cuidei também. Por ter começado a carreira de moda aos 16 anos, aprendi que meu corpo era minha empresa e decidi administrá-lo de forma correta. Sem dietas rígidas, com exercícios e bons hábitos que até hoje sigo. Não tomo mais sol como no passado, desde os 30 anos. Tenho uma dermatologista que cuida do que preciso, quero me reconhecer ao me ver no espelho. Auto-cuidado vem de comportamento, acompanhamento e dedução, mas vem também de ocupações, envolvimento e, se possível, uma causa. Hoje, me sinto muito bem. Creio que o que faço hoje, me deixa realizada e isso se reflete em beleza interior que, por sua vez, reverbera simpatia e amorosidade para depois a beleza florescer, mesmo na idade madura. Fatores como escolher estar com quem te dá prazer, te faz rir são fundamentais e, por fim, é muito bom ficar sozinha também, ser dona do seu tempo presente e futuro. Ou seja, mandar em você mesma, ter conversas interessantes e intelectuais com você mesma. Essa receita é infalível. E se porventura houver um novo amor, aprecie com moderação.
Quando sua filha Yasmin decidiu participar do BBB vocês chegaram a conversar, passou algum conselho e como lidou com tudo o que acontecia dentro e fora da casa a respeito dela? Você encararia viver uma experiência dessas? Eu tenho um diálogo bastante interessante em casa. Mas ela só falou em cima do laço. Assisti ao BBB e quase enlouqueci. Defendi Yasmin em nome das mulheres que são atacadas por homens, e não têm voz. Briguei, movi processo. Quando ela saiu foi um alívio. O programa é um laboratório de pessoas. Todos com um só propósito – ser o campeão. E depois?? Quantos passaram por lá??? Yasmin quis viver isso. Levantou bandeiras importantes. Esse poderia ser o papel do programa. Não, jamais iria.

Para além do físico, como alimenta a alma? Vive algum cuidado nesse sentido, seja por um viés espiritualista ou outros caminhos? Alimento da alma pra mim é tirar do cárcere emocional uma mulher com sua alma destruída. E falar sobre violência sexual infantil é receber de volta a fala de uma vítima que me ouviu e quer compartilhar sua história ali, naquele momento. É pegar a mão de uma mulher e levá-la em uma delegacia para fazer a denúncia da violência doméstica. É conseguir um emprego para uma mulher, para ela se manter livre e forte por ter como se manter. É viajar pelo Brasil, por nossas mulheres e meninas tão sofridas. É viajar pelo mundo, levando informações e fazendo conexões com pessoas. Creio que o que promovemos aqui, será reconhecido e trará benefícios emocionais. É por reconhecimento do meu esforço no trabalho, que decidi fazer a partir de 21/05/2016, dia que sofri violência doméstica aguda.
Quais os sonhos que carrega no coração e o que ainda quer realizar para muito em breve? Meu sonho é que a educação no Brasil eleve seus parâmetros e adicione no currículo escolar matérias sobre Direitos Humanos, Moral e cívica, Direitos fundamentais, Direitos das Mulheres e Respeito. Outro sonho, é que possamos viver plenamente, sem violência de gênero. Sem crimes contra crianças, principalmente, crimes sexuais. Justiça, saúde e educação para meninas. Empregos para a força motriz da sociedade – as mulheres. Esse é um sonho que poderia ser realizado.
O que gostaria de dizer aos nossos leitores homens para ajudarem na transformação de um mundo que seja um lugar seguro e de paz para as mulheres? Quero dizer que não sou contra os homens, mas a discussão a respeito das violências contra mulheres precisa ser discutida entre mulheres e homens, da sociedade civil. Creio que muitos homens que fazem uso da violência, foram meninos que sofreram violações também e precisam reconhecer que foram vítimas também. Mas, nada justifica um homem matar uma mulher ou espancar a mulher, simplesmente por posse. Não há explicação para um pai ou outro homem abusar sexualmente da sua própria filha ou filho ou qualquer outra vítima que seja. Crimes hediondos que devem ter penalidade máxima. Por outro lado, há homens de bem, que são bons exemplos para a sociedade.

Fotos Guilherme Lima
Produção executiva Samantha Szczerb
Styling Samantha Szczerb e Tina Kugelmas
Beleza Elcides Freitas
Locação Hotel Nacional Rio
Agradecimentos Nayane, Boss, Nk Store