ENTREVISTA: Giovane Gávio, um atleta que é medalha de ouro dentro e fora das quadras

 

A simplicidade com que Giovane Gávio encara vitórias, medalhas, fama e realização profissional é algo tão incrível e ao mesmo tempo coerente que nos pega de surpresa. Como ele mesmo fala nessa entrevista, ele é apenas um profissional do esporte, assim como poderia ter outra profissão que também a faria da melhor forma possível. Isso infelizmente é um caso raro, mas demonstra o grande ser humano que ele é que vai muito além do atleta famoso. Atualmente técnico da seleção do SESI-SP, campeã da Superliga Brasileira de Voleibol em 2011, pais de quatro filhos, poeta nas horas vagas, Giovane é merecedor de medalhas dentro e fora das quadras.
O que o vôlei ensinou aquele garoto de 12 anos que perpetuou por toda sua vida como jogador e homem maduro? Me ensinou muito. O esporte é importante na formação do jovem, da criança, ajuda a socializar, ajuda a moldar a personalidade, te ensina a conviver em grupo. O vôlei me fez crescer, amadurecer, me deu alegrias, me ajudou a conquistar muitas coisas, além de medalhas, e sou muito grato a tudo o que esse esporte maravilhoso fez por mim, por tudo o que ele me ofereceu. Hoje meus dois filhos mais velhos (Gianmarco e Giulia) jogam vôlei. Se vão seguir ou não, não sei, é algo que vai depender deles, não coloco pressão alguma, mas fico feliz de ver que estão no meio do esporte. Incentivo, apoio e vou sempre estar ao lado deles.

 

Quando foi que você se encantou com o vôlei e decidiu: é isso que quero fazer! Eu fazia judô e foi vendo a minha irmã Giseli que comecei a me interessar pelo vôlei. Os meus pais sempre me incentivaram muito a praticar esportes, experimentei o vôlei e me apaixonei. Entrei em quadra para não sair mais.

Por que a final das Olimpíadas de Barcelona foi o jogo da sua vida?
Foi uma partida marcante para mim. Lembro bem de tudo o que aconteceu naquela partida, lembro muito dos dias que passamos em Barcelona, de cada momento daquela conquista. Aquela vitória sobre a Holanda foi a coroação de um trabalho bem feito por uma equipe, jogadores, comissão técnica, confederação, e que nos deu uma medalha de ouro que mudou a história da modalidade. Quando aquele saque do Marcelo Negrão passou pelos holandeses, sem defesa, o nosso sonho virou realidade. E ninguém queria acordar daquele sonho.
Foram mais de 30 partidas em jogos olímpicos, bicampeonato olímpico e diversas medalhas olímpicas. Qual o momento mais marcante de tudo isso? Todas as conquistas foram marcantes. Cada uma à sua maneira, porque cada uma marcou um momento da minha carreira. Não teve uma medalha, um título que eu possa escolher como o mais importante, muitos foram marcantes, as medalhas de ouro olímpicas, aquele saque no Campeonato Mundial, cada Liga Mundial, enfim, guardo com muito carinho os momentos que vivi com a camisa do Brasil, desde a primeira convocação à minha despedida.
Você se sente um atleta e um homem plenamente realizado? O que você almeja mais? Sim. Como atleta eu conquistei tudo, fui muito além do que eu poderia imaginar. Tive a oportunidade de jogar com os melhores jogadores, de trabalhar com os melhores treinadores, de vestir a camisa do Brasil e ajudar a Seleção Brasileira a conquistar títulos importantes, aprendi muito e levo isso comigo para a minha vida, não apenas como técnico, mas como homem. Hoje sou treinador, estou começando uma nova carreira e estudando para estar cada vez mais bem preparado, para ser cada vez melhor na minha profissão, na minha função de técnico.
Competir é mesmo o mais importante OU isso é discurso de perdedor?
É claro que todo mundo quer vencer. Mas só um vence, só um atleta, só uma equipe, só um país. Mas, para saber vencer, é preciso saber perder, é preciso saber competir, entender a essência do esporte. Ninguém é imbatível, ninguém é invencível, não existe isso no esporte. As vitórias são fruto de um trabalho bem feito e até mesmo aquele que é derrotado, muitas vezes, precisa ser enaltecido. O atleta precisa entender o sentido da competição, precisa saber o que é o respeito com o adversário, e precisa demonstrar isso, porque ele é espelho para jovens e crianças, precisa dar bons exemplos. Um bom perdedor é mais digno do que um mau vencedor.

 

O que é mais fácil, conquistar uma medalha ou a mulher que se quer para uma vida inteira? Nada é fácil. Tudo exige dedicação e paixão. Claro, são conquistas diferentes, uma medalha marca o atleta, traz uma felicidade e uma realização que marcam a sua carreira. Conquistar o amor de uma mulher é especial, é para uma vida inteira, e é uma conquista diária, como um namoro que precisa ser vivido intensamente e renovado a cada dia.

E o que é mais difícil, bloquear um ataque do adversário ou as fãs mais ousadas? Bloquear os adversários sempre foi muito difícil. Enfrentei muitos grandes atacantes e também muitos excelentes bloqueadores, os melhores do mundo, pelos clubes e pela Seleção Brasileira. Mas as fãs eu nunca bloqueei, sempre tratei a todas e a todos com carinho, porque o fã é aquela pessoa que te admira e isso é um reconhecimento ao seu trabalho. Seja um autógrafo, um sorriso, uma foto, um aperto de mãos, o fã é aquele que te recompensa.
Chegar aos 40 anos pesou um pouco para um atleta? O que faz para manter a vitalidade de 20 anos atrás? Não. Não tenho essa vaidade de idade. Sempre aproveitei muito cada momento da minha vida, e a idade traz não apenas cabelos brancos, que eu ainda não tenho, mas traz maturidade, experiência, sabedoria. E acredito muito nisso. Todo mundo envelhece, o segredo está em saber envelhecer, saber aproveitar a vida e o que ela oferece de melhor. A idade física é algo que não se pode mudar, a diferença está na cabeça, é preciso respeitar o corpo, ter cuidados com a saúde, uma vida regrada e aproveitar cada momento.
Por que demorou tanto para fazer uma tatuagem que era um desejo antigo? Receio de algum preconceito? Não, nenhum preconceito. Tem gente que não gosta, tem gente que gosta tanto que tem dezenas, às vezes tem partes inteiras do corpo tatuadas. Acho a tatuagem algo bastante pessoal, quando alguém resolve fazer, os motivos são os mais variados, e isso se reflete na escolha do desenho, do que será escrito, de uma imagem.
Priscila é a sua maior inspiração? Priscila é uma das maiores inspirações da minha vida. Não apenas ela, mas meus filhos, minha família, é sempre pensando neles que eu vou atrás dos meus objetivos, que me dedico todos os dias como marido, pai, filho e profissional do vôlei.
Giovane poeta, como isso se deu? Tem planos de publicar algo?
Já tive planos de escrever um livro de poesias. Escrevi alguns poemas, um ficou mais famoso, que foi o que falava da Seleção Brasileira, é algo que gosto. Quem sabe, um dia ainda me dedico mais e publico um livro?
E como é ser pai de quatro crianças? O que a paternidade te trouxe? Ser pai é maravilhoso. E eu sou pai quatro vezes. Amo meus filhos, aproveito muito o convívio ao lado deles, um tempo que é e sempre foi mais curto do que eu queria, por causa dos treinos, dos jogos e das viagens. Mas procuro curtir ao máximo as folgas para estar perto deles, acompanhar o desenvolvimento, o crescimento, ser um pai o mais presente possível. Ser pai é uma sensação maravilhosa, o homem amadurece muito quando nasce um filho, passa a ver a vida por um ângulo diferente, traz uma enorme responsabilidade que se transforma em um amor difícil de descrever pela criança. Um filho marca o nascimento de uma nova família.
O mineirinho é mesmo um “come-quieto”? O mineiro é pacato, trabalhador, de boa paz e gosta das coisas certas. Isso de come-quieto é engraçado, é uma velha expressão e, até onde eu sei, tem a ver com o jeito caseiro, familiar, com a simplicidade do mineiro. Se for isso mesmo, eu sou um ‘come-quieto’, sim.
Em suas palestras o que você tenta passar de mais importante é a sua experiência como atleta dentro do universo esportivo ou o que o esporte te ensinou como ser humano?
Um pouco de cada coisa. Tento passar um pouco da minha experiência, do que vivi no esporte, de como o vôlei me ajudou a vencer na vida, a me formar como homem e como atleta profissional. Muitas pessoas tem curiosidade de saber como é a vida de atleta, como foi minha carreira, alguns me enxergam como ídolo e tem as curiosidades mais diferentes. Sou uma pessoa como outra qualquer, escolhi jogar vôlei, mas poderia ter sido médico, engenheiro, ator, poderia ter seguido outro caminho. O sucesso e o reconhecimento não tem a ver com a profissão que se escolhe, se o lixeiro não fizer bem o seu serviço, a cidade vai estar suja, e ele tem uma importância enorme no nosso dia-a-dia. Se o médico não estiver atualizado, não for competente, a nossa saúde fica prejudicada. Se o professor não for bem preparado para ensinar, nosso futuro estará comprometido. Todos nós somos importantes, todos precisamos fazer o nosso melhor, isso tem a ver com dedicação, com vontade, com profissionalismo. Se hoje eu tenho o respeito das pessoas, não é só porque fui um bom jogador, isso tem a ver com a minha conduta também. Para se viver em grupo é preciso que o respeito venha em primeiro lugar. É assim no esporte, é assim na sociedade, na vida.
O que foi (e é) mais importante para você dentro de um trabalho em equipe, a disciplina, o coleguismo ou o comprometimento?
Acho que tudo isso é importante. Não existe grupo forte sem isso, sem liderança, sem união e sem dedicação. No esporte coletivo todos são importantes, cada um tem sua função e o entendimento e o respeito das individualidades é que fazem um coletivo forte.
O vôlei te trouxe dois grandes amigos, Paulão e Tande. Como você explica essa fidelidade nas amizades masculinas que os homens em geral nutrem e as mulheres invejam? Fiz grandes amigos no vôlei. Tande então é quase que um irmão, nos conhecemos há mais de 20 anos, Paulão também é um grande amigo. Não sei se as mulheres invejam, mas eu prezo muito minhas amizades, as amizades verdadeiras que tenho. Algumas pessoas acabam virando quase que parte da família, tamanha a afinidade e o prazer do convívio. Me sinto um cara de sorte por ter muitos bons amigos.
Qual a maior virtude que um homem deve ter? Caráter. Independente de classe social, de profissão, acima de tudo, o homem precisa ter caráter. E caráter tem a ver com honestidade, com hombridade, com respeito e com educação.

 

Texto: André Porto e Nadezhda Bezerra
Fotos: Roberto Lima, Divulgação
Capa: Roberto Lima / Tratamento de imagem: Jorge Souza
Agradecimentos: Samy Vaisman – MPC Rio Comunicação & Marketing
Giovane veste Remo Fenut – www.remofenut.com.br
Agradecimento especial a Giovane Gávio

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