DESTINO: DOHA, A CAPITAL DA COPA DO MUNDO

Escrever sobre o Catar tem um peso diferente. Apesar de – na sequência – classificar o país como local de passagem, e não um destino turístico final foi na capital, Doha, que passei meu último ano. O objetivo era aprender árabe (missão sem fim) e cultura islâmica, elementos necessários para quem planeja trabalhar na região como jornalista, e assim, quem sabe, evitar as falácias muito comuns de quem reporta sobre países árabes. Logo, as atrações são mais do que lugares a serem visitados. Elas carregam histórias, perplexidades, lições, certamente muitas risadas, também muita caminhada – achar táxis disponíveis, às vezes, é um pouco complicado. Bem, caminhar é um hábito saudável, e uma boa maneira de explorar um sítio novo.

A área do Catar é cerca de um quarto da área do estado do Rio de Janeiro. O país, localizado em uma península do golfo Pérsico, no Oriente Médio, é geralmente um ponto de conexão de voos, já que é a sede da Qatar Airways. Antes da descoberta do petróleo – e dos campos de gás, a economia era baseada na pesca, e na produção de pérolas. Os petrodólares trouxeram avanço econômico. De um passado relativamente pobre, atualmente o Catar é um dos mais ricos países do mundo, com renda per capita anual na casa dos 220 mil reais. Na paisagem de Doha, que está em constante evolução, estão inúmeros arranha-céus. A península é um enorme canteiro de obras, e recebe (de acordo com o planejado) a Copa do Mundo de 2022.

A população desta nação liderada pelo mais novo líder da região, o emir e xeque Tamim Bin Hamad Al Thani, que completa 34 anos em junho deste ano, é de aproximados dois milhões de habitantes. A maioria deles estrangeiros, já que os locais, catarianos, não passam de 300 mil. Doha concentra a maior parte dos moradores do país – e um trânsito terrível nas horas de pico. Uma boa rede de transporte público (adicione aqui o barulho do vento para refletir a desolação com o tópico transporte público) inexiste, porém, o metrô está em construção.

ATRAÇÕES EM DOHA

O Souq Waqif foi construído num estilo que lembra os tradicionais mercados árabes. Nele, estão lojas com lembranças típicas, artesanato, especiarias, perfumes e incenso. Produtos naturais como mel, ou cerâmicas podem ser encontrados no Souq Omani, enquanto o Golden Souq, o mercado de ouro, na tradução direta, é o local para comprar joias. As pérolas, geralmente, têm bom preço. O Souq Waqif ainda reúne restaurantes, hotéis boutique, cafés – lotados nas noites dos finais de semana quando músicos regionais tocam ao vivo. A plateia é dividida em espaços para famílias e para homens solteiros. Vale a pena dar uma olhada no calendário do Souq Waqif, pois há diversos festivais durante o ano. Em um deles, a desconhecida no Brasil, mas estrela no Oriente Médio, a cantora libanesa Nancy Ajram levou uma multidão ao Souq, no início de 2014.

Perto do Souq Waqif, o Museu de Arte Islâmica, que foi aberto ao público em 2008, apresenta coleções permanentes, além de exposições temporárias. O acervo é composto por artefatos que introduzem a arte islâmica – em metal, cerâmicas, joias, trabalhos em madeira, têxteis e em vidro –, coletados em três continentes, e que datam do século sete ao século 19. O museu foi projetado pelo arquiteto chinês I.M. Pei, um prédio majestoso e icônico em Doha. A entrada é gratuita.

Do lado de fora, os jardins do museu são um excelente local para dar uma caminhada no final do dia, relaxar, observar. É onde está localizada a escultura “7”, do famoso escultor norte-americano Richard Serra. A obra mais alta criada por ele, “7” tem cerca de 24 metros de altura, e, como o nome indica, são sete placas de aço, arranjadas em formato heptagonal. A obra celebra o significado científico e espiritual do número sete na cultura islâmica.

Corniche, o calçadão na beira do mar e com aproximados sete quilômetros de extensão, é uma caminhada obrigatória para quem visita Doha. Quer dizer, não os sete quilômetros, claro. E a melhor hora para visitá-lo também é no final do dia. Com a temperatura mais amena – é importante reiterar, evite os meses mais quentes do ano, do contrário, não existe “temperatura amena” –, casais de diversas nacionalidades aparecem para caminhar, atletas amadores para correr, famílias para conversar. Corniche leva ao centro moderno de Doha, se o ponto de partida foi o Museu de Arte Islâmica. No centro, torres de vidro e aço em arquitetura contemporânea dominam, além de hotéis, e o conhecido shopping “City Center”.

Como o Catar é um país jovem, a independência data de 1971, muitos dos pontos turísticos são construções mais novas como Katara. Que é uma vila cultural com teatros, salas de concertos, galerias de arte, restaurantes, e cafés. Ainda com algumas partes em construção, a vila oferece programação variada. De festivais internacionais, regionais, performances, shows, e exposições – local geralmente repleto de catarianos –, Katara também entra na lista (ou deveria entrar) de qualquer visitante em Doha. Informações da programação em Katara.

Na sequência de projetos enormes, criados pelo homem, “The Pearl” é um empreendimento residencial e comercial. Uma ilha artificial, a área recebe apartamentos e casas de luxo, além de restaurantes, hotéis, e uma marina. É o suprassumo do luxo, e onde, além de marcas internacionais como Hermes, Armani, Balenciaga, entre várias outras, dá para comprar carro novo também: Ferrari, Maserati e Rolls-Royce. Se uma Ferrari não entra no orçamento, sem problemas. O passeio pelo “The Pearl” é ao menos gratuito.

Com as principais atividades realizadas em Doha, é hora de escapar ao deserto da península. As possibilidades são diversas, assim como empresas que oferecem excursões com opções de acampamento pela noite, passeios de camelo, e claro, fazer rally pelas dunas. Ao sul da capital, “Sealine” é um destino popular para quem mora no país. É a junção do deserto com o mar – a beleza das praias não é comparável às praias brasileiras –, e uma ótima maneira de encerrar a viagem. Longe das ideias fabulosas e equivocadas que existem sobre as mil e uma noites do mundo árabe, na imensidão do deserto e admirando as estrelas, o Catar pode não ser um destino final de turismo, mas tem autoridade para surpreender.

– Para quem estiver de passagem pelo Catar, é interessante evitar os meses de extremo calor, de junho até setembro. É o período quando as temperaturas – podem se aproximar dos 50°C – e a umidade impossibilita qualquer tentativa de manter a elegância ao ar livre.

– Ao passear pelo parque do Museu de Arte Islâmica, há um café, com uma das mais bacanas vistas para o centro de Doha. Parar ali para colocar e leitura em dia na viagem, ou simplesmente relaxar, e testemunhar o por do sol garante boas fotos, quem sabe, boas lembranças. De setembro/outubro até maio, concertos ao vivo de jazz acontecem no mesmo lugar em um palco montado especialmente para as noites de música. Eventos gratuitos, e imperdíveis. 

– Do Museu de Arte Islâmica, há um ônibus gratuito que leva ao Mathaf: Museu Árabe de Arte Moderna. Um pouco distante do centro, sediado na Cidade da Educação, uma área com instalações de ensino, de escolas até filiais de universidades do exterior, o museu recebeu “Turbulence” em 2014, de Mona Hatoum. Artista de origem palestina, que já expôs no Museu de Arte Contemporânea de Chicago, no MOMA, ainda o Centro George Pompidou, em Paris, Mona ganhou fama por performances e obras em vídeo que focavam no corpo. Mona Hatoum evoluiu ao longo dos anos 90 para instalações de grande porte. Apesar do ônibus sem custo para o Mathaf: Museu Árabe de Arte Moderna, a entrada nesse museu custa cerca de R$ 15,00. Outras informações em mathaf.org.qa/en/exhibitions.

– Sob a tutela da xeque Mayassa bint Hamad bin Khalifa Al Thani, irmã do emir, que preside a Autoridade dos Museus do Catar, o país sedia frequentemente exposições de artistas famosos internacionalmente, como o britânico Damien Hirst, em 2013, Richard Serra, em 2014, entre outros. Conferir a programação dos museus em qm.org.qa/en/content/museums.

– Passar fome em Doha? Sem jeito. Restaurantes libaneses, turcos, indianos, iemenitas (até brasileiro, e a lista segue) são fáceis de encontrar, e na maioria dos casos, comida deliciosa – e para todo tipo de orçamento. O libanês Al Mourjan, em Corniche, na beira do mar, é o terror para quem estiver de dieta, e isso já nas entradas. Porém, a comida é tão bem preparada, que dá para encarar um jogging no dia seguinte em Corniche para queimar as (milhares) de calorias consumidas no Al Mourjan. O preço também acompanha a qualidade, mas vale a pena. No Souq Waqif, em uma ruela paralela à principal, o simples restaurante iemenita “Sanaa”, e bem mais em conta do que o libanês previamente citado é um achado. Dá para sentar no chão, comer com a mão, e desfrutar da hospitalidade iemenita. Em Katara, o Mamig, de origem armênia, salgado no preço, é outra opção. Mais um restaurante que faz a dieta ir ao espaço. Álcool não é servido em todos os restaurantes.

– Ao visitar o Catar, leve em consideração que se trata de um país muçulmano, com tendência conservadora. O conservadorismo, em vários casos, é mais uma questão cultural do que religiosa. Atenção ao que se veste. Mesmo em dias mais quentes, é aconselhado usar roupas que cubram mais o corpo, de tecidos leves, ou pelo menos abaixo do joelho. Atenção também para exagerada demonstração de afeto em público. Para ser respeitado, primeiro deve-se respeitar.

– Doha certamente não é destino para baladeiros de plantão. A vida noturna – leia-se danceterias, bares e afins – é mais modesta do que Dubai, por exemplo, e concentra-se em hotéis, como o Intercontinental, ou o W Hotel, La Cigale, entre outros, onde o consumo de álcool é liberado.

COMPRAS Além do City Center, há outros shoppings na cidade. Aliás, no Golfo, shopping é algo que não pode faltar. O Villagio, projetado em estilo italiano, e com um canal veneziano de 500 metros com gôndolas – sim, brega, breguíssimo – tem pista de patinação no gelo, lojas de “fast fashion” internacionais com preços moderados. Agora, se bateu a vontade de comprar aquela bolsa Prada, Chanel, Gucci, Fendi, Louis Vuitton, um “trench coat” Burberry, roupas da Carolina Herrera, Celine, Dolce & Gabbana e ainda passar na baby Dior, há uma área no shopping chamada Via Domo com as lojas das marcas acima citadas. Não dá para esquecer das joalherias locais, e internacionais, como a Van Cleef & Arpels.

Texto / Fotos Pablo Augusto Relly (matéria publicada na MENSCH #10 em 2014)